domingo, maio 30, 2010

Lixo


Os graffiters que emporcalham as paredes com tags têm razão quando perguntam porque ficam tão indignados os demais cidadãos perante o resultado dos seus devaneios individualistas.

A publicidade nas ruas é outro tipo de emporcalhamento visual mas não parece incomodar tanto o povinho. Placards, cartazes, panfletos, lixo!

Lembro-me vagamente de ser uma criança e de não compreender muito bem o significado da palavra poluição. Naquele tempo a sociedade de consumo era ainda uma miragem e Portugal um país demasiado pobre para produzir os milhões de toneladas de lixo que agora produz alegremente.

O significado da palavra poluição ganhou sentido quando, consultando um livro de Educação Visual, deparei com uma imagem (não recordo qual) que explicava o conceito de poluição visual. Assim era fácil de perceber.

A foto que ilustra este post foi tirada perto de minha casa. As árvores ainda disfarçam um pouco mas o lixo tudo conquista de forma triunfal. Vivemos envoltos numa pesada nuvem de poluição visual que nos intoxica o pensamento e nos deixa a alma maltratada.

Nem sempre nos apercebemos disso, mas a intoxicação é um facto.

sexta-feira, maio 28, 2010

!!!

Acabo de perceber que não me falta nada para não ter coisa nenhuma.

quarta-feira, maio 26, 2010

Seres Imaginários e outras coisas


Ontem comprei "O Livro dos Seres Imaginários". Mal vi a capa, e já estava decidido. Lá no fundo, o que eu procurava era mais material iconológico, para poder dedicar-me à criação iconográfica.

A descrição anunciada de 116 seres fantásticos com participação de Jorge Luís Borges... caramba, o que pode um gajo desejar mais do que isto!?

Apesar de parecer uma edição desleixada, o livro contém passagens muito interessantes. É como um daqueles livros que Borges imaginava de vez em quando, inventando tudo. Inventando o livro, o autor (e respectiva biografia), bem como maravilhosas narrativas. Há coisas assim nalguns livros de Borges.

Ficamos a saber da Fénix, ser imaginário com um pedigree de respeito, ou da Rémora, estranho peixe de obscuras origens, com poderes de abrandar o tempo em determinadas circunstâncias.

No Prólogo deste livro, os autores (Jorge Luis Borges e Margarita Guerrero) escrevem: «Como todas as miscelâneas, como os inesgotáveis volumes de Robert Burton, de Fraser ou de Plínio, O Livro dos Seres Imaginários não foi, escrito para uma leitura seguida. Gostaríamos que os curiosos o consultassem como quem brinca com as formas alternantes que revela o caleidoscópio

Duas notas finais: 1ª) Não faço a mínima ideia do que possam ser os volumes de Robert Burton, nem de Fraser, e de Plínio pouco mais imagino do que tenha chegado a Velho.

2ª) Aquela vírgula a seguir a "foi", na curta transcrição que faço do Prólogo, é uma das razões que me leva a crer que esta edição da Teorema/LeYa é uma edição desleixada. Há mais exemplos, e ainda saltitei muito pouco nas páginas deste livro.


Aqui encontra-se uma lista dos seres que constam no livro. Se seguires a hiperligação anterior irás desaguar numa página com um texto escrito numa estranha forma, próxima do português. A Net é uma máquina misturadora.

sábado, maio 22, 2010

Another Fucking Readymade

Another Fucking Readymade


No post anterior referi de passagem uma história protagonizada por Maurizio Cattelan, o imprevisível artista italiano que é um gajo capaz de nos surpreender sempre um pouco mais, independentemente da dimensão da maior surpresa que já nos tenha pregado.


