domingo, janeiro 31, 2016

Domingo, na paz do Senhor

Andamos a bater mal da cabeça. A Europa parece, cada vez mais, um bicho imundo. A esquerda confunde-se com a direita e vice-versa. A economia é uma coisa porca, a civilização é "civilização".

Não sei se por excesso de informação, a coisa má agiganta-se e mostra-se furiosa, fora de controlo. Diz o povo que "olhos que não vêem, coração que não sente" e a igreja abençoa os pobres de espírito, talvez a ignorância seja, afinal de contas, uma benesse para a alma.

O tempo cinzento e pouco luminoso acentua a sensação de desgraça permanente. Uns raiozinhos de sol talvez animassem esta merda.

sexta-feira, janeiro 29, 2016

Cultura amestrada

Li uma pequena entrevista com Don Letts onde ele afirma uma coisa muito interessante que, apesar de óbvia, precisa de ser dita.

Diz ele: "Tens a cultura que mereces. Possivelmente as aspirações dos jovens de hoje são muito diferentes das dos jovens quando eu estava a crescer. Entrámos na música para ser contra o estabelecido. Agora, muita gente entra na música para ser parte do establishment. No século XXI, a cultura ocidental tornou-se muito conservadora. Parece que o punk nunca aconteceu. (...)" (ler aqui toda a entrevista)

Isto dá que pensar. Vivemos num mundo de artistas amestrados? Haverá ainda espaço para a revolta cultural, para o manifesto, para a afirmação de visões colectivas através da criação artística? Deixámos que a cultura se transformasse numa coisa anódina, lisinha e liofilizada?

domingo, janeiro 24, 2016

Uma manhã qualquer na ex-capital do império


Os livros são caríssimos! Puta que pariu.

O povo frequenta o Centro Comercial com um fervor apenas comparável ao que me recordo de presenciar na Igreja, quando era puto.

Gostava de comprar meia-dúzia de livros mas vou ficar-me, apenas, por um.

Este sol de Inverno é uma coisa magnifica. O ar está friozinho e o sol não chega a aquecer. Gosto disto.

O meu povo é um tanto macambúzio.

Dizem alguns que se prepara uma crise económica mundial capaz de fazer estragos definitivos neste mundo globalizado. Não vejo ninguém preocupado com isso.

O povo anda por aí, serenamente. Também gosto disso.

sexta-feira, janeiro 22, 2016

Declaração

Quando digo que, aos gajos do estado islâmico, era meter-lhes uma bala no focinho a cada um (para poupar munições), digo-o por mim, digo-o por ti, mas também por Strummer, por Zeca, por Bowie, por Mozart, por Amália, por todos os outros que fizeram música maravilhosa; por Camões, por Shakespeare, por Tolstoi, por Tchekov, por Calvino, por Bolaño, por Cervantes, por todos os que inventaram o mundo das palavras; digo-o por ti, pelos teus, pelos meus e também por Bosch, por Goya, por Giotto, por Bacon, por Basquiat, digo-o por todos os que encontram a liberdade a cada momento.

Digo-o por Cristo, por Maomé, por Buda, por todos os profetas mais ou menos obscuros, por todas as personagens de fábula, de lenda, de mito, pela liberdade de expressão e pelo direito a calar boca.

Quando digo que, aos gajos do estado islâmico, era meter-lhes uma bala no focinho a cada um digo-o por ser incapaz de aceitar que esta cultura de que faço parte possa alguma vez desaparecer subjugada pela força da estupidez e da ignorância.

Isto não se aplica exclusivamente aos assassinos do estado islâmico e a bala pode ser metafórica. O focinho não.

quarta-feira, janeiro 20, 2016

Pensamento matinal

As pessoas não são todas iguais mas talvez pudessem ser um bocadinho mais diferentes umas das outras. Apesar de tudo, o senso comum não me parece assim tão repelente, bem pelo contrário.

