quinta-feira, maio 29, 2008

Nós próprios não estamos a ver lá muito bem...

Nesta pintura de Brueghel, o Velho, vemos uns quantos homens, miseráveis e cegos. Uns caem, os outros confiam nos seus guias. E vão cair também. Vítimas de cegueira ou de confiança cega, não interessa para o caso. Em fundo um templo. Os cegos vêm de lá ou para lá se dirigem. Não faz diferença. Eles vão cair. E o templo permanecerá, indiferente.


quarta-feira, maio 28, 2008

Jokers

Resposta do ministério a questão levantada pelo CDS-PP
Centros de Saúde aconselhados a ignorarem faltas por greve na avaliação

Esta é forte! Temos um governo apoiado por um partido que se auto-intitula socialista. E é preciso vir um partido de direita questionar os processos... direitistas(?) promovidos pelo dito governo (de esquerda !?) na avaliação de funcionários públicos.
O mundo anda de patas pró ar ou é apenas este Partido Socialista a perder o tino a cada dia que passa? Agora é o CDS a reclamar o direito à greve e o PS a querer castigar os trabalhadores que usufruem desse direito constitucional? Muito sinceramente, sinto-me enojado até ao vómito com tanta hipocrisia.

Hipocrisia de uns, que não temem que o espelho pela manhã reflicta uma rosa onde devia estar um punho fechado, e de outros, que não olham a meios para atacar o inimigo mesmo que isso signifique fazerem o pino quando se olham ao dito espelho.


segunda-feira, maio 26, 2008

Tempo




Esta manhã, quando comprava o jornal e cinco envelopes na papelaria da esquina, olhei o relógio e exclamei "Já é quase meio-dia caramba!". A Dona Ana confidenciou-me que também se surpreendera com a rapidez com que a manhã se transformara em princípio da tarde. "Se calhar há mesmo dias que passam mais depressa que outros." respondi. A Dona Ana olhou-me de um modo estranho e balbuciou "Se calhar...". Saí da papelaria a pensar nisto mas entretanto tinha-me esquecido. É que a tarde avança com certa lentidão.

domingo, maio 25, 2008

Olhem só!

Imagem e texto recebidos por e-mail.

Classicismo

De cima para baixo: Augusto de Prima Porta reconstituído, pintado com lábios de meretriz e tudo; um belo gnomo de jardim caçador de borboletas todo pintadinho como convém e, finalmente, uma cabecinha de Calígula meio pintada e meio como devia ser e nunca foi.

É certo e sabido, a imagem que construímos da arte chamada clássica assenta num erro de palmatória. Desde que o interesse pelos mármores romanos atingiu a intelectualidade europeia no século XVIII, no dealbar da época artística que conhecemos pelo rótulo de Neoclassicismo, começámos a construir uma ideia errada sobre os gostos dos nossos antepassados.

O contacto com essas obras deu-se muitos séculos após a sua realização e o tempo tratou-as com grande falta de respeito, adulterando-as por completo. As tintas que as cobriam desapareceram ao olho nú e frequentemente tomou-se por obra prima aquilo que mais não era que mera cópia.

É conhecido o fascínio dos romanos pela grandeza da cultura grega. Isso levou a que copiassem obras importantes da estatuária grega trabalhando-as em mármore. Quando essas cópias foram redescobertas no século XVIII foram tomadas por originais e assim admiradas, estudadas e copiadas, tornando-se paradigmas do ensino académico. A força deste erro foi tal que se impôs como gosto dominante até aos dias de hoje.

Recentes estudos, baseados em técnicas de análise bem mais rigorosas, mostram como estávamos profundamente enganados. Afinal, gregos e romanos, pintavam as suas estátuas numa tentativa consciente de aproximarem as suas obras dos modelos que representavam. A cor conferia à tridimensionalidade das estátuas o derradeiro toque realista que tanto agradava, sobretudo, ao espírito prático dos romanos.

Vestígios de tinta e outros materiais utlizados na Antiguidade permitem refazer os modelos considerados clássicos, dando-lhes um aspecto bem mais vivo do que o habitual monocromatismo a que estivemos habituados nos últimos três séculos. Afinal a sobriedade com que nos habituámos a olhar para a escultura da Antiguidade necessita de uma revisão bem mais estridente. As obras têm um aspecto próximo daquilo que hoje consideramos kitsch, ao nível de um gnomo de jardim ou de um dálmata de louça.

