Saíram da porta entrando na rua. Vinham já a matraquear os queixos. Debitavam discurso de forma sincopada, como se fosse de todo inevitável que aquelas palavras fossem ditas, precisamente; ditas daquele modo. Como se as palavras tivessem sido já escritas pela mesma mão que regista no Livro o Destino de cada um e de todas as coisas.
Passaram por mim como se eu fosse espírito, coisa incorpórea ou invisível, como se fosse, pelo menos, tão discreto como papel amarrotado ou saco com merda de cão esquecido no passeio público. As palavras ganharam volume, máximo quando me passaram a rasar os ouvidos e foram perdendo nitidez com a distância, pela graça de Deus e das Leis da Física.
Continuei o meu caminho pensando, como nem sempre faço. Pensei que, quando acordamos e até que pomos os penates fora de casa, o esforço matinal será imaginarmos que a nossa vida é uma coisa interessante, que faz sentido. Pensei ainda que verbalizar essa imaginação ajuda a que se aproxime de fazer sentido, fortalecendo a possibilidade de sermos pessoas cuja vida é plena. Que isso faz de nós agentes importantes no tecido social; que esse tecido abrirá um buraquinho caso estejamos ausentes.
Voltei-me e já não vi as personagens falantes.
Terão elas ido mudar o mundo?