Estarei a contradizer-me? Temo bem que sim mas não tenho a certeza. Há que considerar a liberdade individual... há que ponderar os limites da estupidez e da sageza... há que tomar um café e ir trabalhar.

domingo, janeiro 17, 2016

Educação


Quando o tema é o futebol, sabemos bem, surgem milhentos “treinadores de bancada”, entendidos, capazes de engendrar as estratégias mais imprevistas e criativas que teriam impedido a derrota, que teriam potenciado a vitória à quinta casa ou seriam capazes de engalanar o empate com credenciais de feito extraordinário, o empate como sucesso último de uma inquestionável visão de futuro. Somos um país de poetas e de treinadores de futebol.

Mas, pasmemos cidadãos, há outro tema capaz de espevitar em todos nós uma inteligência adormecida, uma inteligência que aguarda indolentemente a mais leve oportunidade para espreitar a luz ofuscante de um prometido dia solarengo; falo da educação.

Quando o tema é “educação”, os especialistas, os profetas, os entendidos, saem debaixo das pedras a um ritmo próximo da alucinação. Sejam professores, catedráticos (ou nem por isso), comentadores mediáticos anquilosados, chefes de redacção sem assunto, políticos entediados, presidentes de junta, gente de maiores ou menores vistas, cidadãos anónimos chateados com a nota do seu educando no último teste realizado em contexto escolar, meros repórteres a quem foi distribuída a tarefa, ficamos confusos perante a insana capacidade de emitir opinião demonstrada pela sociedade portuguesa em tão complexo tema. Talvez por isso, a política de educação em Portugal continua a fugir para a frente de si mesma, sempre em passo acelerado, capaz das cabriolas mais estonteantes, aos saltos para trás, aos saltos para a frente, qual cabrito-montês perdido numa imensa planície.

O novo ministro da coisa veio desembestado, em sintonia com o seu predecessor, na linha de Maria de Lurdes Rodrigues: desfazer o que foi feito, fazer o que já tinha sido experimentado, numa confusão de gestos e intenções que, verdade seja dita, não traz nada de novo, apenas sublinha a proverbial confusão em que mergulham as mentes mais iluminadas quando o tema é “educação”. Acredito nas boas intenções de Tiago Brandão Rodrigues, tal como acreditei, à partida, em Nuno Crato. Mas, tal como o anterior ministro, também este tropeça nas próprias intenções, uma e outra vez, vem cambaleante ameaçando estatelar-se ao comprido.


A Educação não é coisa que se resolva de um dia para o outro. Qualquer medida implementada precisa de tempo para ser testada. Será isto difícil de compreender? Poupem os professores a esta girândola maluca que é a produção de legislação educativa. Até se me torce a língua, mas apetece dizer: “deixem-nos trabalhar”! Não façam de nós os palhaços deste vosso triste circo.

quarta-feira, janeiro 13, 2016

Feliz aniversário

O dia de aniversário é como o dia de Carnaval: um gajo tem de estar bem-disposto, prontinho a entrar em estado de euforia, cantarolar, rir, dançar, dizer alarvidades inocentes. Dias assim deixam-me deprimido.

Se por acaso acordamos com propensão para a melancolia e não nos apetece celebrar há sempre alguém que vai ficar chateado, que mostrará decepção e tristeza. Por vezes há mesmo quem mostre irritação.

Tu estás triste quando deverias estar eufórico, derramas tristeza sobre a euforia, fazes com que as coisas amoleçam, derretam, se desfaçam.

Mas qual é o teu problema, caraças!? Feliz aniversário, mas é. Deixa-te de merdas.
Pois sim, já me tinhas dito.
Obrigado.

segunda-feira, janeiro 11, 2016

Bowie

Hoje de manhã entrei no meu carro e liguei o rádio. Eram 8 horas e o noticiário na TSF abriu com  Space Oditty de David Bowie. Estranhei: "que raio de coisa, o homem edita um novo álbum e abrem o noticiário com um tema tão antigo..."

Estacionei e ouvi até ao fim para tomar conhecimento que Bowie morrera durante a madrugada (acho eu). PORRA!!!

Há pessoas que não imaginamos mortas.
Há pessoas que, imagino eu, não morrem.

quinta-feira, janeiro 07, 2016

Fraqueza genuína

Às vezes apetecia-me ser capaz de odiar com a profundidade necessária à sensação de ódio. Tenho a impressão de não ter desenvolvido essa competência.

