A notícia era discreta, ocupando apenas um cantinho da
página 9 da edição do jornal Público no dia 22 de Dezembro: Portugal tem uma “democracia com falhas”, dizia o título.
Lendo a
noticiazinha ficamos a saber que, em
2011, o declínio da democracia se concentrou na Europa (Finlândia, Irlanda,
Alemanha, Portugal, Itália e Grécia). Todos os países da lista perderam
pontos principalmente devido à erosão da
soberania associada aos efeitos da crise, a União Europeia a encontrar no
declínio da democracia um ponto forte das suas políticas.
De há uns tempos a
esta parte que se fala por aí, à boca pequena, do conceito de Pós-democracia,
um conceito que seria interessante debater de forma mais alargada mas que,
estranhamente, tem sido muito pouco (ou mesmo nada) divulgado nos meios de
comunicação social.
Podemos caracterizar a Pós-democracia como um regime em que
somos governados por grupos económicos que não se sujeitam ao escrutínio
popular e se representam exclusivamente a si próprios fazendo prevalecer os
seus interesses particulares em detrimento dos interesses colectivos.
Bastaria
olhar para a forma como os actuais primeiros-ministros da Itália e da Grécia
chegaram aos cadeirões que agora aquecem e, mais curioso ainda, observar os
respectivos currículos em instituições financeiras com muitas culpas no
cartório do afundamento geral das economias europeias.
Estes homens não foram eleitos, o que nos leva a um patamar superior da Pós-democracia: os responsáveis políticos são cooptados entre ex-dirigentes de grupos económicos, não se sujeitando ao escrutínio popular e representando exclusivamente os interesses particulares desses grupos em detrimento dos interesses colectivos.
Estes homens não foram eleitos, o que nos leva a um patamar superior da Pós-democracia: os responsáveis políticos são cooptados entre ex-dirigentes de grupos económicos, não se sujeitando ao escrutínio popular e representando exclusivamente os interesses particulares desses grupos em detrimento dos interesses colectivos.
É complicado viver a História antes de ela ser escrita e
vertida devidamente em manuais escolares nas páginas correspondentes, para que
possa ser estudada com a distância que se impõe à formação de ideias claras e
conclusões avisadas. Talvez, dentro de algumas décadas, os tempos que agora vivemos
venham a ser considerados como a época da falência da democracia, a génese de
uma nova ordem mundial, saída daquilo que designamos por “globalização”.
Talvez
os tempos que agora vivemos venham a ser considerados como a época em que o
“sonho americano” foi substituído pelo “pesadelo chinês”, os tempos em que os
cidadãos das ex-democracias foram confrontados com um novo paradigma social:
trabalhar cada vez mais, receber cada vez menos e ir perdendo todos os direitos
que caracterizavam os “estados sociais” que evoluíram ao longo de décadas após
a 2ª Guerra Mundial. Talvez as coisas venham a ser assim ou, quem sabe, talvez
nada disto venha a acontecer.
Olho para o nosso primeiro-ministro, para a forma como o
actual governo português tenta governar a crise e não me sinto particularmente
optimista. Sinto-me até muito pessimista. Apetece-me virar as páginas do jornal
rapidamente até chegar à secção de desporto ou, então, ler o jornal de trás
para a frente. É preferível observar as tabelas classificativas dos vários
campeonatos de futebol por essa Europa fora a concentrar a atenção nas
oscilações da Bolsa.
Este texto foi enviado para a Directora do Público.
2 comentários:
Nossa...
Que texto!
De uma lucidez cortante!
Li, hoje é dia de perder a lucidez!
Bom ano.
Ah, o texto foi publicado hoje, no jornal Público. Última carta à Directora do ano de 2011. Levou tanto tempo que julguei que tinha sido esquecido.
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