Chega-nos a notícia de que um artista plástico que fundou e dirige um museu de arte contemporânea em Casoria, perto de Nápoles, começou a queimar obras de arte em sinal de protesto contra as políticas culturais do governo italiano.
Antoni Manfredi ameaça continuar a queimar obras, à razão de 3 por semana, caso a situação de míngua se mantenha. Parece coisa de sequestrador em conversações com a polícia que ameaça executar reféns caso as suas exigências não venham a ser atendidas. Ameaçador.
Segundo Manfredi, as obras acabarão por desaparecer de qualquer modo, votadas ao abandono pelas forças vivas do poder e dos poderosos. A fogueira apenas acelera o processo (e atrai a atenção dos mass media).
A notícia é um pouco mais complexa e tem outras variantes mas, o que me deixa a pensar nesta coisa, é a fogueira.
Porque queima Manfredi as obras? Qual o simbolismo de tal gesto? Podia rasgá-las com uma faca ou disparar sobre elas uma pistola metralhadora. Poderia enterrá-las (vivas) ou atirá-las a um poço, mas não: ele queima-as.
Quererá imitar os autos de fé, esses actos extremos de máxima purificação? A fogueira traz consigo algo de bárbaro e primitivo, a redução a cinzas não permite sonhar com qualquer tipo de regresso do objecto incinerado.
Manfredi está a enviar obras de arte para lá do esquecimento em sinal de protesto contra aquilo que ele considera um desrespeito para com a Arte: o esquecimento da governo italiano. Não consigo decidir qual o acto mais reprovável.
Talvez Manfredi esteja a pensar naqueles activistas que, desesperados, se imolam na praça pública, chamando a atenção para as injustiças que os atormentam. Foi assim que começou a Primavera Árabe.
Terá o fogo tanto poder que seja capaz de transformar um mundo de injustiças em revolução redentora? A Santa Inquisição parecia acreditar em algo semelhante.
12 comentários:
Se a "moda" pega, já pensou no incêndio que tomará conta do mundo das artes?? Onde não há desprezo governamental, em relação às artes???
Eduardo, essa é uma grande verdade: o poder despreza a arte (a menos que a a arte esteja ao serviço do poder).
Quando se começam a queimar livros mais tarde ou mais cedo começam a queimar-se pessoas, disse um famoso filósofo italiano do século XV, numa altura em que a igreja da contra-reforma dava inicio à perseguição de quem ousava pensar pela sua própria cabeça. Aqui não se trata de livros, mas vai dar ao mesmo. Das duas uma, ou ele não gosta das obras que queima ou então a coisa não augura nada de bom.
Não sei porquê mas de repente lembrei-me da história do Santa Rita Pintor.
Quando se começam a queimar livros mais tarde ou mais cedo começam a queimar-se pessoas, disse um famoso filósofo italiano do século XV, numa altura em que a igreja da contra-reforma dava inicio à perseguição de quem ousava pensar pela sua própria cabeça. Aqui não se trata de livros, mas vai dar ao mesmo. Das duas uma, ou ele não gosta das obras que queima ou então a coisa não augura nada de bom.
Não sei porquê mas de repente lembrei-me da história do Santa Rita Pintor.
Rui, parece uma atitude algo descabelada. O Santa Rita queimou as obras dele... mas esse suicidou-se.
É por isso que eu digo que a atitude deste artista não augura nada de bom. Quando se queima algo que se gosta esta-se a queimar uma parte nós próprios. E da metáfora à realidade por vezes vai apenas um passo. Foi o que aconteceu com o Santa Rita. E com este como será? Vai ficar por ali? Ou então não gosta daquilo que queima, e então aí até pode ser um alivio.
Revolução redentora?
É uma coisa estranha para se dizer...
è verdade... me soou estranho aos ouvidos...
Ou aos olhos, neste caso terá soado mal aos seus olhos!
:-)
A verdade é que há por aí muita obra para queimar, mas não concordo. Acho demagógico como protesto e inútil como política. Não será o caso do homem se estar a promover?
A fogueira é sempre uma má solução amenos que se queira combater o frio.
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