A derrocada de um edifício de oito andares onde funcionavam cinco fábricas de confecções nos arredores da cidade de Daca dá que pensar. Marcas como a Benetton e El Corte Inglés, entre outras com sede em países europeus, recebem muitas das suas peças vindas daquelas bandas. Vêm limpas, não trazem sangue.
Ali os operários ganham perto de 40 dólares por mês. 40 dólares!? Esse deverá ser o preço médio da maior parte das peças que produzem em condições laborais abaixo de cão.
Comparados com os operários europeus, os do Bangladesh não têm quaisquer direitos. São pouco mais do que escravos mas, como diz o ditado, "longe da vista, longe do coração". As grandes marcas europeias enriquecem à conta da miséria alheia. Será isto colonialismo?
Não. Isto não é colonialismo, isto é globalização. Países como Portugal perderam centenas de unidades de produção têxtil. Os nossos operários eram demasiado caros, apesar dos baixos salários que auferiam segundo os nossos padrões. Ainda por cima tinham direitos laborais! Que descaramento.
O desemprego sobe em flecha na Europa. Países como o Bangladesh vão fazendo pela vida. Isto não é concorrência, é exploração pura e dura.
14 comentários:
Estas coisas só mudarão quando os povos dos países ricos ( que somos nós ) tiverem vergonha e sentirem remorsos por alimentarem as suas vaidades à custa da miséria no mundo. Bem sei que não estamos só a falar da produção de artigos de marca e de segunda necessidade, mas este fenómeno é particularmente repugnante quando se trata deste tipo de artigos. Se formos para o exemplo dos chamados diamantes de sangue em Angola, então nem é bom falar. Ao contrário do que muitas pessoas gostam de admitir, há muita coisa que depende de nós ( povo ), para tornar um pouco mais respirável este ar bafiento que respiramos diariamente.
Rui e Rui,
estou de pleno acordo no tocante a tese em geral. Não gosto das adjetivações como: "Bem sei que não estamos só a falar da produção de artigos de marca e de segunda necessidade, mas este fenómeno é particularmente repugnante quando se trata deste tipo de artigos".
Devemos combater a mão de obra "escreva" em todos os locais, países, que prooduzam quaisquer tipo de produto, desde alimentos até artigos de marca de segunda necessidade, sem distinção. Aí a tese é válida.
Rui, a vergonha e o remorso não deveriam orientar-se em exclusivo para a "alimentação" das nossas vaidades. Penso que não podemos competir num mundo assim, que coloca as regras apenas num dos lados da competição. As mortes dos operários... bom, isso é "a" História!
Eduardo, é isso que eu quero dizer: a escravatura não tem pátria...
Rui, não é a vergonha e o remorso que se orientam para "alimentar" as nossas vaidades, é antes a sua ausência ( ou então não percebi o que quiseste dizer com a expressão). De qualquer modo ( e generalizando ) eu acho que esta notícia só é repugnante aos olhos dos ocidentais porque hoje estamos todos a provar o verdadeiro sabor amargo do veneno do capitalismo. Custa-me dizer isto mas eu acho que o que nos assusta não são as 500 mortes ( e atenção, continuo a generalizar ), o que nos assusta nisto é perceber que o nosso futuro aqui também vai ser assim.
Eduardo, apesar de tudo acho que há uma pequena diferença entre explorar para não morrer à fome e explorar para alimentar a vaidade. É um pouco como vender o corpo ou vender a alma. Quando se vende o corpo não quer dizer que se esteja também a vender a alma.
Rui, neste comércio o corpo e alma fazem parte do mesmo "pacote".
Compreendeste bem o que quero dizer. A questão é que não há fronteiras para a exploração do homem-pelo-homem.
Essa é de facto a questão. E por isso pergunto: podemos nós, os cidadãos dos países ocidentais, contribuir para resolver isso ou preferimos continuar a olhar para o lado?
Nós sempre olhámos para o lado que nos dá mais jeito. Acho que vamos continuar a fazer de conta que está tudo de acordo com uma ordem qualquer que funciona por si própria, uma ordem que é superior às nossas forças...
Rui,e Rui, acredito que quem compra o corpo leva a alma de graça. O que pode ser feito contra os exploradores dessas almas? O que o mundo ocidental pode fazer de concreto para acabar com essa prática? O que representamos, todo o mundo ocidental, contra a China, Coreia e muitos países da África? Decretar um salário mínimo universal? Boicotar todos os produtos de origem chinesa, coreana, e africana? Isso não seria decretar a morte desses corpos, que apesar de escravos ainda sobe vivem?
