sexta-feira, outubro 30, 2009

Estou nas nuvens

clicar na imagem para leitura detalhada


Hoje recebi uma notícia que me deixa mais do que orgulhoso. A minha filha, Eva, vai receber amanhã, na Amadora, o 1º Prémio relativo ao escalão até aos 17 anos, do concurso de Banda Desenhada organizado pelo FIBDA (Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora).
O tema para a BD não era nada fácil: O Grande Vigésimo. Uma coisa difícil de entender e, mais ainda, difícil de abordar, tema global desta edição que, aliás, mereceu algumas críticas pouco abonatórias (ver aqui).
No entanto a Eva recorreu à sua criatividade de tal modo que esta se transformou em personagem central da narrativa que concebeu para dar resposta a tema tão estrambótico. O resultado é o que ilustra este post e que mereceu a atenção do Júri.
Amanhã será dia de consagração pública nos Recreios da Amadora onde irá decorrer a sessão de entrega dos prémios. Estou nas nuvens.
:-)

sábado, outubro 24, 2009

Deixa-me entrar


Foi a minha filha quem me chamou a atenção para este filme. Mostrou-me um trailer no Youtube e a curiosidade lá ficou, guardada e esquecida. Até hoje.

Passei na FNAC pela manhã decidido a comprar um DVD para ver durante o dia que se me anunciava indolente. Vasculhei nas prateleiras, deixei que os olhos cirandassem pelos títulos, uma outra imagem prendeu-me a atenção. Já tenho alguma dificuldade em ler as sinopses nas costas das caixas, têm letrinhas tão pequeninas que nem com óculos consigo perceber patavina. Talvez com umas lentes mais potentes... até que parei defronte a este "Deixa-me entrar" e a tal memória deslocou-se, calma e seguramente, lá do fundo escuro da minha mente e parou com elegância debaixo de uma luz pouco branca, o que me fez pegar imediatamente no DVD. E vim para casa.

A Eva (a minha filha) ficou radiante. Depois do jantar reunimos toda a família diante da TV e demos início à sessão. No final; deslumbramento e excitação. Tínhamos visto um daqueles filmes que, como diz o Beto Canales, entra direitinho na lista dos 10 melhores filmes de sempre, embora essa lista tenha para aí uns 110 filmes ou mais.

O filme é sueco. A sonoridade da língua tem aquele ritmo estranho que, em "Deixa-me entrar", se torna quase encantatório. É uma obra de arte como só no cinema podemos encontrar. Os planos e as sequências têm uma solidez pictórica extraordinária e o argumento é simplesmente genial. Ainda estou meio a pairar no ar.

quinta-feira, outubro 22, 2009

Contos


Este texto é uma carta ao director do jornal Público. Aqui foram acrescentadas as hiperligações.


Não me parece que José Saramago tenha produzido as afirmações da discórdia com o intuito de promover o seu livro [Caim] numa espécie de golpe publicitário espertalhão, como alguns dos que o desprezam pretendem fazer acreditar. Nem tampouco me parece que o velho escritor tenha vindo emendar a mão quando reconhece haver passagens interessantes na Bíblia ou quando assume que muitos dos valores que tem interiorizados são valores cristãos. Aqueles que, como o senhor director do Público, olham para Saramago como um troca-tintas arrogante simplesmente não são capazes de enxergar muito além dos seus narizes e querem ver nele um diabo vermelho, incapaz de compreender os tais valores. Saramago pensa pela sua cabeça, livremente, isso é mais que uma qualidade, é uma bênção. Aquilo que diz é produto de uma visão do mundo fortemente personalizada. Daí que possa olhar para certos críticos descabelados como quem olha para um insecto zumbidor capaz de fazer perder a paciência a um santo.

Mário David, um ilustre eurodeputado desconhecido até dos que nele votaram, encontrou neste episódio a oportunidade para o seu momento warholiano. Vindo lá dos céus de Bruxelas, qual anjo vingador, descarregou um arsenal de boçalidades e imbecilidades sobre José Saramago que imediatamente ganharam eco nos meios de comunicação por serem tão estúpidas quanto sonantes. Os jornais adoram uma boa caixa e aquele infeliz proporcionou-as generosamente. Uma visita à sua página na internet mostra-o aos beijos e abraços a tudo quanto é figura mais ou menos pública, destacando-se duas fotos em que ele ajoelha e oscula o anel de João Paulo II. Se o Mário é português (mesmo que não cheire mal da boca) é natural que muitos dos que também o são queiram ser espanhóis. Pim.