Rezam as crónicas que decorria o ano de 1996 e Cattelan participava numa exposição em Amesterdão. O galerista pediu-lhe que montasse a sua instalação em apenas uma semana, o que terá parecido ao artista um período de tempo demasiado apertado. Na noite anterior à inauguração, Maurizio Cattelan arrombou uma galeria próxima, que não dispunha de um sistema de alarme, e roubou tudo o que ali havia, desde obras de arte a máquinas de fax. Empacotou todo o material e, no dia seguinte, a galeria De Appel, abria uma exposição intitulada "Another Fucking Readymade".


Cattelan aplicara o célebre princípio da deslocação (ou recontextualização) de um objecto com uma intenção artística, introduzido por Marcel Duchamp. Com um sentido de humor muito característico, o artista italiano levantou a possibilidade de tudo ser transformado em objecto artístico, até mesmo o acto de roubar.


O episódio poderia ter acabado mal se os donos da Galeria Bloom tivessem levado por diante o desenvolvimento legal da situação criada por Cattelan. Mas a coisa resolveu-se civilizadamente com o artista a assumir a obrigação de fazer, mais tarde, uma exposição nessa galeria. Uma solução artística, sem sombra de dúvida, e com contornos de alguma elegância. Bonito.
Bonito?

Ainda assim, esta não terá sido a mais polémica obra de Cattelan, mas é das mais significativas.

sexta-feira, maio 21, 2010

O roubo como uma das Belas-Artes


É a velha história do rato que come um bocado do rabo ao gato e consegue fugir, a esconder-se no buraquito escavado na volta do rodapé.
Desta vez foi no Musée d'Art Moderne da cidade de Paris. Um assalto fez evaporar várias obras de arte consideradas excepcionalmente valiosas. Picasso, Matisse, Braque, e mais qualquer coisinha. Só estes nomes fazem tremer de emoção quem se interessa por rankings de obras de arte alinhadas por valores calculados em milhões de euros (ou dólares, é quase a mesma coisa).
Um tipo qualquer terá entrado por uma janela e lá gamou os tais quadros. Não há pormenores da acção mas, a verdade, é que se trata de uma performance muito próxima da obra-prima. O roubo, em si, constitui uma autêntica obra de arte contemporânea de alto gabarito. Já Maurizio Cattelan utilizou o roubo como uma das Belas-Artes ("Arte é a apropriação do que nos rodeia. Portanto, nunca é roubo") mas isso é outro ramo da árvore desta história.

Voltando ao rocambolesco episódio do assalto ao Musée d'Art Moderne importa notar que alguns peritos consideram que as obras roubadas são "invendáveis". O que levaria então alguém a efectuar um roubo tão arriscado não tendo perspectiva de lucro com o espólio conseguido? A resposta só pode ser uma: o amor à arte, puro amor, nada mais que pureza de coração e amor pela bela arte da pintura.

quarta-feira, maio 19, 2010

A Palavra

Atenção leitor:
estás prestes a ler uma palavra que irá formar algo no teu cérebro.
Digo "algo" e não "alguma coisa"
porque acredito que aquilo que irás imaginar não será uma "coisa",
aquilo que a palavra que estou prestes a escrever te irá sugerir é mais que uma coisa.
Se eu escrevesse "cadeira" irias imaginar qualquer coisa com 4 patas
uma coisa onde te pudesses sentar,
mas eu não vou escrever a palavra "cadeira".
Essa já escrevi duas vezes,
não volto a fazê-lo.
A palavra que vou escrever sugere a imaginação de "algo" indefinido
ou talvez não.
Arte. A palavra é Arte.
Grande coisa! dizes tu, leitor;
Tanta conversa para isto!?
Sim.
Só para que saibas em que pensas quando pensas em Arte,
assim, no quase-abstracto do pensamento puro.

segunda-feira, maio 17, 2010

Sabedoria


Não sei assim tantas coisas que me permitam perder o sono quando deito a cabeçorra na almofada. Durmo sempre como um seixo do rio, que dorme profundamente mesmo com a água a correr por cima e a cantar aquela canção constante, tal qual uma rua coberta de tráfego 24 horas sobre 24.

