quinta-feira, julho 23, 2009

Post macaco


O que eu pretendia dizer com o post anterior (e mantenho) é que a arte deve ser acessível ao maior número de pessoas possível. Isso não significa que tenha de ser óbvia ou estereotipada. Nada disso. A arte deve ser como um soco no estômago ou uma carícia impossível de resistir. As pessoas que observam um objecto de arte não podem comportar-se como catatuas numa gaiola nem como bois a olhar para um palácio. Não podem ficar indiferentes. Essas pessoas são chamadas a intervir pois só elas completam o objecto de arte.

Esta evidência nem sempre esteve visível no meu espírito conturbado. Mas, ao visitar o MoMA, só para dar um exemplo, e vendo a forma como os visitantes se passeiam entre os objectos artísticos como se estivessem a passear no Centro Comercial a ver montras de sapatarias e pronto-a-vestir, fico com vontade de não voltar a pôr os pés num sítio como esse. Por um lado, o consumo desapaixonado da arte é irritante para quem por ela está apaixonado. Por outro lado, demasiados objectos insignificantes são valorizados até ao paradoxo o que torna o paspalho ignorante num indiferente convencido de que sabe alguma coisa, só porque leu o catálogo da exposição. Falta pele arrepiada, coração descompassado e boca sêca pela ansiedade. Sobram olhares, poses, risinhos forçados e outras patacoadas do género.

Quando terminei o post anterior com a imagem dos artistas a esfregarem-se em merda, estava tentar ironizar com esta situação. Coisa que, aliás, até nem é inédita. Muitos artistas, em desespero de causa ou falta de talento, metem-se a produzir obras grotescas, tomando atitudes dignas de um macaco malandro a pedir amendoins no Jardim Zoológico. Alguns conseguem mesmo engordar. Os macacos, claro!

9 comentários:

Beto Canales disse...

perfeito!

luisM disse...

Silva de ares, já não vinha aqui há uns tempos, e não tive oportunidade de ver/ler a tua viagem esplendorosa. Agora não tenho tempo de comentar com calma, vou apanhar um bocado de chuva suíça. Mas as questões que colocas e que já colocaste levam-me sempre a uma ideia: as pessoas a quem isto interessa de facto, deveriam encontrar-se sem ser na net. Porque, se escrever não é má ideia e suprimimos as distâncias, encontrando gente insuspeita (no sentido de gente que não conhecíamos e que podem participar na conversa), mas uma troca de impressões a sério torna a escrita num grande discurso que também afasta os leitores e leva a que os discursos fiquem, tendencialmente, simplistas, contribuindo para baralhar a argumentação. Sem dúvida, no nosso espaço há um défice de discussão ponderada, informada. No que me é dado observar é tudo bastante superficial, exactamente como criticas a atitude do público num museu, mesmo entre quem se intitula de artista e tem actividade regular nas diferentes áreas da "arte".
A arte deve ser acessível a toda a gente, faz parte do seu objectivo e destino actuais, num mundo que se tornou novamente democrático (mesmo para quem tenha críticas a fazer às insuficiências do exercício democrático por parte de todos os seus agentes), mas parece-me utópico pensar que a maioria da população reconheça a sua importáncia mais profunda. O mundo da arte não se separa do mundo das vivências quotidianas embora não seja exactamente a mesma coisa. Os hábitos de vida, são os que se tendem a praticar nas diversas situações, como sabes. Apenas uma mudança de atitude, mais educada (aqui entram as famílias e a escola e os media e o discurso político e por aí fora), pode levar a uma mudança de atitude conforme os contextos. Na sociedade de consumo tudo se equivale e a conduta tende a ser semelhante, porque as coisas valem o mesmo: beber uma imperial vendo futebol é o mesmo que entrar numa retrosaria ou num museu. A arte deve ser democrática no acesso, mas será sempre elitista na apropriação. Parece um paradoxo, mas, quanto melhor forem os seus agentes, essa elite, mais a sua influência se espalhará junto do "povão". No fim de contas, a mim não me repugna que haja gente distraída nos museus (desde que me deixe curtir à vontade). Quer dizer que eles existem e que as pessoas passam por lá, mesmo que seja como numa loja de novidades. Seria pior se os locais da arte estivessem sempre às moscas, destinados a meia dúzia de "iluminados" à beira da morte, repetindo ideias cheias de bolor. Os acontecimentos da vida são dinâmicos, surgem e caminham para qualquer sítio, logo podem ser mudados,e mudam-se, para melhor ou para pior...

Pronto, este discurso não está acabado, mas fica por aqui, para não te encher a casa de palavras, continuamos depois...

Silvares disse...