Enfim, isto mostra-nos como escrever História é um exercício arriscado. Corremos o risco de desenvlovermos raciocínios tendo como ponto de partida grosseiros erros de análise e, depois, torna-se complicado "refazer" a verdade quando nos apercebemos do logro. No caso das artes plásticas a coisa não é nada pacífica, havendo muito boa gente que prefere ignorar os factos para continuar a glorificar formas artísticas que nunca existiram. Ou melhor, há muito boa gente que prefere continuar a admirar obras primas realizadas pelo Tempo sobre os originais de artistas esquecidos que, afinal, tinham um mau gosto do caraças. Ou não.

sábado, maio 24, 2008

Eurorratas

Deus renegando a alheira e o queijinho da Serra


A União Europeia é uma coisa que se inventa nos corredores e gabinetes de edifícios em que se sonha não haver ratazanas nem baratas (pelo menos das que andam descalças). Edifícios que têm temperatura ambiente regulada com ar forçado, nem muito quente nem muito fria e a água nas torneiras é mais equilibrada que um dos halteres utilizados no ginásio do rés-do-chão.

Os gajos que trabalham nesses edifícios são os "operários construtores" dos fundamentos da União. Consta que não se peidam e que todos usam fio dental (nos dentes). Os gajos vestem fatos e usam gravata. As gajas também, mas nem todas. Há daquilo para mulher, para homem e, viva a igualdade de direitos, para todo o tipo de pessoas, conforme (ou independentemente d)a sua orientação sexual. Cinzento, azul escuro, castanhos vários, sei lá, a paleta não é muito alegre nem variada que estes gajos e gajas não são ninguém em particular. São os chamados "eurocratas" (por mim até podiam ser "eurorratas" que é basicamente a mesmíssima merda).

Não se percebe muito bem se por falta de ar puro (ou, pelo menos, ar não-forçado) se por não terem mais que fazer ou se, muito simplesmente, por serem verdadeiramente broncos que nem calhaus, os "eurorratas" (gosto desta palavra) lembram-se com frequência de propor e impor regras absurdas.

A paranóia com a designada "segurança alimentar" é inacreditável e consegue levar à loucura as mentes mais avisadas. Habituados a comer pizza e hamburguer, lasagna de pacote e leite hiperpasteurizado, adoradores do plasticozinho empacotante e da uniformidade mais absoluta, os "eurorratas" não têm mãos a medir. As regras de higiene impostas são tão estúpidas que nem consigo encontrar adjectivo que se lhes cole com justeza. Um dia destes acaba-se o queijo da Serra da Estrela ou os presuntos de Chaves. Vão-se as alheiras de Mirandela e até os pastéis de Belém passam a ter que ser ensacados antes de irem para a vitrine. Faz algum sentido? Quem pediu a estes retardados para nos virem proteger?

Entretanto e ao que parece a McDonald's não deverá ter problemas, nem a Pizza Hut, nem as multinacionais da comida merdosa, porque as regras parecem ser feitas a pensar na forma como esses gajos enchem o pessoal de merda até à raíz cabelos com comida do pior. Mas sabe tão bem!

Por cá a ASAE vai-se tornando uma espécie de papão (um papão é um gajo que é mais papista que o Papa) e fecha manjedouras umas atrás das outras e deita fora tudo o que for papinha e que não esteja devidamente embalado, etiquetado, pintado, corado, bem cortado e atado com fiozinho de plástico nº6, conforme a norma 886C/08 emanada no próximo dia 29 do corrente com efeitos retroactivos e coimas tabeladas de acordo com o ordenado mínimo de um inspector finlandês. Estes gajos já fedem.

Um dia destes vamos ter de ir a restaurantes clandestinos para podermos comer certos produtos que, não tarda muito, vão ser coisa ilegal. Vamos arriscar multas e, quem sabe, a prisão, para podermos saborear um bom queijo ou um bom enchido, degustado na cave da esquina com pistoleiros à porta prontos a abater o primeiro fiscal da ASAE que atravesse a rua.

Resumindo e concluindo, está na hora dos "eurorratas" começarem a saír dos buracos onde se escondem para pensarem o mundo. Está na hora de perceberem que a Europa não é aquela porcaria que eles imaginam e que os europeus não precisam de "eurorratas" que lhes digam o que podem e não podem comer. Isto já é demais.

Nota: não deixa de ser irónico que este post surja a seguir ao anterior...

sexta-feira, maio 23, 2008

Portugal...


