segunda-feira, fevereiro 11, 2008

A força da palavra

"Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o mundo; Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã..."
Fernando Pessoa

"Uma elite de parasitas das palavras está a destruir paulatinamente o regime."
Francisco Moita Flores, no Correio da Manhã de ontem

Talvez o nosso Fernandinho não estivesse a imaginar um mundo tão cínico como este que vemos medrar aos nossos pés e aos pés dos nossos filhos e netos. Este nosso mundo onde a laboriosa encenação do real ganha força de verdade absoluta e o poder não se conquista, antes se compra, se rouba ou se troca por dá-cá-aquela-palha.

Fernando Pessoa sonhava não conquistar o mundo com a força das palavras que lhe davam forma à visão que dele tinha lá por trás dos oculinhos. Mas poderia ter tentado, se alguma vez tivesse chegado ao dia depois do dia de amanhã...

Actualmente a verdade faz-se nas Agências Noticiosas. Faz-se! Constrói-se, retoca-se. Faz-se verdade mesmo a partir da mentira e vice-versa, para não quebrar a correnteza do pensamento liberal. Terá sido sempre assim? Como era construída e difundida a Verdade antes de existirem as Agências Noticiosas? Vai na volta não existia Verdade nenhuma e existiam muitas verdades, um parodoxo desse género de paradoxos de trazer por casa.

O Moita Flores (rapaz bem mais dentro do assunto que o nosso Fernandinho) fala de uma elite das palavras que estará a usá-las de forma pouco honesta para destruir o regime político e social em que tentamos equilibrar-nos na vertical, apenas sobre os membros inferiores, para nos podermos distinguir do memorável elefante bem como da barata tonta.

Seja como for, ao que parece, as palavras têm uma força demolidora, uma capacidade de moldar a realidade apenas ao alcance de certos artistas do verbo que, utilizada para fins menos saudáveis, põe em risco os próprios fundamentos da nossa sociedade.

Estamos feitos? Não há nada a fazer?

Bom, a menos que nos estejamos a borrifar para o dito regime deveríamos reagir. Ou agir. Um bocadinho. Agir um bocadinho, pelo menos. Ou reagir.

Por outro lado coloca-se sempre a hipótese de não ficarmos particularmente incomodados perante a derrocada do regime de que nos alerta o Sr. Presidente da Câmara de Santarém (que, ao que vejo não pertence à tal elite manipuladora da palavra... como terá ganho as eleições?).
Se a visão do regime a descolar-se todo e a desfazer-se em pedacinhos sem nexo não nos tira o sono então que se lixe. Fazemos como o Pessoa e depois de amanhã damos cabo deles. Mas só depois de amanhã.

4 comentários:

Anónimo disse...

As imagens ( TV, Cinema, Internet) não estarão tirando a força das palavras?
Ou só reforçam....

Olaio disse...

Concordo inteiramente com o teu post.

Quem controla os meios de comunicação, inventa e reinventa a realidade e a verdade.
Quem não controla os meios de comunicação, pode falar à vontade mas afirmar a sua realidade ou verdade, muito dificilmente o consegue.

Por isso é que considero, que falar em democracia e liberdade na nossa sociedade, não é uma coisa simples, nem muito menos uma verdade adquirida.

Silvares disse...

Eduardo, as palavras mantêm a sua força. O que acontece é que cada vez haverá menos pessoas capazes de a entender. Muito por acção da TV, Cinema, Internet, tal como você diz. O mundo transforma-se. Não sei se para melhor ou pior... para diferente, pelo menos!
Olaio, começo a pensar que na verdade ninguém sabe muito bem o que é isso de "democracia". Se tem a ver com uma herança cultural, se é algo que está em construção e nunca se conclui, de que raio estamos nós a falar afinal? Já "liberdade" deixa menos dúvidas, muito menos. Talvez o debate devesse começar por esclarecer as dúvidas em relação ao conteúdo antes de nos preocuparmos tanto com a forma.

Anónimo disse...

Silvares,

sua resposta ao meu , e ao comentário do Olaio, estão perfeitas. Concordo que falta DEFINIÇÃO do CONTEÚDO. A Forma é questão de nomenclatura.

Obrigado e abraços