sexta-feira, março 28, 2008

Flores no alcatrão


Viver na cidade afasta-nos tanto da natureza que chegamos a esquecer a nossa própria condição animal. A chuva é uma maçada, o sol incomoda, o vento desorganiza. As manifestações da natureza não se coadunam com a nossa perspectiva da passagem do tempo urbano. Tempo urbano tem a ver com relógio. Tempo que se perde, tempo que se ganha quando é vendido ou comprado. Como se pode perder ou ganhar uma coisa tão abstracta como o tempo?

Na cidade não há bem Primavera nem Inverno. Não damos atenção aos sinais das diferentes estações do ano porque o nosso ritmo quotidiano não se organiza de acordo com elas mas sim apesar delas, ignorando-as o mais possível. O nosso ritmo quotidiano é organizado de acordo com a agenda, o calendário e, outra vez, o relógio. O relógio, o relógio... que se lixe o relógio!

Os animais vivem em apartamentos e vêm à rua pela trela fazer cócó, já nem sequer se diz que cagam. Pobres animais. Até a fruta, que dantes anunciava as estações do ano mais ou menos como as andorinhas, até a fruta aparece sem ordem natural que o explique, exposta nos supermercados a preços tão estranhos como a sua presença fora de época.
Na cidade a natureza vive também fechada em pequenos quartos, escondida em memórias que ansiosamente temem ser esquecidas de uma vez por todas. Vive em vasos, nas varandas ou em canteiros devidamente delimitados e organizados. Ou se porta bem ou é metida na ordem.

O que nos vale é que, algures lá fora, longe dos prédios e dos automóveis, sem computadores nem écrans de TV que estão sempre a falar, a falar, a falar, há-de haver pelo menos um lugar qualquer que ainda respeita aquilo que aprendemos nos livros de leitura (quando éramos pequeninos e íamos à escola aprender a ler e a perceber melhor o mundo que nos rodeava).
Eu sei que esse lugar existe.
Quer dizer, acho que existe.
Caraças, TEM de existir um lugar assim!!!!
Mas, no entanto, gosto de viver na cidade. E tu? trocavas a poluição e o ruído por ar puro e silêncio absoluto? Então de que estás à espera?

4 comentários:

Anónimo disse...

Já encontrei!

~C;-)

Só- Poesias e outros itens disse...

Adoro suas palavras.

Me diverti muito, embora não seja para rir de um assunto tão sério. Mas a foto desse cão com touquinha e florizinha!!!! está demais.
Vivemos oprimidos, é a realidade.

bjs.

JU Gioli

MoiMêMê disse...

Também gosto do silêncio, mas também gosto do ruído, e também gosto de ler.
E quando estou a ler em silêncio, e livro é tão bom, tão bom, que o silêncio se transforma em ruído....

beijo

Silvares disse...

Eduardo, eu sei. Você habita no Paraíso.

Ju, essa imagem foi "roubada" por aí. Procurar imagens na imensidão da NET que ilustrem aquilo que acabo de escrever um jogo que gosto de jogar. Adoro.

Célia, a vida contemporânea é assim mesmo, plena de contrastes violentos. É como a arte que fazemos.