Beto, eu prórpio não diria tanto. A perfeição é a curva da coxa de uma estátua de mármore bem polida.
:-)

Luís, também me parece que a coisa faz mais sentido com os gestos e as caretas a ajudarem a leitura. Mas o elitismo da arte não tem que ser uma fatalidade, principalmente numa sociedade democrática onde a informação rodopia como uma bola de snooker à procura do buraco. Vai sendo tempo de interpretar a arte como parte integrante da sociedade global. É por pensar assim que considero o amigo Banksy um dos maiores artistas da actualidade. A gente depois continua a conversa. Por agora curte aí a chuvinha suíça que deve ser mais certinha e aprumada que a nossa, gorda e bruta, a caír à toa...

Anónimo disse...

Silvares, quem é o LuisM. Tenho uma especial predileção por esse nome. Me explico: havia aqui no Brasil um cronista chamado Luiz Martins que assinava uma crônica diária, num dos grandes jornais em são Paulo. Assinava LM, e eu era seu leitor diário, e admirador saudoso.
Escrevia bem como o faz seu amigo LuisM. Gostei do que disse e de como o disse. Realmente os nossos comentarios na blogosfera andam muito ligeiros e superficiais. Entende-se, há falta de tempo, ou excesso de blogs a comentar. Mas concordo com ele, e com você, quando dizem "A arte deve ser democrática no acesso, mas será sempre elitista na apropriação". Não resta dúvida. E também, como ele, não me importa em nada os visitantes de museu, que andam por entre as obras como num parque temático, ou shoping da esquina! Melhor os museus com eles, com milhares de crianças e seus professores e guias, do que museus às moscas!
O que me parece estar fazendo falta no momento artistico que vivemos, é de gente que faça barulho, ruido, com coisas novas! Tanto é assim, que estou revendo os artistas do século passado, e tendo uma enorme saudade! Alguns, na época nem me emocionavam, mas na falta de melhores, hoje, considere-os uns gênios. Enquanto isso os "macacos engordam"!

Selena Sartorelo disse...

Será que é isso mesmo? Penso nisso diariamente, pois adoraria saber falar o idioma de muitos, mas isso não é possível enquanto não conseguir ouví-los, e às vezes numa simples roda de amigos percebo quantas línguas diferentes são ditas.
Sabe (esse sabe ficou pior do que o viciado e vazio "mas") quando vejo as maioria que diz fazer arte para a maioria. Perdão mas isso não é arte é?...pretensão em afirmar, claro; sou uma pessoa vulgar. Agressão em desafiar? Não. Não ousaria tal ridículo.
Simplesmente constato que tua arte alcança o vulgar sim.
A arte de cada um.
A preocupação em ter ouvido alguém dizer que gostar de arte é bacana e mesmo sem entender bulhufas acha o máximo (esses são desprezíveis, pois põem-se a repetir o tal livreto, mas vc pode surprender-se com alguém que pensa por conta e risco. A arte precisa ser vista, não pode ser induzida, a arte é pra ser sentida, pensada...e não consumida como uma futilidade desnecessária.
Hoje tudo virou arte. mas tem muita coisa que não é e muita que é, qual é qual?
Não trata-se de gosto, mas de sentido.

Ainda mantenho meus sentidos na arte passada e tem muita coisa que eu não gosto também. A arte está sempe relacionada a grandes movimentos e nesse tempo o grande movimento é o pensamento sem precedentes.

Tome-me por irracional, porém não confunda-me com a pieguice.
Quando falo de arte, falo de vida em todas os seus aspectos , dimensões e sentimentos, falo de física de opinião, filosofias e suas expressões, falo de vozes sensíveis aos lados que as coisas tem , as partículas não vistas e aos conceitos estabelecidos, mesmo os não conceitos que são um pratica limitada na ignorância. Falo nada! Não falo em nome de ninguém.
Falta o respeito, respeito pelo teu pensar, e o meu.
Tenho que lidar com a pressa, com a velocidade das coisas.
Começo, meio e fim de cada vez é por esse momento em que entendemos esse tempo.
Eu diferente de vocês, odeio estar num lugar que gosto e se estou para conversar, estou para conversar. Mas se vou para apreciar então quero apreciar e pensar, Não é pensar certo, pensar errado, um momento que meu pensamento faz silêncio. Mas depende do museu, tem museu que vc interage com a arte, pode, deve, faz parte da proposta. Outros não.
Enquanto isso o povo esta mais é muito mal alimetado de arte por não fazerem a menor idéia do que isso seja...mas de realyt pode perguntar sobre qualquer um que eles vão saber responder.


beijos,

Rui Sousa disse...

