sexta-feira, outubro 26, 2018

Questão de coração

Andamos todos confusos com o desenrolar alucinante dos acontecimentos que nos últimos tempos têm alterado a ordem que vinha definindo o nosso mundo. A coisa passa-se tão perto de nós, tão à frente do nosso nariz, que não temos afastamento suficiente que nos permita percepcionar os contornos do bicho, compreender o fenómeno.

Há quem trema de receio que o Fascismo regresse, quem levante as bandeiras do "politicamente correcto", quem aponte o dedo acusador aos emigrantes, aos pretos, aos pobres, aos comunistas, aos homossexuais, aos velhinhos e aos amantes da Natureza, há grupos de apoio para tudo e de oposição a mais alguma coisa. Andamos numa roda-viva.

No meio da refrega vemo-nos impelidos a escolher um dos lados da barricada e é nesta situação que se revela a massa de que somos feitos pois uma escolha como esta é feita com o coração; absolutamente. Eu sei que procuramos uma justificação mais ou menos racional que corrobore a nossa opção mas isso não passa de reflexo cerebral condicionado, é no tambor do nosso coração que encontramos a explicação para a essência das escolhas que fazemos nesta refrega.

Assim vivemos estes acontecimentos pré-apocalípticos com o coração ao pé da boca. Braços no ar, punhos erguidos contra mãos estendidas, a história a repetir-se, desta vez como Tragédia. Novos fascistas, novos comunistas, novos anarquistas, novos sociais-democratas, socialistas, tudo remisturado pela varinha mágica do tempo, preparando-se para um novo embate, semelhante a todos os anteriores mas em diferentes locais, com novos actores, diferentes figurinos e cenografia renovada.

Nesta Tragédia cada um escolhe a personagem que pretende interpretar. Segue o teu coração.

quarta-feira, outubro 24, 2018

Cães vadios, ratazanas e carraças

É como aquela cena do Yin e Yang, cada pensamento bonito precisa de uma sombra arrepiante que o equilibre, cada cãozinho tem à espera a carraça que lhe compete alimentar um dia. A um post fofinho deve suceder outro que seja azedo. Somos todos alimento uns dos outros (peixes grandes comem peixes pequenos) e foi assim que Deus fez o Paraíso.

Quero dizer, ao que consta Deus não pôs logo a bicharada a ferrar a dentuça no parceiro do lado; dizem para aí que, nos primórdios do Paraíso os leões eram amigos dos cordeiros (sim, havia leões e cordeiros deitados no mesmo prado verdejante) e até a carraça era uma bicha pacífica. Não nos explicam de que se alimentavam estas bestiolas mas era tudo na base do "peace and love".

Sinceramente não sei quando é que a cena descambou. Terá sido por causa do Pecado Original? É bem capaz de ter sido isso: Eva convenceu Adão a dar uma trinca numa maçã (uma maçã!!!???) e pronto, lixou-se tudo. O casal apercebeu-se de uma série de coisas que até ali não lhes diziam nada, foi a expulsão do Paraíso e por aí fora. Não tenho a certeza de o que leão tenha ferrado o dente no cordeiro logo a seguir ou se ainda andou algum tempo a pensar sobre o assunto, o que sabemos é que todo o mundo passou a babar-se quando lhe chega às fuças o odor do sangue fresco e a sentir um prazer mórbido perante o espectáculo da dor alheia.

Voltando ao princípio em volta circular e completa: cada pensamento bonito precisa de uma sombra arrepiante que o equilibre, cada cãozinho tem à espera a carraça que lhe compete alimentar um dia. Que raio de coisa terá passado pela cabeça a Deus para espoletar tamanha loucura generalizada estragando de um momento para o outro a doce pasmaceira que animava o Paraíso? Tédio divino? Falta de imaginação? Incompetência pura e simples? Terá Ele inventado o sadismo naquele preciso instante (apesar de só ter permitido que o Divino Marquês viesse ao Mundo muito, muito tempo depois)? Nunca saberemos a resposta. Deus não fala connosco, muito menos frequenta Blogues. Quando muito deita o olho ao Facebook!

Passarinhos, gatinhos e crianças

Há tantas coisas bonitas, porra! Tantas coisas capazes de comover um gajo até que verta lágrimas, lágrimas daquelas que se separam dos olhos quando estão maduras de bondade e nos fazem sentir o coração como se fosse feito de pão-de-ló. Nem é preciso procurar muito. Basta estar atento, que coisas dessas há-as por aí, à espera de serem encontradas. É por isso que são coisas bonitas, coisas boas.

segunda-feira, outubro 22, 2018

Quem somos (de onde vimos, para onde vamos)?

Não compreendo bem a presunção daqueles que se pretendem superiores ou mais sagazes ou mais inteligentes. Afinal de contas descendemos todos do mesmo monte de merda primordial a partir do qual Deus moldou o primeiro de nós. Não compro aquela história de sermos feitos de pó.