Sente-se. É como o vento. A pobreza instala-se comodamente e nada parece capaz de a fazer levantar o cú do nosso país. Antes da revolução era extrema, visível, fazia parte da paisagem. Bairros de barracas, esgotos a céu aberto, putos ranhosos a correrem rua abaixo numa nuvem de poeira. 30 e tal anos depois conseguimos escondê-la mais ou menos. Alojámo-la em bairros sociais, vestimo-la com roupas de marca contrafeitas e até lhe conseguimos oferecer um telemóvel. Para disfarçar. E ela fica. Vai ficando. E cresce e tudo.
Confirma-se. Portugal é o país da União que maior fosso cava entre os mais ricos e os mais pobres. E parecemos conformados com essa vergonhosa condição. As classes dirigentes assobiam para o lado, dizem que não é bem assim, que é mais tipo talvez não. Os príncipes da economia explicam a coisa com gráficos coloridos e expressões impenetráveis. Ele é a conjuntura internacional, o preço dos combustíveis e o diabo a quatro. Tudo se explica e sonha-se com a retoma.
Mas a fomeca bate fundo nas costelas. E quem tem fome não quer saber da conjuntura nem da puta que a pariu. E é de fome que se fala quando se fala de pobreza. Não é só a exclusão do tecido consumista, não é só a falta de um computador pessoal na salinha de estar ou um comando MEO na palma da mão. É pão e sopa. É falta de tudo, até do essencial.
Isto está verdadeiramente mau. Mau de mais para ser verdade a suportar durante muito tempo. Há por aí uma guerra surda. Já não será uma simples luta, quando estalar vai ser uma guerra. Mas o estado policial tem meios para se defender e manter os pobres do lado de lá da cerca. Um dia destes vai ser complicado olhar para o espelho. O que ainda é mais lixado é que não se vislumbra processo nem vontade de dar uma volta a esta merda.
Ai Portugal, Portugal...

quarta-feira, maio 21, 2008

Esta fechou, Sr. Ministério


A escola Anselmo de Andrade esteve fechada todo o dia. Terá sido uma das únicas em todo o país, a fazer fé nos dados fornecidos pelos serviços do Ministério da Educação. O fecho dos portões ficou a dever-se a uma greve que, para o mesmo Ministério, foi "inexplicável". A vida tem destas coisas, mistérios!

Mais uma vez Sindicatos e Ministério parecem viver em universos paralelos e falam linguagens tão diferentes que ninguém os entende. O mesmo facto merece leituras diametralmente opostas e a comunicação social não parece ter capacidade (ou será falta de interesse?) para clarificar a questão.

Fica a Greve, real e explicada para quem for capaz de tentar compreender as motivações dos grevistas. A minha Escola fechou e, ao que vejo, muitas outras por esse país fora. A questão prende-se com a precaridade de emprego dos designados Auxiliares de Acção Educativa. Cada vez são menos e a sua raridade começa a provocar sérios problemas de funcionamento no quotidiano das escolas. Com o despedimento ou aposentação de alguns milhares a adivinhar-se para o final deste ano lectivo, o início do próximo promete confusão. Mas depois se verá. Com este Ministério é sempre assim, os problemas resolvem-se em cima do joelho ou então ignoram-se, mais pura e muito mais simplesmente.

A ver vamos, como diz o cego.

segunda-feira, maio 19, 2008

Superhipersensibilidade

Anda por aí uma discussão meio velada desde que Bob Geldof afirmou, numa conferência promovida pelo BES sobre desenvolvimento sustentável, que "Angola é um país gerido por criminosos". As reacções da imprensa angolana não se fizeram esperar e, entre insultos vários e conselhos explícitos, mostraram que os interesses comerciais e económicos podem fazer da liberdade de expressão uma mera questão de pormenor.

É claro que os visados pelas palavras de Geldof estão no direito de se sentirem insultados. É também evidente que o músico e activista irlandês ultrapassou as habituais fronteiras de contenção verbal que são normalmente exigidas pela diplomacia do discurso público. Resta saber até que ponto há exagero nos termos utilizados por um e outro dos lados desta polémica.

Geldof será um bêbado? Talvez se enfrasque de vez em quando, decerto que o faz. Um ponto a favor dos anónimos articulistas do Jornal de Angola. José Eduardo dos Santos tem as mãos limpas de sangue mal vertido? O que dizer dos assassinatos sistemáticos de membros da UNITA? Marca Bob Geldof. 1-1.

