Esta onda que se levantou de proximidade ao Miguel Portas tem-me feito
pensar numa coisa que já me venho apercebendo há alguns anos a esta
parte. Na vida existem dois tipos de pessoas, os que ficam e os que
partem. Os que ficam são a estrutura e os pilares do edifício, aqueles
que acreditam nos valores da “construção” e lutam pela sua eternidade.
São conservadores e reacionários ao que é novo porque é uma forma de
preservarem as estruturas do edifício. Fazem trabalho de sapa, são
repetitivos na sua forma de vida e por isso cinzentos e sem magia,
fazendo da sua força, determinação e teimosia, as suas armas. Depois, do
outro lado estão aqueles que partem, que não suportam a repetição da
vida, a rotina e vivem a vida num constante vai e vem. Aparecem quando
menos se espera para desestabilizar as almas bem comportadas e
conservadoras e desaparecem na primeira oportunidade quando estão mais
próximos da vitória e da conquista. São recorrentemente amantes à solta
que espalham a sedução e contaminam os que se aproximam com o seu doce
veneno, que é no fundo o seu fascínio. Os primeiros erguem, os segundos
derrubam, os primeiros acreditam no “fazer”, os segundos acreditam no
“viver”, os segundos precisam dos primeiros, precisam das suas almas
carentes para incendiá-las com a sua paixão e para legitimar a sua vida,
os primeiros precisam dos segundos para se convencerem a si próprios
das razões da sua convicção. Uns desestabilizam, outros estabilizam. Uns
vivem uma vida cinzenta, outros espalham a cor pela vida e nós, ávidos
que estamos sempre de cor, nunca resistimos ao glamour nem ao fascínio
de quem vive em detrimento de que faz. Os irmãos Portas são a incarnação
real deste exemplo. Será que se fosse o Paulo a morrer o país se
emocionaria tanto? E se fossemos todos como o Miguel seria possível
construir um país? E se fossemos todos como o Paulo seria possível viver
neste país?
Na minha perspectiva das coisas, quando alguém falece logo se nos revela diferente daquilo que foi enquanto esteve vivo. Como diz uma canção dos Stranglers, "everybody loves you when you're dead". Fico com a sensação de que tememos mais a presença do corpo físico do que a permanência das ideias, o que não será uma atitude particularmente avisada.
Nem Paulo Portas é o diabo nem Miguel se transmutou subitamente em anjo. A vida é para ser vivida e, quando morremos, a nossa memória poderá ter alguma utilidade para os que cá ficam. Talvez seja neste ponto, após a nossa morte, que a vida ganha algum sentido.
5 comentários:
Acho que já tinha ganho em vida, mas a morte garante uma apreciação definitiva.
Rui, obrigado pelas simpáticas palavras. De facto a natureza humana é um poço de inspiração, de pecados e virtudes. há uma frase que diz que todos os Homens são bons quando não os temos que aturar muito tempo. É esta equação da relação com a proximidade do nosso semelhante e com a sua distância que nos perturba, porque nunca foi bem resolvida por nós. Parece que não conseguimos viver com os outros, nem conseguimos viver sem os outros.
Jorge, definitiva não direi. Mas perto disso.
Rui, há também quem diga que "o inferno somos nós" mas isso são já contas de um outro rosário...
Qualquer palavra minha iria estragar tudo o que eu li.
Li, pode sempre experimentar escrever essa palavra, decerto irá encontrar o lugar dela.
:-)
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