Sempre que me imagino a odiar alguém lá vem aquele bonequito do anjinho poisar-me no ombro a sussurrar-me no ouvido coisas que me impedem de sentir um genuíno ódio, tão necessário à higiene mental de qualquer cidadão ocidental contemporâneo. O diabito recolhe-se, amuado, e não diz mais nada.

Estarei tão amolecido que nunca ultrapassei a fase "bebé", no que diz respeito à capacidade barbuda de desejar enfiar um garfo no globo ocular de qualquer óbvio filho da puta? É triste.

Ensaio olhares matadores sobre o meu reflexo no espelho da casa de banho. Cerro os punhos, ranjo os dentes mas... nada. Na verdade sinto-me a derreter a frio, sinto uma inexplicável incapacidade para rachar o espelho de alto a baixo num gesto de fúria incontida, justificada e, acima de tudo, um gesto de fúria genuína. Sou fraco.

Eu gostava de ser capaz de matar, quereria ser capaz de estropiar, cegar, esventrar e cagar em cima dos cadáveres ainda fumegantes dos meus inimigos. Mas não, nada disto é real, nada disto obedece ao mínimo sentido lógico.

Sou um fraco.

Se não tenho cuidado ainda acabo a oferecer uma outra face a um gajo que me tenha espetado uma faca no fígado.

terça-feira, janeiro 05, 2016

Autoria

Vai por aí uma certa polémica relacionada com a suspeita de que algumas obras atribuídas a Hyeronimus Bosch não serão da sua autoria. É uma questão complicada que merece, pelo menos, um sorriso.

Os argumentos apresentados por quem rebate a mão do mestre nas ditas obras baseiam-se, tanto quanto pude compreender, na observação do estilo do desenho ou na técnica da pincelada. Que são diferentes nestas obras quando comparadas com outras, assinadas. Acredito piamente.

A minha dúvida (e o meu sorriso) desprende-se da constatação de que um artista muda e evolui. Ninguém é constante ao longo do trabalho de uma vida. Outro ponto interessante é que o material acaba e, por vezes, experimenta-se outro. Ainda para mais, na época em que Bosch trabalhou, era nos ateliers que os artistas produziam os materiais com que trabalhavam, não existiam marcas de produtos artísticos à venda em grandes superfícies comerciais.

Enfim, esta treta toda para reflectir um pouco sobre a importância da autoria numa sociedade de consumo descontrolado, como é a nossa.

As obras referidas (3 que estão no Museu do Prado, em Madrid) foram, até hoje, admiradas como fazendo parte do legado extraordinário que Bosch deixou à Humanidade. Além dessa qualidade, por serem atribuídas ao Mestre, valiam milhões, o seu preço era incalculável. Convenhamos que, nos dias que correm, este é um factor determinante para a qualidade do que quer que seja. Se não é de Bosch, o valor em euros cai a pique, logo a qualidade da coisa cai ao lado.

Assim sendo, a partir do momento em que perderem o nome de Bosch, estas obras passam a ser uma merda? Estou-me bem a lixar se o trabalho é deste ou daquele. A qualidade está lá, na superfície pintada, na energia que emana da pintura, na magia do objecto. O nome, a assinatura, não passam de pormenores.

domingo, janeiro 03, 2016

Bom ano de 2016

Ora então, cá estamos nós.
É com isto que se parece 2016? Noto-lhe bastantes semelhanças com 2015 e, eventualmente, algumas diferenças significativas. O tempo a passar é como fumo dentro de uma garrafa de vidro.

Sinceramente, não tenho desejos especiais para 2016 que não tenha tido já em anos anteriores. Afinal de contas os nossos anseios não se alteram assim tanto quando mudamos o calendário por outro, novo, com os quadradinhos dos dias todos por preencher. O tempo a passar é como uma linha mais ou menos recta.

Gostava de poder manter uma certa serenidade que tenho sentido dentro de mim. Será isso o bastante para provar a mim próprio que o mundo está melhor? A minha relação com o mundo pode alguma vez servir de bitola para medir a amplitude da sua saúde? É óbvio que não. A única saúde que essa serenidade poderá anunciar será a minha o que, do meu ponto de vista, até nem é coisa que me aborreça.

Que te sintas também sereno e de bem com as coisas que te rodeiam, é o que te desejo, amigo leitor.
Bom ano de 2016.