O amor é feito muitas vezes de excessos ( quase sempre ) e embora todos saibamos que gostar não dá titulo de propriedade, nunca conseguimos pensar assim no momento em que defendemos/ falamos do objecto amado. É óbvio que a arte é importante para o mundo, mas a arte não é o mundo. Como diria o outro “ Há mais coisas no céu do que a tua vã filosofia imagina “. Esta é uma frase sábia, concordarão comigo. O mundo sempre foi composto de muita coisa e o meu desejo sincero é que deveria haver sempre espaço para essas diferenças, nas proporções devidas, claro está. O mundo não acaba por haver quem vê a arte por este ou por aquele ângulo ( ou mesmo sem ângulo nenhum ou por todos os ângulos ). O que é que sabemos nós das pessoas que se passeiam pelo Moma? São felizes, infelizes, divorciadas, viúvas, órfãs? Têm todas o mesmo tipo de ansiedades e inquietações? Se não têm deveriam ter? Quem é que nunca se passeou por um museu simplesmente pelo prazer de se sentir ali bem ( tipo retiro espiritual ) mas com a cabeça noutras latitudes. Não me parece que daí venha mal ao mundo. As coisas existem, e é bom que existam. A forma como cada um as consome não deveria fazer parte das nossas inquietações. Em relação aos artistas macacos, é isso mesmo, são artistas e macacos ( cada macaco no seu galho, portanto ), mas o tempo, esse sim, verdadeiramente macaco colocará tudo, depois, no devido lugar, deixando-nos no fim dos fins confrontados com a terrível verdade ( máxima indiscutível ) de que na vida tudo passa. Acho que ainda estou na fase de achar que não posso viver sem arte, mas cada vez mais me lembro da Sofia de Mello Breyner quando por fim dizia “ O que eu gosto mesmo é de ver o mar “.

Não tenho por hábito navegar na blogosfera mas alguma utilidade isto há-de ter…quanto mais não seja para reencontrar antigos colegas esbalenses.
Viva Silvares……. e parabéns pelo trabalho

Silvares disse...

Caríssimos comentadores, fico sensibilizado por partilharem neste espaço tão aberta e completamente as vossas perspectivas sobre uma questão como esta. De tal maneira que o meu comentário aos vossos comentários é o post acima deste. Um "post coelhinho", como poderão constatar.

luisM disse...

Pois, abrindo a porta e deixando os convidados entrar na sala em penumbra, com o ruído do exterior abafado pelos vidros da janela e a televisão apagada, começam a surgir pensamentos engraçados. Esta casa é do Silvares, ele que sirva as bebidas e modere a conversa :), se for capaz :)), antes de chegar à reforma! :)))

No meu ponto de vista, foram ditas coisas muito curiosas atrás, mas, não me sendo possível (sem abusar da paciência do nosso anfitrião}, comentá-las, gostaria de referir o texto de Rui Sousa, sobre a apropriação individualizada dos espaços.

É um facto em que estamos numa época que valoriza a iniciativa e a liberdade do indivíduo. A normatividade tende para a fluidez, ou pelo menos para a adaptação às circunstâncias, aos indivíduos ou aos colectivos. Também penso que não é necessário ir a um museu para ver a colecção de enfiada e voltar lá vinte anos depois, para fazer o mesmo. Actualmente este é o modelo turístico de índole cultural: vai-se lá e arruma-se a coisa. Podemos entrar para ver uma peça apenas e gastar com ela o tempo que o público normalizado, numa visita de pacote, gasta com toda a colecção. E podemos simplesmente estar lá, como disse Rui Sousa. Mas o que criticam os outros intervenientes (penso), não é o estar, mas o confundir os espaços, o agir no seu interior como noutro sítio qualquer. Os espaços existem com determinados objectivos, para determinados propósitos e pressupõem determinado tipo de utilização individual e social. Por isso é que no seu projecto e execução trabalham, em princípio, especialistas, que pensam num sentido a atribuir a essa organização urbanizada. É claro que o público se apropria dos espaços públicos de acordo com a sua ideologia e o seu imaginário referencial e simbólico. Mas o que se passa na sociedade do turismo de massas normalizado é a confusão, a desinformação e a pouca educação que as massas (hoje público) possuem para entenderem as especificidades dos espaços e serem capazes de definir os seus limites e o âmbito da sua "actuação".

Dito de outro modo, ir a um museu não é o mesmo que ir a um estádio de futebol, ou estar no café. Não é uma questão de liberdade individual a ser posta em causa, é uma questão de entendimento do espaço urbano (que pode ser bem desenhado ou mal) e de agir em conformidade. E o que se passa frequentemente, à pala da liberdade, é que muita gente sem essa sensibilidade desenvolvida, tende a uniformizar a confundir e a agir segundo padrões de comportamento (normalmente pobres) idênticos em todas as situações. Com atender calmamente o telemóvel no cinema, ou comer pipocas e chupar a Pepsi-Cola até à última gota, e por aí fora, como se estivesse no seu espaço privado. Não é o problema de dormir no cinema, é o de ressonarem sem se importarem com isso, como se pagar o bilhete lhes tivesse dado esse direito e mais o de cuspirem no chão ao acordar. Como é evidente, nada disto diz directamente respeito ao entendimento dos objectos de arte, mas ao estar nas coisas com ALGUM propósito.

Ena que comprido que isto está. É da chuva que não me deixa sair!

Desculpa Silvares!

Ps: Olá e obrigadoske Eduardo.

Jeany disse...

Huahuahua...demorei um pouco para perceber!

Acho que devo estar realmente cansada hoje, rs!

Tava precisando rir um pouco!

Espero uma visitinha tua, hein?

Beijão, Jê