Sinto a tentação de me fechar ao mundo como se fosse uma espécie de berbigão monstruoso. Fechar-me, vedar a frincha com indiferença pegajosa e deixar-me estar, isolado, a olhar o escuro com os olhos abertos como se estivessem fechados. Ficar assim, muito quieto, sem nada para fazer, sem fazer nada.
Na escuridão absoluta em que agora me encontro tento reflectir sobre quem sou, o que faço aqui, de onde venho, para onde vou, essas coisas básicas sem as quais dificilmente somos alguém ou, sequer, alguma coisa. Mas no escuro nada se reflecte, tudo é a mais profunda sombra. No escuro dificilmente sou.
Começo a arrepender-me de ter desejado tal enormidade. Decido não ceder à tentação. Continuo aqui, a luz do sol a derramar-se sobre a minha alma; exposto à merda e à mentira, tento equilibrar o corpo sobre as pernas, tento manter alguma dignidade humana. Continuo aqui, a ser o que consigo ser ainda que não saiba bem o que isso é. Permaneço, apesar de tudo, permaneço.
Sem comentários:
Enviar um comentário