E poderíamos ir por aí fora, num jogo de ataque e contra-ataque, num embate com resultado previsivelmente favorável ao ex-vocalista dos Boomtown Rats. O que me faz referir este episódio no 100 Cabeças é mais o que se não disse ou tenta ignorar. Nas reacções angolanas há uma imensidão de recados mais ou menos cifrados que aconselham juizinho a certos actores relevantes da economia portuguesa. Conselhos de juizinho, boca calada e até alguma acentuada curvatura na coluna vertebral sempre que se refiram ao Presidente angolano e seus comparsas não merecem troco por parte dos visados cá do burgo.

Para compreendermos um pouco melhor o grau de hipersensibilidade que afecta os poderosos angolanos e seus mais indefectíveis guardas da revolução lancemos um olhar sobre a polémica provocada por José Eduardo Agualusa que afirmou que Agostinho Neto foi um poeta medíocre. Há uma espécie de estado de intocabilidade para as figuras cimeiras da mitologia angolana contemporânea e quem se atreve a pô-las em causa, seja com bons ou maus modos, está debaixo do fogo cerrado dos defensores da pureza absoluta dos líderes angolanos. Disparam insultos, insinuações, parvoíces várias e maus-fígados.

É no entanto de notar um pormenor interessante; no meio de todo o palavreado de defesa da moral e dos bons costumes raramente se encontra um desmentido ou um argumento que contradiga com clareza as acusações ou meras observações feitas pelos supostos inimigos da bondade de Eduardo dos Santos, respectiva família, demais amigos dirigentes e restantes divindades revolucionárias angolanas. Há ameaças expressas ou veladas, sugestões de vícios horrendos que afectam os "outros" (depreende-se que os defendidos sejam puros como água da chuva) mas os factos invocados não são rebatidos nem desmentidos. Há como que uma aceitação da corrupção evidente dos poderosos e dos seus actos públicos e notórios que devem, muito simplesmente ser omitidos e ignorados por todos tal como o são pela imprensa angolana. A mensagem é clara: não se morde a mão que nos dá que comer (mesmo que tenhamos dentes bem afiados).

Em Angola parece existir um estado surrealista, governado por personagens literárias que retratam alguns dos instintos mais impróprios do ser humano. Infelizmente para muitos essa aparente ficção é dura realidade. Para outros é uma espécie de mentira que importa proteger pois apesar de dura é também doce.

Questões de perspectiva?

domingo, maio 18, 2008

Fazer o que tem de ser feito


Todos os dias há alguém a choramingar que este país não tem saída, que somos uma corja de ingratos, incapazes de fazer funcionar uma sociedade de consumo baseada na livre concorrência. Todos os dias somos confrontados com a inoperância das nossas instituições, com juízes sem juízo e fiscais que actuam em alcateia tentando provar ao mundo que as leis em Portugal são para cumprir e que quem as não cumpre leva porrada com medida certa e bitola cega. Não há cá pão pra malucos!
Não passa um dia sem que a Assembleia Legistativa legisle mais um pouco, na sua via para o Nirvana social, e nos brinde com mais uma ou outra pérola legal em benefício do colectivo e para gáudio de certos particulares.
Não passa um dia sem que alguns de nós morram porque tiveram de esperar numa urgência hospitalar mais do que permitia a força humana, enquanto outros são recebidos por enfermeiras boazudas num átrio com música ambiente para desencravarem a merda da unha do dedo mindinho da pata esquerda. Já mancava.
Não passa um minuto sem que sejamos confrontados com provas inequívocas de Portugal é uma tremenda ficção mas, mesmo assim e apesar de tudo, uma ficção em que até nem é mau de todo viver... desde que estejamos do lado certo da barricada. Do lado de cá do muro que divide os muito pobres dos pobres mais-ou-menos-ricos.
Falta fazer aquilo que tem de ser feito. Falta conseguir despoletar o milagre. Se a Nossa Senhora de Fátima tiver que regressar que regresse. Que venha às oito da noite que é o horário em que as coisas públicas acontecem. Que venha e nos una uns aos outros, que nos ponha a todos a trabalhar no mesmo projecto. Que nos convença por maravilhosas artes divinas que a vida tem um sentido. Que explique à Judite de Sousa ou ao Rodrigo Guedes de Carvalho (não acredito que a Virgem aguentasse uma entrevista com a Manuela Moura Guedes) que o sentido da vida é construir um mundo melhor para os que hão-de vir a seguir a nós. E que assim, o mundo será um lugar cada vez mais aprazível em direcção ao Nirvana social. A Virgem que explique que o mundo não é para consumir mas sim para melhorar e construir.
Pronto, está feito. Acabei a minha oração dominical.
Amen.