Não sei assim tantas coisas que me permitam ter dúvidas a respeito de certas questões que tenho por resolvidas mesmo quando alguns continuam a questionar essas tais coisas que, sabendo, não sei bem se sei.

Não sei assim tantas coisas ao ponto de imaginar que possa ser um sábio de trazer por casa muito dado a conversa de tasca, nem sei assim tão poucas que me convençam do contrário. Sinto-me bem longe de Sócrates, esteja lá ele onde estiver.

As coisas que eu sei estou constantemente a esquecê-las.

domingo, maio 16, 2010

Questão de escala

imagem recolhida aqui


Um gajo olha para os governantes do mundo e parece que está a ver um filme de terror de série B, tal é a galeria de monstros. Zombies, vampiros, lobisomens tresloucados, cientistas loucos ou seres construídos com os restos de outros, como o grande monstro de Frankenstein que, por engano, recebeu um cérebro que talvez não merecesse.

Dá para pensar; onde estão os grandes estadistas de outras épocas, seres elevados ao Olimpo do nosso imaginário colectivo? Porque já não se produzem dirigentes magníficos como os que ilustram as páginas dos livros de História?

Estou em crer que se trata, apenas, de uma questão de escala. Quero dizer, nos tempos que correm, com os meios de comunicação de massas ligados em rede e atentos ao mínimo peido dos que nos governam, não há nada que não seja notícia e objecto de milhentas reflexões e artigos de jornal. Assim é impossível ser uma pessoa bestial e demasiado fácil parecer uma besta quadrada.

A mulher mais bela do mundo, se fôr olhada com uma lupa, vai surgir aos nossos olhos com um aspecto monstruoso, cheia de pêlos enormes e com os poros semelhantes a crateras lunares. Um horror!

Os que hoje nos governam são feitos da mesmíssima massa dos que ontem nos governaram.

sexta-feira, maio 14, 2010

O balão inchado


A crise económica veio para ficar. O primeiro país a tomar medidas para atenuar a queda das contas do estado foi a Irlanda. Depois chegou o susto total com a Grécia, como um daqueles zombies que nos caem à frente dos olhos no Comboio Fantasma sem sabermos de onde vêm. Agora Portugal tenta disfarçar os remendos no casaco. Tal como a Espanha. Até os novos governantes britânicos anunciam por longe que irão, tal como os países atrás citados, desinvestir nas obras públicas, reduzir salários, aumentar impostos e o diabo a quatro.

Já há alguns anos que vinha colocando a questão (haverá de estar algures para aí nos arquivos do 100 Cabeças um ou outro post sobre o assunto): até onde pode crescer a economia? Sim, porque todos os anos se fazem contas e se a economia não cresce um bocadinho que seja entra tudo em paranóia. É como nas empresas. Se os lucros caem há que sacrificar os trabalhadores, em último caso despede-se uma mão-cheia deles.

Aquela questão parecia não ter resposta. As pessoas esforçavam-se por acreditar que o crescimento económico era da mesma natureza que o do próprio Universo que, a fazer fé nas doutrinas científicas, dizem estar em permanente expansão num espaço já de si infinito.

Mas parece que a coisa, afinal tem limites. Teremos atingido a fronteira final da expansão económica? Durante quanto tempo poderemos continuar a viver com os actuais níveis de consumo?

A gente sabe, pelo menos desde Proudhon, que "toda a propriedade é um roubo". Ou seja, para nós vivermos na abundância do mundo global e tecnológico, alguém tem de estar a pagar a factura vivendo na miséria. Este nosso modo de vida poderá alguma vez alastrar a todo o planeta? Há alguém são dos miolos que acredite em tal coisa? No dia em que toda a Humanidade consumir energia e outro tipo de bens aos níveis médios do consumo na Europa o planeta dá um estoiro que até Deus vai acordar finalmente!

