Há pessoas a quem a necessidade de atenção obriga a fazer coisas estranhas.
Aquele rapaz caminhava com os gestos gingões que deve ter visto nos maus da fita de
um qualquer vídeo de hip hop de quarta categoria, um vídeo daqueles, cheio de gajas boas e
cantores atarracados sob o peso de correntes de ouro, anéis
enormes e bonés colocados às três pancadas, encavalitados no cucuruto forrado com lenço colorido.
É um passo em cadência embriagada,
ao ritmo de uma música imaginária, que lhe desorganiza o peso dos pés e das
pernas, que confunde aos nossos olhos a força da gravidade. Desloca-se
enredado na teia daquele complexo jogo de forças invisíveis, a serpentear dos
calcanhares às nádegas, das nádegas à ponta dos ombros, a parecer que cai, mas
não cai, a pisar o chão com demasiada força após um movimento da perna que
parecia suave e gracioso.
Esse rapaz acompanha um outro que, não sendo tão estiloso no andar, tem uma característica complementar. Vai agarrado a
um telemóvel, debruçado para dentro dele, teclando furiosamente com o polegar
direito. Fala alto, como se tivesse um megafone incorporado e tem um aspecto algo patusco de aspirante a presidiário, uma dureza construída à força e demasiado
óbvia.
São dois bonecos de um museu de cêra dos horrores domésticos,
dois animais de estimação a quem falta o dono, a quem falta quem lhes dê
atenção e os leve a mijar no fim de mais um dia sem outra coisa que não seja
exibir o aspecto duvidoso, como se isso fosse uma grande (e única) qualidade.
Olho para eles e penso "nunca ninguém lhes disse que eram bonitos, nem mesmo quando foram pequeninos". E não vou ser eu quem lhes diz isso. Eles nunca vão ser bonitos. Se era atenção que eles queriam, aqui a têm.
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