Alimentar o bife, desenho, 2010
Cada vez mais se percebe que o Estado não se encontra ao serviço do bem comum. É uma associação de malfeitores engravatados com mais lábia que uma puta embriagada a convencer o potencial cliente da magnificência dos seus atributos, quando se percebe imediatamente que, por baixo do bâton, do rimel e do penteado, pouco mais há que coisas falsas e postiças.
Somos roubados (não há outra expressão) diariamente e aguentamos. Nós, os portugueses, somos como antílopes na savana: sabemos que há leões à espreita de uma oportunidade para nos saltarem à espinha e nos ferrarem a dentuça, fundo no lombo, mas continuamos a pastar, plácidos e de olhar ausente noutros sonhos. Que se há-de fazer?
Fazemos parte de uma cadeia ecológica da qual somos a base. Depois há uma escala de comilões que nos papam à fartazana, sejam pequeninos e com dentes afiados como agulhas, ou grandalhões, com bocas de quilómetro e meio, capazes de engolir famílias inteiras com um simples suspiro. Comem-nos, mastigam-nos, desprezam-nos. Mas que se há-de fazer?
Somos um povo que, na verdade, aguenta tudo com muito pouca revolta. Temos uma capacidade de aguentar a desonestidade e a gula desvairada daqueles que nos exploram que dá vontade de gritar aos nossos próprios ouvidos. Somos um povo que é a manada ideal, o sonho húmido do capitalista selvagem, somos o pasto perfeito do vampiro mais preguiçoso. Qualquer um nos ferra o dente e vai chupando, chupando, chupando, até não restar pingo de sangue e não sermos mais que um invólucro vazio.
Que se há-de fazer?
4 comentários:
Rui, somos só nós os portugueses que nos comportamos dessa maneira em circunstâncias como esta que estamos a viver? Existe um grande mistério para mim que é, não conseguir perceber a razão pela qual nos rebaixamos constantemente quando as coisas não nos correm bem. Somos assim tão maus quando comparados com a maioria dos outros povos? E se somos, qual é a medida que usamos para a avaliação? Dá-me a sensação que a crónica frustração dos portugueses e a sua falta de auto-estima se baseia apenas no facto de nós nos levarmos muito a sério, achamos que temos direito à "lua" ( que aliás é legitimo a qualquer povo), mas no nosso caso parece-me que fundamentamos essa pretensão no facto de acharmos que somos uma espécie de prolongamento de Deus na Terra. Achamos que somos um povo eleito e por isso deveríamos SER, e como não SOMOS andamos sempre de rastos.É claro que devem haver razões na nossa história que expliquem isto, aliás, até porque nós já fomos "grandes" e quem é "grande" tem sempre dificuldade em perceber porque é que agora é "pequeno". Achamos sempre que o nosso presente não está de acordo com o nosso ADN. Aliás basta dar uma olhada rápida pelos filósofos portugueses para constatarmos a tinta que eles gastam com esta coisa do " Ser português". Existe mais algum povo no mundo, para além dos judeus claro, que perca tanto tempo com estes endeusamentos? A história de Portugal está recorrentemente impregnada da expressão " Nós poderíamos ter sido alguma coisa se alguém não nos tramasse". Mesmo quando ganhamos, como foi o caso de Aljubarrota ou dos Descobrimentos, achamos que foi sempre contra tudo e contra todos, porque "eles" estavam todos ali bem à esquina para nos "fazerem a folha". A cereja em cima do bolo é quando usamos a expressão clássica do "lá fora isto nunca seria assim", sem conseguirmos explicar bem a quem é que nos referimos quando falamos dos "lá de fora". É verdadeiramente um conceito que vai desde o Burkina faso até à Suíça. Se formos para o futebol então nem é bom falar. Somos 100% "portugueses".
Rui, sempre ouvi dizer que "com o mal dos outros posso eu bem". mas, bem vistas as coisas, não concordas que este povo aguenta tudo e mais que venha? O mais extraodinário é que o faz com uma calma, uma tristeza, a mim impressiona-me. Não sei o que fazem ou que dizem ou que pensam outros povos. Escrevi este texto a pensar nas pessoas com quem me cruzo na rua.
Rui, eu acho que andamos todos a ser esmagados e estamos constantemente a baixar a cabeça sem mostrarmos o mínimo sinal de que vamos sair da inércia, concordo contigo, mas não percebo o porquê de isso ser uma coisa só portuguesa. Será que estamos convencidos que a auto-flagelação nos diminui a dor, se nos amachucarmos ainda mais. Já estamos todos suficientemente magoados para acharmos que ainda merecemos ser espancados por nós próprios porque afinal de contas até merecemos. É um pouco como aquelas mulheres que foram violadas e se sentem culpadas porque afinal até iam de mini-saia e puseram-se a jeito para que a coisa acontecesse.
Enfim, como já percebeste isto foi apenas um desabafo, não mais do que isso.
Rui, talvez seja o nosso espírito católico a manifestar-se...
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