Os que acreditam em deus com devoção de carneirinho não se atrevem a questioná-lo. Quer-me parecer que essa cegueira intelectual é mais fruto de um medo atávico do que propriamente por respeito ou admiração sincera. O inferno é, para muitos, um lugar tão real e verdadeiro quanto o paraíso e convém não esquecer que é a deus que compete decidir quem vai para um e outro desses lugares, numa decisão sem apelo nem agravo. Os devotos de Jeová, o deus dos exércitos, o criador das sete pragas do Egipto, o carrasco de Sodoma e Gomorra, não compreendem muito bem (nem mal) que um homem possa apenas pretender pensar pela sua cabeça e faça uso da inteligência de forma crítica e objectiva. Esses têm demasiadas cercas e gaiolas onde se enfiam temendo a ira daquele implacável deus do Antigo Testamento. Imaginam-se iluminados e no caminho da salvação quando, a meu ver, vivem vidas que não despertam inveja nem a um pinto de aviário, quanto mais a um homem livre. Se eu acreditasse numa divindade desse calibre também havia de sentir ódio por Saramago.

O Antigo Testamento, tal como o conhecemos, será bem diferente da versão original que os evangelistas registaram nos míticos tempos em que deus lhes soprava ao ouvido o que haviam de escrever. Dezenas, centenas, milhares de traduções depois, o texto decerto fará justiça ao provérbio que diz “quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto”. E é de contos que falamos, quando falamos da Bíblia. Contos poderosos, uns, mais fraquinhos, outros, mas contos. Para mim faz tanto sentido orientar a minha existência tendo por base a leitura da Bíblia quanto faria sentido orientar-me cegamente por um bom livro de contos de Tchekov. Assim como assim seria uma orientação bem mais humanista para a minha vidinha.

sábado, outubro 17, 2009

Proxenetismo hípico


A comparação deixou-me a pensar no assunto. Aqui há dias, numa daquelas páginas de jornal que tratam as frivolidades quotidianas como notícias, lá vinha estampado "Salário de Ronaldo será ultrapassado". A ilustrar o apontamento uma foto de Cristiano Ronaldo a olhar o infinito. O pequeno texto comparava os ganhos monetários do jogador de futebol com os ganhos dos donos de um... cavalo!

Trata-se de um jovem potro fenomenal que responde ao nome de Sea The Stars (até tem entrada na Wikipédia mas, o que não tem?) que venceu as mais importantes corridas em que participou este ano. O bicho é de tal modo extraordinário que vai ser retirado da competição nas pistas para se dedicar em exclusivo à procriação. No final do texto lá vinha o sumo da notícia "(...) o Guardian noticiou que isso poderá render aos donos do cavalo 700.000 euros por semana, entre Fevereiro e Julho. Ronaldo ganha 237.000 euros por semana."

Fiquei indignado. Os donos do pobre Sea The Stars estão, positivamente, a aproveitar-se dos atributos físicos do bicho numa atitude que só pode ser classificada como proxenetismo.

Numa época em que os direitos dos animais são levados ao extremo, penso que está aqui uma óptima causa para lançar um abaixo-assinado na INTERNET. Não haverá ninguém suficientemente humano para defender o pudor deste pobre cavalo? Não terá o campeão das corridas o direito a escolher a égua dos seus sonhos?

Fica o alerta. Vivemos num mundo perigoso.

sexta-feira, outubro 16, 2009

O estranho caso Maitê


Isto é coisa meio estúpida, a meu ver. Mostra como a NET tem poderes estrambóticos e, quando esses poderes são utilizados sem tempêro adequado, transformam uma coisinha de nada em coisona feiosa. Vem tudo a propósito de uma espécie de reportagem que Maitê Proença promoveu numa das suas visitas a estas terras do fim da Europa (ver aqui). A coisa tem dois anos mas só agora foi "descoberta" por estas bandas e largamente difundida, tendo mesmo honras de telejornal na TV e os mais variados comentários na imprensa escrita. A maioria dos que comentaram não gostaram nada do tom algo jocoso com que a actriz contou alguns episódios da sua estadia.

