Ena, o gajo conseguiu! Grande cromo, sim senhor, nunca pensei que fosse capaz. E ainda se mantém em pé apesar de vacilar um pouco, quase não se nota. Eu reparo nas tremuras porque assisti à coisa desde o início e, muito sinceramente, nunca pensei que um ser humano pudesse realizar aquela façanha. Aquilo está ao nível das capacidades físicas de um grande símio, talvez um orangotango habilidoso conseguisse... só visto! Contado ninguém acredita, palavras não são instrumentos adequados para descrever tão insólito acontecimento.
Além de mim só o filho mais novo do meu amigo parece ter assistido ao feito do homenzinho que agora se sentou e respira fundo; decerto tenta recuperar o coração e trazer a alma de volta ao corpo que aquilo foi coisinha para ela quase se ter perdido de quem é. Olho para o puto em busca de algum tipo de cumplicidade mas ele parece absolutamente alheado de tudo o que o rodeia. Está absorto, completamente concentrado na bolacha do gelado que começa a amolecer de forma ameaçadora. Sei que ele viu o homem a fazer aquela coisa extraordinária mas terá, de facto, reparado? Terá noção de como foi prodigioso o que vimos? O que será prodigioso para o meu pequeno amigo?
O homem levantou-se, vai abandonar o local. O puto já tratou do gelado, tratou da bolacha e tratou de qualquer coisa mais mas não percebi o que era e tenta agora lavar as mãos num balde plástico com água que transportou desde o mar mas só consegue meter dentro uma mão de cada vez. Está complicado. O puto olha para mim com uma expressão que parece solicitar ajuda. Não mostro a mais pequena disponibilidade e ele desinteressa-se e vira o balde, espalhando água em seu redor. Não lhe vejo sinais de deslumbramento nem perguntas sem resposta sobre os limites das capacidades físicas do corpo humano. O pai e a mãe continuam absortos nos respectivos telemóveis. Desenrasque-se! Eu sinto-me muito só.
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