sábado, maio 17, 2008

Rauschenberg morreu, Lucien Freud nem por isso


Aqui há dias morreu Robert Rauschenberg (recordêmo-lo jovem e a preto e branco). Com ele foi-se uma boa parte da energia dinâmica que ainda restava a uma certa maneira de produzir objectos com possibilidades de virem a ser encarados como sendo artísticos. Não há muito tempo visitei com os meus alunos alunos a exposição deste matador de toiros académicos que esteve patente em Serralves. Foi uma tarde de exclamações e perplexidades. Mesmo em 2008 os trabalhos do velho "Rauchas" fazem mossa nos nossos preconceitos mais arreigados. Um gajo com qualidades artísticas invulgares e um humor corrosivo. Lá vai ele em direcção ao Grande-Sabe-se-Lá-O-Quê.
Cá na Terra mantém-se firme o inigualável Lucien Freud. Foi também notícia mas porque se vendeu uma obra sua (na imagem acima) por um daqueles preços astronómicos cujo número não faz sequer sentido. Bem vistas as coisas, Freud tem já 86 anos. É um daqueles tipos que têm mais que fazer do que morrer mas os investidores em coisas pintadas já desatam o cordame da bolsa com o à vontade proporcionado pela miragem do negócio chorudo. Um dia destes vai fazer companhia ao "Rauchas" e o balúrdio que se pagou pela "Big Sue" multiplica-se mais do que uma vez. Simples e eficaz.
Rauschenberg e Freud, diferentes como só podem ser diferentes dois criadores em campos diversos. As obras de um e outro estão aí, na História da arte, dois mitos capazes de saborearem o ser mito durante a vida que viveram. Já vou escrevendo o verbo viver no passado pois o neto do mais famoso dos psis já tem, pelo menos, um pé para a cova. Quando ele morrer falecer-nos-à um soberbo criador de imagens. E são cada vewz mais poucos.

quinta-feira, maio 15, 2008

Desculpas


O Bartoon de hoje no suplemento P2 do Público lança um olhar sobre a (quase) patética questão do "fumício" ministerial no já tristemente célebre vôo em direcção a Caracas. O 1º ministro pediu desculpas e até tomou a decisão de deixar de fumar. Parece pretender colocar uma pedra sobre o assunto ao assumir esta espécie de auto-flagelação como forma de expiar o seu pecado cívico.
Luís Afonso é um cartoonista genial. A sua capacidade de acompanhar os acontecimentos do nosso quotidiano com leituras extremamente inteligentes e estimulantes é assinalável.
A questão que eu gostaria de colocar é a seguinte: basta um pedido de desculpas para que possamos passar adiante de tão ridículo acontecimento?
Quer-me parecer que, antes de passarmos adiante, deveremos reflectir um pouco mais sobre a natureza e o espírito da coisa. Por um lado, Sócrates e os seus "muchachos" foram (e são) responsáveis por uma lei antitabagista arrasadora e fundamentalista e respectiva aplicação.
Começa a constituir motivo de lenda a forma desapaixonada e descabelada como a ASAE actua em todas as situações de repressão perante o desrespeito da Lei. Funciona quase como uma seita, uma espécie de Ku Klux Klan, que nos protege de nós próprios e da nossa tendência para caírmos que nem patinhos nas terríveis malhas que o vício tece. O guru máximo da coisa é o próprio Sócrates, agente implacável das reformas necessárias para colocar Portugal nos eixos, conferindo-lhe alguma credibilidade num contexto de "limpeza" eco-democrática. O próprio 1º ministro faz jogging para as câmaras de TV, mostrando saúde e, pelos vistos, fuma umas cigarradas lá atrás, nos bastidores. Está mal.
O problema de se ter tornado público o episódio do fumo aéreo da comitiva ministerial não é tanto o acto em si mas sim o que ele tem de simbólico. Então o guru da sanidade cívica desrespeita uma regra de ouro da coisa? É como aqueles puritanos fanáticos religiosos que são apanhados a dar umas quecas descontroladas em prostitutas de luxo ou entregando-se a devaneios homossexuais que publicamente repudiam.
"Faz o que eu digo, não faças o que eu faço". Sócrates poderia assumir esta postura mas não. Ele pretende ser perfeito. Pretende ser Engenheiro e tudo. Sócrates, ao fumar naquele fatídico vôo intercontnental, mostrou que não passa de um pretensioso. Aquela imagem de rigor implacável que tão meticulosamente alimenta é, afinal, de uma fragilidade vítrea. Se cede tão facilmente ao vício de fumar que desrespeita alegremente uma lei por ele imposta com soberba e paixão exagerada, como será com questões de outra natureza que exijam concentração e seriedade? Um homem de Estado como o que Sócrates pretende ser, está muito acima destas merdices. É muito superior a isto. Mas, afinal, Sócrates mostra que não é aquilo que pretende ser. É um fracote como eu que continuo de cigarro ao canto da boca e procuro a todo o momento desculpas para ir contra as minhas próprias convicções desde que isso me proporcione prazer imediato ou atenue uma qualquer sensação de desconforto.
Não, meu caro, esse seu pedido de desculpas não basta. Pode ter a certeza que vai ter de pagar por isso. Falta decidir ou desvendar essa forma de pagamento.