É a velha história. Nós, portugueses, podemos dizer do nosso país e de nós próprios cobras e lagartos, é uma espécie de desporto nacional. Mas quando um visitante ocasional resolve "botar a boca no trombone" ficamos exasperados, indignados mesmo. A coisa tomou tais proporções que Maitê se viu na obrigação de pedir desculpas (ver aqui). (ler e ver tudo junto aqui)

Cá para mim, o problema é que Maitê sempre foi vista como uma namoradinha transatlântica apaixonada por essa coisa abstracta que é Portugal, com letra grande. Dela o povão esperava apenas palavrinhas doces e sorrisos lindos, coisas que ela faz sem esforço e com doçura. Vê-la e ouvi-la a dizer aquelas coisas um bocado parvas deixou esse povão em estado de choque. Ainda para mais ela estava ganhando uma aura de intelectual, não só porque editou um livro mas também porque terá um caso amoroso com um dos mais rebeldes intelectuais cá deste lado, o destemido Miguel Sousa Tavares, (ler e ver tudinho mesmo aqui) que já saiu em defesa da sua amiga.

Desde a primeira hora que tudo isto me parece uma perfeita imbecilidade. A brincadeira foi bastante parvinha porque a tal "reportagem" de Maitê simplesmente não tem ponta de graça e muito menos uma sombra de piada. Fico com a sensação que o humor não será o seu forte. Por outro lado, a reacção despeitada de um número significativo de portugas mostra como há por aqui muita gente que não tem nada melhor para fazer que não seja irritar-se por "dá cá aquela palha". (este vídeo legendado mostra como as coisas podem ganhar proporções desajustadas quando vistas pelos olhos de um nacionalista doentio, um monárquico, neste caso)

Ó amigos meus, vejam os vídeos e digam lá se vale a pena.

Isto faz-me lembrar a polémica com o cão vadio na exposição (recordar aqui num óptimo e esclarecedor post). Fico com a impressao de que há um desejo de indignação latente que, devidamente potenciado, lança o mais pacífico dos "surfistas" da NET na mais negra das campanhas. Que o estranho caso de Maitê sirva, pelo menos, para nos manter atentos em relação ao que realmente importa e nos faça reflectir sobre a facilidade tenebrosa da maledicência venenosa.

Beijos.

quinta-feira, outubro 15, 2009

Passarinhos


Todos os dias vejo dezenas (centenas?) de criancinhas em diferentes patamares de uma suposta evolução que, em última análise, conduzirá ao surgimento de um igual número de adultos. Dentro dos muros da escola, estas personagens enchem o espaço de uma alegria electrizante, transbordam energia (nem sempre) positiva, fazem o presente sonhar com uma possibilidade de futuro.

Sentado, dou por mim a sorrir enquanto observo alguns rapazes e algumas raparigas, lá fora, fazendo exercícios de ginástica sob o calor e o brilho do sol. Parecem inacabados e perfeitos. Olho-os e tenho a sensação de que o crescimento os irá fazer retroceder fisicamente enquanto o intelecto se fôr desenvolvendo. É como se o corpo e a mente fizessem viagens simultâneas mas em sentido inverso, cruzando-se como que por acaso, nalgum ponto das nossas vidas, potenciando uma felicidade especial que não sei se existe ou se tem alguma explicação.

Das árvores solta-se em riscos rápidos e fininhos o canto de pardais escondidos. Os miúdos abandonam o pátio. Deixo de os ver tal como não vejo os pardais mas ainda se ouvem as suas vozes a voltear em traços redondos e macios. Passarinhos!