Resumindo e concluindo: acredito que a economia é como um balão e tem o seu limite. Acredito que atingimos o ponto em que não dá mais, não estica mais, não pode continuar a soprar-se para dentro do sistema económico sem corrermos o risco de que, na próxima sopradela, ele nos rebente nas beiças. O sitema económico começou a esvaziar e terá de encontrar um novo patamar de estabilidade. Resta saber que patamar será esse e a que níveis de consumo teremos de regredir para evitar que esta merda vá toda pelos ares.

terça-feira, maio 11, 2010

O Papa é Pop


O ambiente ferve apesar de o dia estar a dar para o frescote. Há vento, um pouco de chuva e muita fé a pairar no ar. Vem aí o Papa, caraças, é dia de manifestação católica!

Comecei este post pela manhã, ainda antes de o Papa chegar, e estou a concluí-lo já depois dele ter chegado. Não vi nada na televisão (estive a trabalhar todo o dia e à noite vim jantar sossegadinho) nem estou para aí virado. Imagino o escarcéu!

Dei por mim a recordar a recente vinda a Lisboa dos Tokyo Hotel, a inefável banda pop juvenil que levou centenas de fãs a dormir à porta do Pavilhão Atlântico. Entrevistadas (sim, porque essas fãs eram maioritáriamente do sexo feminino e abaixo dos 16 anos de vida) declaravam amor incondicional pelo andrógino vocalista e uma fé sem limites nas qualidades redentoras da música por ele interpretada. Um fenómeno pop característico de um mundo enrolado nas teias dos mass media.

A vinda de Ratzinger produz um quadro com contornos semelhantes. A mesma fé cega, a mesma esperança na redenção alcançada pelo contacto visual com a vedeta de serviço. Hoje não são as teenagers, são os católicos. O fanatismo não conhece distinção. Dou por mim a pensar que o Papa é, também, um fenómeno pop. É uma figura que não se questiona, é uma personagem idealizada à qual se adere sem qualquer tipo de racionalidade. Óbvio!

Não tenho nada contra nem tenho nada a favor. Na verdade estou-me a cagar para a vinda do Papa e sinto um certo fastio pelo circo mediático montado em volta dele. Afinal de contas e bem vistas as coisas, o facto de Ratzinger ser Papa não faz dele mais do que um mero descendente de um macaco qualquer. Tal qual eu.

Simples. Curto. Duro.

domingo, maio 09, 2010

Solar


Acabei ontem a leitura de Solar, o mais recente livro de Ian McEwan. E fiquei a pensar no seu final. De tal modo esse "repensamento" me ocupou o espírito que o reli várias vezes e, sempre que voltei a fazê-lo, descobri mais qualquer coisinha que aparentemente me havia escapado na releitura anterior.

O livro já está aqui ao meu lado, deitado na mesa, preparado para recolher ao sono criogénico da prateleira onde irá fazer companhia a mais meia-dúzia de volumes do mesmo autor.

Sempre que leio um romance de McEwan é como se regressasse a um lugar literário que reconheço e muito me agrada. Nos livros dele sinto-me em casa. Ou melhor, sinto que visito a casa de um familiar querido à qual regresso esporádicamente mas, sempre que vou até lá, encontro o meu lugar e ali me aconchego, atravessado por ondas de um prazer sensorial difícil de descrever.

Solar é muito bom. Não se me oferece dizer mais nada. Posso talvez acrescentar: leiam-no. E leiam outros livros de McEwan. Ele é o maior!

sábado, maio 08, 2010

Um pensamento confuso


Ontem realizaram-se eleições em Inglaterra. Quero dizer, na Grã-Bretanha que os escoceses e os galeses também votam naquela eleição. Ou melhor, votou-se no Reino Unido, uma vez que a Irlanda do Norte é considerada parte da coisa e não um país ocupado e por lá também há quem tenha direito a votar. Pronto, deixando de lado precisões escusadas e irritantes, quero eu dizer que se votou para eleger o parlamento inglês.