quarta-feira, maio 14, 2008

Se fosse haxixe era pior! Seria?


O episódio da fumaça em viagem sobre o Oceano Atlântico mostra como a lei é encarada por aqueles que nos governam. Para eles, a lei é coisa que se aplica aos outros. Quantas vezes vemos carros da polícia estacionados em segunda fila ou professores a atenderem telemóveis no meio de reuniões sem pestanejarem sequer? Mas isto não é defeito, é feitio. Dizem que até os romanos se arrepiavam com os nossos antepassados lusitanos, uma malta que nem se governava nem se deixava governar, segundo consta.

A dificuldade de aplicação das leis é um fado português. A nossa Assembleia legisla que desunha. Legisla sobre tudo e sobre nada. Piercings, fumo, galheteiros, nada escapa à apertada malha da legislação nacional. Mas na prática fica tudo em águas de bacalhau e ninguém cumpre e só é castigada pelo incumprimento uma mão-cheia de gajos azarados que têm o galo de serem apanhados por um agente da lei mal humorado.

O caso, na verdade, nem merece comentário. Mas sempre vos digo, amigos meus, se fosse haxixe que o engenheiro e o Pinho estivessem a enchaminar lá no alto da barriga do avião era pior. Ou talvez não fosse. Se fumassem uma ganzita de vez em quando talvez não andassem por aí a semear tantas leis tão sisudas e disparatadas. Talvez ...

segunda-feira, maio 12, 2008

Este gajo (já) não tem graça nenhuma

Herman José já me fez rir a bom rir. Muitas vezes. Há muito tempo atrás. Desde que se convenceu que tinha outras qualidades para lá da representação humorística começou a decair e a definhar a olhos vistos. Os seus talk shows eram cada vez mais deprimentes, a sua incapacidade para perceber a fronteira entre a inteligência e a indigência intelectual cresceu, cresceu, cresceu e, finalmente, rebentou. Herman transformou-se num palhaço mau e sem graça. Um chato da pior espécie. Da espécie de chatos que pensam que os outros todos é que o são. Aquela espécie de chato que se considera muito bom, grande, incomparável.

Caído no esquecimento, ultrapassado em popularidade por todos os humoristas que fazem humor, Herman é hoje um tipo ressabiado e com maus fígados, com sorriso forçado e riso de plástico. Um dia destes vai regressar como apresentador de um concurso televisivo, mas isso não disfarça a sua falta de capacidade para compreender que a fazer o que faz agora não presta. Herman não perde uma oportunidade para mostrar a sua imbecilidade infinita. Esta noite, na gala dos Globos de Ouro na SIC, foi chamado ao palco para entregar o prémio ao melhor intérprete musical masculino. Decerto porque o concurso que vai apresentar tem qualquer coisa a ver com música mas ele vai transformá-lo numa imensa celebração da sua miséria intelectual, como de costume. E foi isso que Herman fez de novo, esta noite. Jorge Palma receberia o Globo de Ouro mas teve o azar de ser o palhacito a passar-lho para as mãos.

O que se passou no palco foi miserável. Herman José não sabe deixar-se ficar no seu lugar e está em permanente over-acting. Jorge Palma bem tentou disfarçar a porcaria que o suposto humorista provocou. Mas era impossível. Herman quis pegar-lhe ás cavalitas mas fê-lo cair sobre os cotovelos. Palma tentou manter a compostura fazendo os agradecimentos deitado no palco mas Herman estava imparável na sua boçalidade e, incapaz de conter a sua ânsia de ter alguma graça, por muito pouca que fosse, agarrou o cantor pelas pernas e tentou puxá-lo para fora de cena. Não parou um segundo de fazer coisas parvas... inconcebivel, um espectáculo deprimente, como se fosse uma criança habituada a ser o centro das atenções mas que cresceu e se tornou um adolescente com borbulhas a pingar pus, Herman foi o mais imbecil dos imbecis que já vi fingirem ter graça.