segunda-feira, outubro 12, 2009

A cabeça inchada


Um homem é isso mesmo: um homem, apenas... poucos conseguirão ser mais do que isso. Quando olho para uma foto de Obama, quando vejo imagens de Obama discursando ou Obama fazendo de conta que não se passa nada de extraordinário ao ponto de ir comprar uns hamburgeres à tasca da esquina, vejo um tipo meio perdido nas ruelas esconsas da realidade. Um tipo a quem se exige que seja quase um outro Cristo, um Cristo quase negro como convém à humanidade que seja o próximo Messias. Já andamos fartos da imagem do Cristo loiro de olhos azuis, o Cristo impossível, o Cristo cara-pálida, esse Cristo que apenas consegue fazer empertigar os fantasmas maus (da guerra, do poder económico, da xenofobia e do racismo) e desejamos ardentemente que possa existir um Cristo bom, um Cristo diferente que nos permita acreditar novamente na possibilidade de redenção da nossa espécie e, mais do que isso, um Cristo que nos permita sonhar com um mundo novo no qual a bondade humana ganhe um alento que pensávamos estar perdido.

Cristo que se preze carrega a sua cruz. O comité do prémio Nobel encarregou-se de a colocar no ombro de Obama e agora estamos todos a olhar para ele, coitadinho, como se o mundo lhe rodasse nas mãos enquanto ele, absorto, pensa no futuro e como poderá ser o mundo daqui para a frente. Como se sentirá Obama nesta nova pele que lhe queremos cozer à volta dos ombros? O que lhe rodará no interior da cabeça? Como será para alguém que é igual a qualquer um de nós ver-se transmutado em ícone vivente, esperança de paz num mundo construído sobre um matriz guerreira? Ai, Obama, estás fritinho, meu irmão. Desculpa lá esta merda mas vais ter que te desenrascar. Sinceramente, deposito em ti grandes esperanças mas nao te queria estar na pele. Só espero que numa noite de insónias, quando ajoelhares, cabeça inchada como uma abóbora de Haloween, para rezares ou falares directamente com o Big Boss, não dês por ti a suar sangue.

sexta-feira, outubro 09, 2009

Surprise!!!


Ena pá!!! Esta foi uma autêntica surpresa. "Surprise", como dizem os gajos que falam a língua do presidente Barack Hussein Obama. Atribuir o Prémio Nobel da Paz ao presidente dos Estados Unidos da América não parece ser a coisa mais óbvia, pois não? E não é, de facto. É uma coisa estranha e inesperada. Afinal de contas Obama tem nos braços duas guerras que herdou directamente do Grande Satã e ainda uma prisão maldita que continua a funcionar a emio gás, ali para os lados de Guantanamo.

Então que raio de ideia foi aquela dos gajos que atribuem o Nobel? Estão parvos ou malucos? Passaram-se de vez?

Cá pra mim, que sou pouco mais do que ninguém, os gajos passaram-se, mas só um bocadinho. Obama, goste-se dele ou desgoste-se do que ele representa, é a face da esperança ("hope", como dizem os gajos que falam aquela língua simplória) e é essa esperança a verdadeira premiada deste ano. Sem Obama o futuro pareceria a todos nós bem mais cinzento, a dar para o muito escuro. Quase preto de fumo e vermelho de destruição. Com ele podemos acreditar na possibilidade de existir paz, nem que seja a médio prazo.

É claro que os talibã preferiam que o prémio Nobel da Paz fosse atribuído a Osama Bin Laden, por exemplo. Os iranianos escolheriam quem? E por aí fora, há muita gente que desdenha de Obama. Esses desdenham tudo. Esperança incluída.

quarta-feira, outubro 07, 2009

Kindle


Caramba, nem sei o que pensar! Uma caixinha parecida com um livro que não é um livro mas sim uma biblioteca em potência com 1500 livros lá dentro? Chama-se Kindle e vai estar à venda em Portugal com livros disponíveis para descarga em... língua inglesa. Um luxo que, num futuro que se adivinha próximo, irá desocupar estantes um pouco por todo o mundo. Quando a livralhada virtual estiver disponível em Português talvez pense no assunto. Para já, confesso, a coisa mete-me um certo medo. Não sou capaz de imaginar um livro que não seja em papel impresso. Nem neste écrã sou capaz de ler um livro, como será com um écrãzinho pequenino? Não estou a imaginar.

Nestas ocasiões penso que sou um bocado retrógrado, que não me entusiasmo com as coisas novas que o comércio futurista me põe à disposição no mercado. Adoro as minhas prateleiras carregadas de livros. Os livros com imagens são os meus preferidos. Amo os de Banda Desenhada que colecciono com afinco. Não estou a ver como poderão funcionar os livros com imagens de arte nesse tal Kindle.