A percentagem de participação dos eleitores até foi interessante, 65,1%. Bem bom! Mas, segundo as notícias, houve centenas (milhares?) de eleitores que deram com o narizinho na porta da sua "polling station" e não puderam enfiar o boletim na urna. As mesas de voto encerravam às 22 horas lá do sítio e, segundo as regras, depois dessa hora só pode votar quem tiver o boletim na mão. Rezam as crónicas que, conforme os locais, houve diferentes atitudes. Uns meteram o pessoal todo dentro dos edifícios, outros distribuiram boletins aos que faziam fila lá fora permitindo-lhes que votassem e, finalmente, houve quem simplesmente mandasse para casa os eleitores que esperavam pela sua vez que, assim, não puderam exercer o seu direito fundamental.

Ok. Este episódio deixou-me a pensar numa coisa. Se em Inglaterra (ou Grã-bretanha, ou Reino Unido) as coisas se passam assim, como será no Iraque ou no Afeganistão, só para citar dois exemplos recentes de democracias enxertadas em territórios sem tradição democrática? No fim o que conta são os números, as percentagens e os deputados eleitos. Mas o sistema parece não funcionar lá muito bem (lembram-se como Bush foi eleito com aquela vigarice das recontagens dos votos na Florida?).

As perguntas são incómodas:

A Democracia existirá de verdade?

A eleição democrática tem alguma possibilidade de funcionar na realidade, sem trafulhices nem erros grosseiros?

Ou será que o sistema é mantido apenas para garantir a aparência de que funciona?

Estaremos a viver num mundo de faz-de-conta onde o que importa é que a Economia funcione de acordo com o seu desregramento inumano e predador?

Mais uma vez sinto que a Verdade e a Realidade coexistem mas é impossível que coincidam. São coisas diferentes e a vida é algo que se passa algures entre elas. A Verdade é o que nós imaginamos e a Realidade é aquilo que acabamos por receber em troca dos nossos sonhos. É confuso não é? Também me parece.

quinta-feira, maio 06, 2010

Olá, tás fixe?


O Papa está por aí a rebentar, não tarda. Já se sente aquele frenesim do costume, com os crentes mais fanáticos a mostrarem a quem quiser ver como são devotos e pios e bons e tudo o mais. E que quem não fôr como eles não merece sequer um sorriso, por amarelo que seja.

A forma como a visita papal está a ser encarada pela sociedade portuguesa mostra que somos mesmo um país à parte. Fecham escolas, fecham hospitais e repartições públicas, fecha tudo menos as lojas que vendem santinhos e as roulottes de bifanas e couratos que a oportunidade de negócio é santa. Isto numa república laica, onde a igreja ocupa um lugar ambíguo que parece ser maior ou menor conforma há ou não há Papa na costa.

Quando chegar o bispo de Roma vai ser uma lufa-lufa de personagens públicas a fazerem ar de santinhas, a quererem mostrar como são mais papistas do que ele, para o labrego ver e o papalvo engolir.

Enfim, avizinham-se dias de grande histeria colectiva que em nada ajudam a compor o estado lastimável da nação portuguesa. A menos que o Papa faça um milagre que nos salve do caos económico. Isso é que era! Mais tarde, quando Ratzinger morresse, sempre teriam um bom motivo para a canonização do costume.

quarta-feira, maio 05, 2010

E se... talvez.


Pensando bem e olhando de relance para o mundo em que vivemos fica a dúvida sobre para que raio de merda serve afinal a escola. Não falo apenas do falhanço na transmissão de conhecimentos que referi no post anterior. Falo da escola em si, enquanto lugar de aprendizagem.

Num mundo tão avassaladoramente mediatizado como o nosso, essa transmissão de conhecimento está dispersa. A Wikipédia é uma espécie de escola e serve às mil maravilhas as aspirações de rápida resolução de problemas dos jovens, ansiosos por se libertarem dos enfadonhos deveres do trabalho escolar. Tão rápido e fácil quanto simples e superficial.