Pacman, dos The Weasel, veio ao palco alguns minutos depois para receber um Globo e sentiu necessidade de afirmar a grandeza de Jorge Palma no panorama musical em contraponto à pequenez do ex-humorista. Só lamento que Jorge Palma se tenha visto envolvido nesta exibição lamacenta de falta de charme e ausência de qualidade. Quando vejo Herman a ser ele próprio, compreendo que o que me fazia rir não era ele. Era outra coisa que ele já não tem: gajos que lhe escrevam textos capazes de lhe disfarçar a falta de graça.

domingo, maio 11, 2008

A verdade da mentira*



O reitor do santuário de Fátima assinou um artigo no jornal lá do sítio, disparando em todas as direcções acusações de mentira, pretendendo atingir com elas o maior número de mentirosos possível. Saiu o artigo no Voz de Fátima, a notícia do artigo no Público online, o mundo roda pacífico como é costume.

O senhor Reitor afirma: "Mente-se nas grandes instituições, mente-se entre as pessoas responsáveis pela sua liderança, mente-se nas nações, nos Governos, nos sindicatos, nas empresas, nos partidos, em toda a espécie de associações (e não só no futebol), mente-se até nas instituições criadas para educar e defender as crianças” ao que parece só não se mente no seio da Igreja a que ele pertence.

Estamos a dois dias da comemoração de mais um aniversário da aparição da Nossa Senhora aos três porquinhos. Os peregrinos já se dirigem para Fátima aos magotes. Os comerciantes limpam o pó às santinhas mais carunchosas e os vendedores de sonhos impossíveis treinam mais uma reza infalível para curar cancros, furúnculos ou mais simplesmente para curar a fadiga que é, para muitos, o simples facto de existirem.

Já nem sei há quantos anos dizem que se deu a coisa. Vai para uma carrada deles. Todos os anos a igreja católica reafirma a fé nas aparições e cita-as como exemplos de esperança para a humanidade em busca de um lugar de redenção. Parte-se do princípio, é claro, de que as aparições foram um facto, que quando se fala delas, quando se afirma que elas foram verdadeiras, não se está a mentir.

Aceita-se o sacrifício dos peregrinos que se arrastam pelo chão pagando promessas à Virgem sem os tentar demover. Uma espécie de banquete onde o sofrimento é o prato principal e o misticismo serve de molho. Tem crendice para a sobremesa. Tudo isto em nome da verdade. Tudo isto com o fito de aguilhoar a mentira e o cepticismo daqueles que não acreditam na bondade da mensagem mariana e pensam, como eu, que o verdadeiro milagre de Fátima reside na transmutação da economia em fé cega (e vice-versa).

*A Verdade da Mentira, filme de James Cameron com Arnie Schwazzie e a Jamie Lee Boobies a protagonizarem a função.

Extra Terrestre



Hoje (já passa da meia-noite e por isso parece que hoje já é amanhã) fui ver o concerto de Diamanda Galás na Aula Magna, em Lisboa. Absolutamente, simplesmente, completamente. Uma coisa digna de ser vista (a sala estava aí por menos de metade). A mulher é indescritível, uma diva extra terrestre. Sozinha sobre o palco com um piano de cauda que toca magistralmente, Diamanda Galás arrasou com a cumplicidade discreta de um técnico de som capaz de levar a voz dela até ao Paraíso, para incómodo de Deus. Lindo de tão estranho. Seguramente um dos melhores (e mais perfeitos) acontecimentos que já vi sobre um palco. Estou rendido.

