Por vezes apetecia-lhe desistir. Deixar de respirar seria o suficiente. Parar, de uma vez por todas. Sossegar em lado nenhum era um conceito confuso mas atraente. Sentia-se farto de estar cansado perante o caos acumulado no mundo. Talvez lhe apetecesse morrer, ninguém sabe ao certo, o que é certo e sabido é que se dissolveu no ar perante o olhar atónito dos restantes cidadãos que aguardavam a sua vez na fila para o leite.
Os 15 cidadãos foram unânimes no seu depoimento: o homem elevou-se no ar um metro, metro e meio, rodopiou um pouco, duas voltas (5 confirmações), três voltas (4 confirmações), algumas voltas (restantes 6 testemunhas) e depois... puf! Desapareceu no ar, como se fosse feito de poeira e tivesse sido sugado pelo espaço à sua volta.
O oficial da GNR que registou a ocorrência não sabia do fastio absoluto que consumira o desaparecido ao longo dos últimos tempos (um ano, dois anos, poucos meses?) e mesmo que soubesse atrever-se-ia a relacionar a tristeza do homem com a sua dissolução no espaço em volta? Duvido muito.
Os cidadãos que assistiram ao estranho fenómeno reagiram de forma pouco dinâmica. Pareciam cansados, desalentados, pouco interessados na vida. Nem mesmo um fenómeno como aquele teve o condão de lhes acender uma chamazinha de curiosidade, lhes provocar uma inquietação, nada! Assistir ao extraordinário desaparecimento do seu concidadão provocou inveja (a 7 deles), alguma curiosidade (a 5), uma fúria inexplicável (2) e um deles afirmou que, na confusão, lhe desaparecera um dedo. Esse confessou que sentira medo. Medo pânico.
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