E o que farão aqueles gajos importantes que gostam de dar entrevistas na TV com uma prateleira repleta de livros por trás? Um cenário carregado de livros dá um certo ar intelectual à personagem... um Kindlezinho lá atrás não vai impressionar ninguém!

Enfim, o mundo pula e avança mas há pulos e avanços que dificilmente entusiasmam toda a gente. Digo eu.

terça-feira, outubro 06, 2009

3 atributos


Transparência. Densidade. Narrativa. Leveza, humor e um soco no estômago. Suspensão. Do gesto. Do gosto. Do tempo. O tempo suspenso do espaço em volta. O objecto. Dinamismo. Oposição. Complementaridade. A obra completa. A obra complexa. Rasga o espaço. Divide, une, representa. A mão suspensa na fronteira. Paira no vazio. Aguarda. E foge. Regressa. Dança. Transparência, densidade e narrativa.

segunda-feira, outubro 05, 2009

Um sorriso ao espelho


Por vezes há notícias que me enchem de orgulho por ser português. Pelo menos num primeiro momento. Durante os instantes em que não penso demasiado sobre o assunto, o título de uma notícia pode lavar-me a alma e deixá-la perfumada como um bébé saído do banhinho.

Repare-se no título desta notícia : Portugal é o mais "generoso" em políticas de integração. Caramba, digam lá se não soa bem!?

Lembro-me de ser miúdo e viver numa aldeia lá para a Beira Alta, entre a serra do Caramulo e a da Estrela. Não havia água corrente, as pessoas passavam fome de cão, os carros de bois cirandavam pelas ruas em tarefas de transporte e os bichos largavam bosta pelo empedrado. O padre era uma figura importante e a minha avó tinha um retrato do Salazar na parede do corredor, logo à entrada da casa.

As pessoas não viajavam. Saíam da aldeia. Os rapazes para a guerra em África e muitos outros emigravam. Uns para França, outros para a Alemanha mas, se bem me lembro, a maioria dos que saíam dali rumavam ao Luxemburgo. Eram tempos de grande miséria e maior ignorância, de mulheres fechadas em roupas negras como a noite, fruto de muitos lutos e uma tristeza arrasadora.

Mas a vida mudou, oh sim, como mudou! Hoje já não há soldaditos a marchar para África e muitos emigrantes regressaram. Construíram casas, montaram negócios, refizeram o tecido social e económico daquelas bandas. Portugal passou a ser também destino de emigração. No mundo actual, os emigrantes vêm de todo o lado, de países que, imagino, passam agora as dificuldades que o nosso passou nos anos 60 e 70. As pessoas procuram melhores dias onde quer que eles possam amanhecer. E Portugal é um país com muito sol e, sobretudo, repleto de portugueses que são gente com o coração ao pé da boca.

A leitura da notícia que acima refiro mostra como, no campo das intenções, não há quem nos bata. Quando se trata de declarar o que nos vai na alma somos campeões mundiais! Temos legislação generosa e um sorriso pronto quando se trata de receber estrangeiros. Estou em crer que também não nos custa aceitá-los como portugueses quando a isso eles se dispõem, embora isso seja apenas um pormenor.

Um povo que se espalhou pelo mundo como o fez o povo português, num laborioso trabalho de séculos de emigração, só pode, agora, abrir os braços e as fronteiras aos que procuram no nosso país aquilo que nós procurámos noutros países: paz, pão e uma vida melhor.

Apesar de haver muitos com um discurso xenófobo e racista, quero acreditar que a esmagadora maioria do povo português está de bem com o mundo e com a restante humanidade. Que se lixem as fronteiras. Venham daí que serão benvindos!

domingo, outubro 04, 2009

Um homem como outros


Van Gogh é um caso extraordinário de popularidade. Não sei dizer qual a percentagem de pessoas em todo o mundo contemporâeo que o "conhecem" ou, pelo menos, sabem o que ele fez. Van Gogh é "o" artista que habita o nosso imaginário. O génio meio louco, trabalhador incansável, o pintor capaz de meter na tela a força do mundo e da vida com um vigor nunca antes visto e, depois dele, poucas vezes alcançado.

