quinta-feira, abril 30, 2009
Uma foto cubista
A forma como a figura se funde e confunde no (falso) fundo, mostra bem o anseio dos cubistas em criarem imagens que oferecessem uma visão desajustada daquela que a máquina fotográfica tinha para nos oferecer. Este trabalho está de acordo com a idealização pictórica que viria a ser desenvolvida por estes artistas, interessados em contrariar o óbvio, introduzindo na pintura europeia uma dimensão intelectual e mental que, até aí, era inexistente e, como é claro, desconhecida.
Esta imagem mostra também como o Cubismo, apesar do que parece ser o senso comum, não se afastou assim tanto da realidade, antes a interpretou por outras vias. Picasso e Braque, mesmo nas suas obras mais herméticas, representaram sempre pessoas, objectos ou paisagens, nunca tendo entrado decididamente no campo da abstracção pura.
Abriram a porta, é um facto, mas preferiram não ser eles a entrar naquele mundo fantástico da pintura sem objecto que estava ali mesmo à beira. Esse trabalho ficou para outros.
É uma foto deveras curiosa.
segunda-feira, abril 27, 2009
Porcaria
sexta-feira, abril 24, 2009
quarta-feira, abril 22, 2009
Elogio da Palavra
É difícil explicar como tudo aconteceu. Talvez tenha qualquer coisa a ver com o facto de dizermos que fazemos cocó quando, na verdade, estamos a cagar. Daí a substituirmos a proverbial merda pela inócua caca, vai um passinho de anão. Constatamos que há pedopsiquiatras incomodados com o facto de o Lobo Mau “comer” a Avozinha ou de a velha Tia Chica atirar um pau ao gato. Ouvimos com frequência designar a mentira por “inverdade”. Criamos assim um espaço ambíguo entre o que é e o que não é, entre a verdade e a mentira. Mas como designamos quem profere uma “inverdade”? Arrisco: mentiroso, embora não me pareça que essa designação esteja de acordo com o conceito de inverdade.
Todos sabemos o pântano viscoso que é a língua portuguesa quando utilizada por prestidigitadores habilidosos. Basta pensar na legislação produzida na Assembleia da República, sempre que a letra da lei contraria o seu espírito, nos casos em que a lei acaba por proteger aqueles que pretendia castigar. O feitiço virado contra o feiticeiro? Ou feitiço, simplesmente?
Se formos covardes temos todo o direito de temer as palavras porque, como se vê, uma vez libertas e lançadas ao mundo, elas tomam o destino nas próprias mãos e desobedecem a quem as proferiu. Quantas vezes não ouvimos pessoas a queixarem-se por ser mal interpretadas? Quantas vezes as pessoas se queixam que aquilo que disseram não era o que, na verdade, pretendiam dizer?
Ao que consta, a partir de agora não é aconselhável utilizar a expressão “autista” quando nos referimos a um político bronco ou, simplesmente, casmurro, para não dizer comprometido com alguma posição “inverdadeira”, fazendo de conta que é honesto. E que dizer dos “procedimentos alternativos” e “técnicas avançadas de investigação” para designar a tortura? Como se os santos inquisidores nunca tivessem utilizado a técnica de afogamento nos tempos áureos da igreja católica. Pode o primeiro-ministro utilizar impunemente a expressão “campanha negra”? Cocó em vez de merda, é o que é. Palavras vazias mas cheias de substância.
Temos assim tanto medo de chamar as coisas pelos nomes que verdadeiramente as definem ou, mais candidamente, merecem? Parece que sim. Enrolamos a língua e procuramos uma palavra ou uma expressão que torne a nossa ideia num camaleãozinho simpático, capaz de passar despercebido neste mundo de ambiguidades. Mas o camaleãozinho não deixa de ter a respectiva língua, comprida e viscosa, pronta a capturar a mosca varejeira que é o alvo da nossa ideia.
Escreveu Hugo Ball, na conclusão do inexcedível Manifesto Dadaísta de 14 de Julho de 1916: “Essa maldita linguagem à qual se cola a porcaria como à mão do traficante que as moedas gastaram. A palavra, quero-a quando acaba e quando começa. Cada coisa tem a sua palavra; pois a palavra própria transformou-se
Sejamos livres, sejamos criativos, não há que ter medo das palavras. Utilizemos a palavra conforme o instinto nos ordenar. Ignoremos convenções manhosas e pruridos fedorentos. Vamos falar com imaginação total, colorido absoluto. A palavra só nos ultrapassa se tivermos medo de a usar. Como tudo na vida, de resto.
terça-feira, abril 21, 2009
Uma coisa espantosa
segunda-feira, abril 20, 2009
Santo Alvarez
domingo, abril 19, 2009
“Quero ser teu amigo”
sábado, abril 18, 2009
A propósito
Na sequência do post anterior, incluído na Tertúlia Virtual de Abril, subordinada ao Prazer, fiquei a matutar porque terei escolhido a Liberdade para ilustrar este tema.
Quando falamos em "prazer" muitas coisas nos assaltam o espírito, normalmente coisas relacionadas com a excitação dos 5 sentidos que marcam as fronteiras do nosso corpo em relação ao mundo circundante. Cenas do género comer, beber, fumar, fazer amor, por aí assim. A Liberdade parece conta de outro rosário. Mas, bem vistas as coisas, o que podemos nós retirar deste mundo se não formos livres?
Ser livre é que se apresenta uma questão complicada. O que poderá definir a nossa Liberdade? Não querendo alogar-me muito, nem parecer um padre a dar sermão aos peixes, diria que a principal condição para sermos livres é não termos segredos escondidos dentro de nós. Se não tivermos segredos podemos pensar livremente e, pensando livremente, podemos sentir-nos livres de facto. Sim, a Liberdade é uma coisa do espírito mais do que do corpo... ou não!?
Problema, problema, é não termos o nosso segredinho inconfessável a roer-nos os calcanhares à consciência. Pois. Será a Liberdade uma impossibilidade?
quarta-feira, abril 15, 2009
Não há maior prazer que a Liberdade de ser livre
LIBERDADE
Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...
Fernando Pessoa