Depois é a evolução da espécie; se aceitarmos como correcta a ideia de que estamos a evoluir em direcção a alguma coisa mais expressiva que a tal matéria primeva que Deus terá usado para moldar o primeiro ser humano.

Convém sublinhar a ideia de que Deus terá sujado as mãos para nos criar e que, a partir daí, nunca mais foi o mesmo. Ter as mãos sujas de merda e ser Deus não augura nada de bom para Si próprio nem para a Sua criação. Os deuses não têm sempre boas ideias, certo e sabido. Olhem para nós: comprovadíssimo!

Esta conversa enrolada para tentar compreender que raio de coisa é esta em que o Mundo Humano se está a envolver, a transformar, a arriscar... enfim, esta conversa enrolada para tentar compreender porque estamos nós a regredir em termos civilizacionais em direcção à barbárie. Outra vez.

Depois de muito matutar cheguei à brilhante conclusão do monte de merda primordial. Se fôssemos feitos de pó não seríamos assim tão merdosos. Entretanto sempre há uma boa notícia: o planeta ficará bem melhor quando regressarmos a um estado civilizacional vegetativo.

terça-feira, outubro 16, 2018

Sapiens-sapiens

Anda meio mundo a aturar outro meio.
Falamos deste lado, respondem-nos aos gritos do lado de lá, ecoamos com gritaria redobrada, a comunicação está difícil. Uma vez por outra ouvimos com clareza o que nos é dito pelos que compõem o outro lado mas isso apenas serve para aumentar o nosso grau de indignação. E vice-versa. A discussão cresce de tom.

Ouvir é equivalente a olhar, são acções que não implicam, obrigatoriamente, reflexão. "Entra por um ouvido sai pelo outro" é um ditado da família do "boi a olhar para o palácio". Mesmo quando se estabelece diálogo não parece haver vontade de debate. Queremos apenas marcar a nossa posição, manifestar a nossa autoridade moral, sublinhar a inquestionável superioridade da nossa visão, a única realmente inteligente. Somos "sapiens-sapiens", isso diz tudo mas não implica sapiência. Nem por sombras.

A coisa está a esticar-se. Cada vez mais há gente a deslocar-se para os extremos da corda com uma vontade redobrada de a puxar com o máximo de violência que forem capazes. Os que vão ficando no meio olham para um lado e para o outro como galinhas tontas sem saberem o que fazer, sem perceberem a que ponto da corda se deverão agarrar ou, sequer, se haverão de puxá-la. E são cada vez menos, eles que já foram tantos.

Por enquanto anda meio mundo a aturar outro meio. Tenho a impressão que a paciência está a esgotar-se rapidamente.

domingo, outubro 14, 2018

Tretas

Um gajo abre o Facebook e encontra esta conversa com alguma frequência:
"As tuas memórias no Facebook
Rui, as memórias que partilhas são importantes para nós. Pensámos que gostarias de recordar esta publicação de há 7 anos." 

As minhas memórias são importantes para "eles"? Por que raio de carga de água haveriam as minhas memórias de ser importantes para "eles"?

É por estas e por outras que me vou refugiando por aqui, por estas bandas.

sexta-feira, outubro 12, 2018

O Mundo a caminhar

Por vezes dou comigo a pensar "que merda de mundo estamos a construir?"; a resposta é tão simples que arrepia: não estamos a construir mundo nenhum.

Aquela pergunta só me vem dançaricar na cabeça porque sou um gajo esquecido. Essa propensão para o esquecimento faz-me perder o foco no mais importante ensinamento que a Escola jamais me proporcionou (englobando aqui todas as escolas por onde passei) que foi a imortal Lei de Lavoisier.

Quando caio em mim e lembro que "na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma" percebo que estamos a transformar o mundo que herdámos dos nossos pais que, por sua vez, haviam transformado aquele que herdaram dos nossos avós. E por aí fora, até chegarmos ao Futuro. Até chegarmos ao mundo dos nossos filhos, no qual viveremos os nossos derradeiros dias neste planeta.

Voltando ao início deste texto, não construímos o mundo, transformamo-lo. Se é pior ou melhor... será uma outra questão. Que será diferente, disso não resta a mais pequena das dúvidas.

quinta-feira, outubro 11, 2018

Não saber

Dizer que não sei nada é um exagero. Na verdade não sei quase nada. As poucas coisas que fui capaz de compreender até hoje misturam-se e confundem-se numa amálgama peganhenta que nem sempre consigo manusear. As coisas que sei formam uma papa espessa que me ocupa os sonhos. Tento comê-la com uma colher de madeira, tento comê-la com um garfo, experimento com a mão direita. Compreendo que não consigo comer a papa do meu conhecimento. Nem isso sei fazer. Afinal não será exagero afirmar que não sei nada, que sou como uma criança pequena que esqueceu o nome da mãe ou como um cachorro abandonado algures, às portas de um bairro de lata.