As reuniões online são espaços de comunicação estranhos. Os intervenientes estão todos encaixados em pequenos rectângulos, alinhados como produtos de consumo nas prateleiras de supermercado. Falamos. Um de cada vez. Olhos baixos, olhos em riste, cada um parece navegar nos seus pensamentos. Estamos todos no écrã mas cada um no seu espaço particular. Somos cabeças, troncos, talking heads, tanto quanto posso imaginar alguns poderão nem ter pernas, nem ser pessoas.
O tempo alonga-se. Será consequência deste espaço virtual? Teremos nós uma existência alternativa quando nos enfiamos na rede? Como peixes, como pixels, como crianças largadas na floresta com migalhas de pão no fundo dos bolsos?
"Sua conexão com a internet está instável", o aviso surge num rectângulo cinzento translúcido, as vozes dos outros ganham tons metálicos, gorgolejam como se fossem aspiradas por um ralo virtual, levadas para o fundo deste mar de entulho onde mantemos os nossos pequenos botes a boiar. Temo que haja tubarões e monstros que comem tubarões.
As reuniões online não atenuam a incrível carga burocrática que nos pesa nos ombros como canga a amestrar o boi. Começo a sentir uma ligeira vertigem, uma súbita vontade de ir embora, levantar o cu desta cadeira e pôr-me ao fresco. Desligo a câmara, desligo o som. Fumo um cigarro.
Ir embora não implica sair do lugar.