sexta-feira, agosto 03, 2018

Ensino e aprendizagens


Quem ler algumas opiniões que vão sendo publicadas a propósito das Aprendizagens Essenciais recentemente impostas pelo Ministério da Educação pode ficar com a impressão de que estamos perante um recomeço ou que esta nova medida administrativa vem deitar por terra um edifício educativo que importa preservar. Nem uma coisa nem outra. É mais do mesmo, mais um remendo num edifício estranho, a ameaçar ruína. A qualidade do ensino sempre foi e será desigual; de escola para escola, de uma sala de aula para a sala do lado. Há bons professores, outros que são mais ou menos e alguns dos quais é melhor fugir. Os directores não são todos iguais, as instalações e equipamentos variam muito. A origem social dos estudantes é um dado importante mas não é impossível de combater. Em suma, com ou sem Aprendizagens Essenciais houve e haverá casos de sucesso e casos de insucesso. Colégios para meninos ricos e escolas para meninos pobres.
Penso que, numa futura reforma educativa (que não deverá tardar muito), seria importante debater a relação entre os diferentes ciclos de aprendizagem. Não parece justificável que a avaliação no Ensino Básico seja estabelecida numa escala de níveis entre 1 e 5 (alguém se recorda porque se instituiu esta escala nos finais dos anos 70?) para ser alterada no Ensino Secundário, quando os alunos passam a ser escalonados numa tabela que vai de zero a 20 valores que se manterá até à conclusão das suas licenciaturas à bolonhesa. O secretário de estado tem razão quando refere a extensão dos programas disciplinares. Muita gente concorda com ele. Fica a sensação de que, em algumas disciplinas, se quer ensinar tudo o que há para aprender no tempo curto que dura o Secundário (quem se der ao trabalho de analisar, a título de exemplo, o programa de História da Cultura e das Artes, que é ministrado em dois aninhos apenas, fica com os cabelos em pé!). Talvez isto se pudesse resolver se não existisse um abismo de incomunicabilidade entre o Secundário e o Ensino Superior. As Universidades, olhando-se no espelho da sua pretensa superioridade, reclamam da qualidade da matéria-prima que lhes chega todos os anos mas não se preocupam em procurar uma solução para o problema. Queixinhas e inacção, muito à boa maneira portuguesa. Quanto à choradeira que por aí vai por “Os Maias” deixarem de ser leitura obrigatória, sempre vos digo, caros amigos e colegas professores, todos nós lemos a obra quando frequentámos a escola (ou fingimos que a lemos) e, avaliando o estado em que se encontra o nosso sistema de ensino, podemos concluir que o resultado não terá sido lá muito famoso.

carta enviada ao director do jornal Público

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