A nossa Democracia está em falta. O sistema político saído da Revolução de 1974 não foi capaz de criar condições propícias ao desenvolvimento efectivo da população portuguesa.
É evidente que as condições de vida globais da maioria dos portugueses são hoje muitíssimo melhores do que eram há 30 anos atrás. Já não há crianças descalças, de eterno monco a dançar-lhes nas arcadas do nariz, mendigando pelas ruas com esgotos a céu aberto (pois não?). Mas essa melhoria verificou-se, de um modo geral, entre a população europeia e com outra qualidade na maioria dos nossos parceiros da União. Isso parece, hoje, parte de um processo inevitável, um avanço quase automático do sistema capitalista mais ou menos travestido de Estado Providência, mais ou menos disfarçado de Socialismo Democrático, o que lhe quisermos chamar.
A nossa falta, a falha maior da nossa Democracia, está vergonhosamente retratada naquilo que fizemos ao nosso sistema de ensino. Na sofreguidão do combate ao modelo Salazar-fascista, baseado na crença de que os pobres de espírito serão felizes numa outra existência, uma vez que nesta, a felicidade já tem dono e foi comprada, convictos da bondade “Rousseauniana” da classe operária e do deslumbramento dos camponeses perante o esplendor das primeiras letras, os novíssimos pedagogos da nação lusitana atacaram a ignorância e o analfabetismo à pedrada e ao bofetão, sem subtileza nem inteligência nos processos. Os resultados são os que podemos constatar.
Ao longo destes 30 anos pós-revolução, a evolução das mentalidades foi, a bem dizer, mais uma distorção que uma evolução. Saídos de uma brutalidade rural e fundamentalista católica, os portugueses mergulharam de cabeça em pleno consumismo desenfreado com o Estado Providência a servir de almofada. Largámos Deus e o ditador de Santa Comba Dão para abraçarmos o capitalismo e a União Europeia. Sem tempo para pensar nem tempo para aprender. Basta ver, a título de exemplo, os níveis de endividamento e incapacidade económica para satisfazer compromissos assumidos por um número inacreditável de famílias portuguesas, para percebermos que anda por aí muita gente que não sabe usar uma máquina de calcular e muito menos sabe fazer contas ou planear com tino o seu quotidiano. Ninguém lhes ensinou ou estiveram distraídos nas aulas? Serão vítimas de professores de Matemática abstencionistas! Ou talvez a Escola tenha estado demasiado ocupada a explicar-lhes outras coisas, a prepará-los para longas carreiras académicas que acabaram quase sempre ao fim de 9 anos, para os mais perseverantes. Por muito que alarguemos a escolaridade obrigatória só poderemos daí retirar algum benefício se, primeiro, formos capazes de mostrar ao grosso da população qual o papel de uma escola.
Para o português comum a escola funciona mais como depósito para as suas crias do que local de aprendizagem. Isto porque, sendo reconhecidamente uma selva, Portugal aprende-se nas ruas, na falcatrua, na manhosice, aprende-se no golpe de baú que há-de ser a salvação do cidadão já que, a trabalhar honestamente, todos sabemos que ninguém enriquece. Há sempre a fezada do Totoloto… É triste, mas parece ser verdade. Os mais desfavorecidos pela “sorte” cobiçam os sinais exteriores de riqueza dos seus ídolos (esses sortudos) que enfeitam as capas das revistas e são capazes de tudo para parecerem ser aquilo que nunca serão.
Por um descapotável e um apartamento no centro podem (podemos) até vender a alma ao diabo. A prestações.