Talvez tenha sido sempre assim. Talvez tenhamos procurado durante séculos uma fórmula que permitisse o conhecimento instantâneo e o tivéssemos descoberto agora, com este mundo virtual onde nos encontramos. Resolvemos o problema mas a solução não parece particularmente elegante. Talvez a evolução social contemporânea implique esta espécie de boçalidade intelectual. Terá sido sempre assim? Não terei eu parecido um labrego selvagem aos olhos dos meus professores? Temo bem que assim tenha sido.

A escola está a tornar-se obsoleta? Os miúdos consideram-na um excelente local de socialização mas uma tremenda seca enquanto local de aprendizagem. Talvez tenham razão.

Criámos um mundo em que o divertimento e o lazer são as aspirações máximas dos seres humanos. Trabalhar árduamente para alcançar objectivos determinados está a perder glamour. Quem trabalha são os otários. Os cidadãos com maior sucesso são aqueles que levam uma vida despreocupada com volumosos rendimentos, não sendo muito importante a sua origem. A vigarice e a ladroagem são toleradas se tiverem sido cometidas por uma boa razão. O enriquecimento rápido e sem limites é, aos olhos da maioria, uma boa razão. Contra isso a escola não tem argumentos eficazes. A ética e a moral são coisas próprias de utopias modernistas. Este mundo é pós-moderno.

Aliás, como sabemos, o exemplo vem de cima. Somos diáriamente confrontados com o despudor dos poderosos e daqueles que nos governam. Os negócios fraudulentos, a ineficácia dos sistemas de justiça, tudo nos mostra que o problema não está na escola. Afinal esses ladrões que agora nos governam foram nossos colegas, frequentaram as mesmas escolas que nós, aprenderam pelos mesmos livros. E qual é o resultado? Este mundo de merda em que vivemos, incapazes de cumprir as tais utopias democráticas que ganharam forma de contorno em meados do século anterior.

Resumindo e concluindo: o problema principal reside na fraca qualidade dos materiais com que deus construiu o ser humano. O futuro só será prometedor se não for mais do que uma refinada mentira. Sobra o presente.

terça-feira, maio 04, 2010

Tá-se


Algo está a funcionar ao contrário! Na escola ensina-se como é benéfica uma alimentação saudável, estuda-se a roda dos alimentos com sucessivas adaptações ao mundo contemporâneo e... cada vez se consome mais açúcar e junk food e os putos vão-se elefantizando a olhos vistos. A Europa é um planeta gordo, território para gente XXL.

Ne escola insiste-se na leitura dos clássicos. Camões, Fernando Pessoa, José Saramago, Sophia de Melo Breyner Andresen, citando apenas alguns dos autores portugueses mais massacrados. Resultado? Os putos mal sabem soletrar a palavra lei-tu-ra, lêem cada vez menos e escrevem aquelas mensagens de SMS e quejandos, cheias de kapas e abreviaturas abstrusas. O vocabulário aproxima-se perigosamente de um limite aceitável e está atolado em expressões pouco interessantes mas de suculenta sonoridade. Tipo: tipo, bué, iá, tá-se...

Dizem-nos que, além do Português, é com a Matemática que se completa a coluna vertebral de uma educação eficaz mas os putos ficam extasiados quando um professor faz uma conta de dividir no quadro. "O Stôr sabe fazer essas contas com casinha!" disse-me um aluno do 12º ano, a dias de entrar numa Faculdade qualquer, quando calculávamos as médias no final do ano passado.

Enfim, a lista segue por aí fora, como um rio de ignorância correndo furioso em direcção ao mar do conhecimento. Há qualquer coisa que não bate certo. O que a escola ensina parece ser o que os alunos conhecem pior. Conclui-se que a escola, de facto, não consegue ensinar o que pretende. Talvez ensine outras coisas que nem sequer suspeita que ensina. Ensinará? Os alunos talvez sejam os mais habilitados a responder a esta estranha questão mas, como sempre, não estão nem um pouco interessados. Muito menos me parecem preocupados.

Tá-se.