quinta-feira, maio 08, 2008

segunda-feira, maio 05, 2008

A grande ilusão


Afinal a Democracia não puxa tanto pelos cidadãos quanto devia. Pelo menos a nossa. Parece até que nos empurra para o sofá, que nos quer ali, de boca aberta, a olhar para a televisão, a ver programas meio imbecis. Telejornais infindáveis com intervalo e publicidade que se batem com as telenovelas em termos de audiências. Estranho? Não, nem por isso. Os telejornais têm alinhamentos que fazem deles uma espécie de super-novelas, com o picantezinho da realidade a excitar o pessoal. É a velhinha que foi mordida por um cão perigoso, logo após as últimas das eleições para a liderança do PSD. Segue-se a crise alimentar. E o pessoalzinho vai jantando enquanto assiste. O “caso Maddie”. Pão e circo. Depois as novelas, propriamente ditas, as líderes de audiências só vêem o seu reinado abalado de cada vez que há um jogo de futebol com o Benfica ou com a selecção nacional. Coisas grandes e deveras importantes.
A Democracia precisa de cidadãos intervenientes e interessados na gestão da coisa pública. Se a Democracia proporcionar aos cidadãos instrumentos adequados a essa participação talvez eles avancem. Talvez, não é certo. Porque se a Democracia não puxa por estes cidadãos que nós somos, também nós não puxamos lá grande coisa por ela. Somos mais de ficar sentados no sofá, boca aberta, telejornal, Benfica, novela, do que de sair para assistirmos à Assembleia Municipal. Chiça, vade retro!!!
A Democracia é coisa para os políticos. A esses pagam-lhes para fazerem funcionar a coisa. A nós não nos dão nada. Olhemos para Santana Lopes. Esse sim, é um animal político, que conhece os atalhos todos à selva e não tem medo de por lá se perder. Agora nós, simples cidadãos anónimos, se metemos um pezinho numa Distrital em tempo de campanha, zás, somos logo papados até à cabeça! Mais vale ficar pelo sofá, Benfica, novela, telejornal… coisas que se compreendem e são para nós. A política não, que ninguém nos paga para isso.
Agora começamos a olhar para a nossa querida alternância democrática com a sensação de que ela pode vir a ficar coxa do PSD. Os socialistas de Sócrates esfregam as mãos de contentes. É a Democracia a falhar? Não me parece. É mais a Democracia a definhar. É como quando abriram os canais privados de TV. Prometiam variedade e competição na diversidade da oferta. Novos horizontes se abriam para a nossa eternamente jovem Democracia. E o que aconteceu? RTP, SIC, TVI: telejornais, futebol e novelas. Afinal a promessa não foi cumprida. Por razões óbvias todos os canais oferecem os mesmíssimos produtos. Tal como os diferentes partidos do chamado “arco do poder” oferecem os mesmíssimos tipos de candidatos para os lugares de governação.
Querem lá ver que andamos a ser enganados! Ou preferimos assim? O melhor é ir sentar-me ali no sofá e pegar no comando da televisão. Vou ligar-me ao mundo, olhar para a grande ilusão. Telejornal, futebol e novela. Democracia, enfim.

sábado, maio 03, 2008

Algo banal

Este filme é de uma banalidade tão banal que nem chega a poder considerar-se como tal. Pronto, está bem, a frase anterior é um bocado parva, até mesmo um pouco pretensiosa. Enfim, quis dar uma entrada a este post que estivesse de acordo com o tom geral deste "88 Minutos", um filme medíocre.
Há um actor em cena, claro que estou a falar de Al Pacino, e pouco mais. A trama pretende ser inteligente e não passa de ser entediante. A realização cumpre serviços mínimos, como se tivesse estado em greve durante a rodagem e as personagens não chegam a ganhar consistência. Enfim, tempo perdido (um pouco mais do que os 88 minutos do título). Como disse salva-se apenas o cabeça de cartaz que parece caído num planeta errado para seres da sua espécie.
A não ver. Ou talvez seja de ir ver, não sei. Que se lixe, é um filme bem merdoso.

sexta-feira, maio 02, 2008

Rebentamento

Há um conceito que me custa perceber. Mas custa mesmo muito. É a ideia de que uma economia deve crescer todos os anos, crescer sempre. As economias nacionais, locais, mundiais e todas as outras que tais. Crescem, crescem, crescem... até onde? Até quando podem continuar a crescer?

Nas empresas a questão é semelhante. Se um ano a empresa não cresce mais que no anterior, socorro, tá-se mal! É preciso despedir trabalhadores, deslocalizar a coisa para um território onde a miséria ainda seja um modo de vida aceitável. E lá vai. Lá vai a empresa embora levando consigo os postos de trabalho e pedaços significativos da vida de muita gente que fica a salivar defronte às montras do Centro Comercial.

E a economia sempre a crescer. Um bocadinho aqui, um bocadinho muito mais ali, cresce, cresce, cresce. O mundo não estica. Os recursos naturais também não. Esses, parece-me que diminuem à medida que a economia cresce. Mas cresce até onde? Qual é o limite?

Será o rebentamento?

Para ilustrar o post anterior



Meredith bem mais jovem do que aquela que eu vi (e ouvi) há uns dias em Lisboa. Igualmente estonteante.Igualmente brilhante.



Cave igualzinho ao que vi (e ouvi) há uns dias em Lisboa. Menos amorfo mas nem por isso empolgante. Ou será apenas impressão minha?