Eduardo, hoje o mundo ocidental já começa a não poder fazer muito para mudar isto, pela simples razão que brevemente estaremos também a trabalhar nas mesmas condições que eles. É essa a ironia do capitalismo. Quando fomos ricos nunca nos preocupámos com a miséria do terceiro mundo porque ela dava-nos jeito para sustentar a nossa qualidade de vida. E hoje que estamos pobres e deprimidos, por causa desse mesmo capitalismo, já é tarde de mais. Ter trabalho no futuro será definitivamente um luxo, seja ele qual for.
Rui Sousa,
gosto muito dessa sua colocação, mas ela é pessimista. O capitalismo tem capacidade de se reinventar. Estamos na situação que descreve não por culpa do regime e sistema, mas dos homens que os dirigiram, com nosso consentimento, com nosso voto. O capitalismo bem dosado é sem nenhuma dúvida o melhor sistema econômico inventado e testado na face da terra. Com todos os defeitos ainda é o melhor. Vide a recuperação econômica dos USA, e do crescimento da economia da China depois das mudanças ocorridas por lá. O que não nos serve é regimes como os de Cuba ou Coréia do Norte. A Europa errou ao fazer sua UNIÃO só pensando no aspecto político e monetário, não criando um Banco Central Único. Com o erro, estão fazendo os acertos necessários, e vão sair da crise melhor do que quando entraram. O custo é amargo, como todo remédio, mas o futuro recompensará. Tenho certeza disso.
Eduardo, não sei se se apercebeu de uma coisa, mas ao referir que " Estamos na situação que descreve não por culpa do regime e sistema, mas dos homens que os dirigiram, com nosso consentimento, com nosso voto ", está a dar exactamente a mesma desculpa que os comunistas deram para justificar o mau funcionamento do sistema deles, isto é, os sistemas são bons, mas as pessoas que lá foram colocadas é que estragaram os sistemas ( e não interessa aqui para o caso se umas pessoas foram eleitas e outras não ). O mundo já fez todos os experimentalismos possíveis com o capitalismo e o comunismo, ambos já nos inspiraram para a construção de sociedades melhores, mas infelizmente hoje já não nos mobilizam, e não nos mobilizam porque hoje sabemos exactamente o que é que um e outro têm para nos oferecer, e mais ainda, sabemos o que é que os dois juntos nos podem oferecer ( eu diria antes TIRAR ). Fico contente por registar aqui o seu optimismo mas eu não o consigo partilhar. De qualquer modo deixe-me descansa-lo em relação a uma questão. Eu também tenho uma costela liberal ( uma ou mais ), não porque acredite que o liberalismo tenha soluções melhores para as sociedades, mas por achar que é aquele que mais está ligado ao conceito de LIBERDADE ( o meu maior e único vício ), mesmo sabendo eu, e aceitando de uma forma cínica, que essa minha liberdade que o liberalismo me oferece, e voltando à questão inicial, é sempre à custa de um rasto de sofrimento e miséria que espalha pelo mundo.
Eduardo, o capitalismo tem, por vezes, a palavra "selvagem" colada a ele. Isso significa que haverá diferentes formas de praticar o capitalismo, nem todas boas, nem todas más. A distribuição da riqueza é o grande problema, uma vez que criá-la parece (mais ou menos) fácil.
Quanto aos erros na criação da União Europeia penso que se ficaram a dever a um certo estado de paixão que se instalou entre os povos da Europa aqui há uns anos atrás. Todos sabemos que a paixão nem sempre se transforma em amor e, quando se apaga, fica uma espécie de ressaca.
Rui, a Liberdade é, de facto, a nossa maior riqueza e essa distribui-se com maior equidade que a riqueza do capital. Valha-nos isso!
Rui eu não acho que há capitalismo bom e capitalismo mau, o capitalismo é sempre agressivo porque se funda sempre na lei do mais forte. O que existe é uma parte que vive bem por causa desse capitalismo e outra que vive mal por causa desse mesmo capitalismo. Quando se vive na parte boa tem-se a ideia que o capitalismo é bom e não selvagem, mas nesse mesmo momento está alguém a pagar a factura do outro lado do mundo que pensa exactamente o contrário.
Enviar um comentário