É do domínio público que, no tempo em que viveu, poucos repararam naquela força nova que emanava das suas telas e desenhos. Foi preciso que a roda do tempo rolasse uns anos largos até que Vincent chegasse até nós e se tornasse íntimo do nosso olhar e do nosso coração sensível. Ele é um artista que conhecemos com uma profundidade rara. Esse conhecimento deve-se, em grande parte, às cartas que escreveu e enviou a Theo, o irmão dedicado, a outra parte de Van Gogh.

Anuncia-se agora a edição de um livro que só pode ser extraordinário, Vincent Van Gogh, The Letters, que será lançado na próxima 5º feira, resultado do trabalho desenvolvido ao longo de 15 anos (!!!) por uma equipa ao serviço do Museu Van Gogh, de Amesterdão. Um acontecimento notável.

Van Gogh terá um dia desejado que a sua pintura fosse para toda a gente, que gostaria que cada família tivesse uma obra sua, pendurada na parede de casa. Sabemos bem como isso é impossível mas sabemos também os milhões e milhões de pessoas que terão reproduções e livros com imagens das obras de Vincent. O sonho utópico do artista realizou-se. Agora serão as suas cartas a entrar no circuito mediático com uma força renovada. Tornar-se-ão também um caso de popularidade absoluta? Talvez isso venha a acontecer alimentando o mito do artista genial e genuíno que Van Gogh representa. Ele, suicida hesitante, que um dia disparou um tiro de revólver no próprio estômago ficando a agonizar durante alguns dias até sucumbir ao ferimento. Van Gogh, o génio absoluto.

sábado, outubro 03, 2009

Estados de alma


A vida tem destas coisas. Na edição de hoje do Público vem uma noticiazinha bastante cinzenta sobre um inquérito feito em 33 países com o objectivo de medir a auto-estima dos povos. "O trabalho, elaborado por uma empresa internacional de consultoria, o Reputation Institute, pediu a cidadãos de diferentes nacionalidades que pontuassem a confiança, o respeito, a admiração e o orgulho relativamente aos respectivos países."

Portugal lá está no fundo da tabela, em 4º a contar do fim, confirmando o que já se suspeitava: somos tristongas a gastar, os "latinos tristes", como alguém nos designou depois de passar cá um par de semanas a apanhar sol na mona. A notícia segue em ritmo zombie com declarações dos senhores do costume. De um lado Vasco Graça Moura a clamar contra o abandono da Cultura (bem pode ir pregar pró deserto) e do outro o sociólogo Manuel Villaverde Cabral que desbobina umas ideias mais curiosas sobre a forma como a auto-estima se manifesta. Tudo normal (bocejo) até reparar nos 3 últimos lugares da lista.

No fundo o Japão. Pronto, está certo, aquilo afinal é uma ilha grande e os japoneses levam a vida muito a sério e vivem mais tempo que os ocidentais e tudo, por serem tão capazes de fazerem as coisas bem feitas. Mas isso não proporciona felicidade a (quase) ninguém.

Em 2º a contar do chão está a África do Sul. Caramba, pudera, ainda devem andar a curtir a depra de terem vivido tantos anos num regime de apartheid e, uma vez saído do inferno, o país não consegue realizar os sonhos de igualdade, teimando em viver um pesadelo complicado.

Em 3º, mesmo atrás de Portugal... está o Brasil!!! Quem diria? Lendo o resto do jornal encontramos brasileiros em delírio absoluto graças à notícia da eleição do Rio de Janeiro para sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Uma festa carnavalesca. Além disso, a notícia enfatiza a ideia de que, por alturas dos Jogos no Rio, o Brasil será, provavelmente, a 5ª economia mais poderosa do planeta. Então porque está o Brasil atrás do país do Fado e do choradinho neste ranking mal amanhado? Por mais voltas que dê à cabeça só encontro uma explicação ou duas; é herança genética ou então a tristeza vem agarrada à língua portuguesa como lapa vai agarrada na rocha. Não somos nós que dizemos que não há tradução para "saudade" seja qual fôr a língua que tente explicá-la? Pois concerteza, se a saudade é um exclusivo lusófono muita coisa está explicada.

sexta-feira, outubro 02, 2009

Ig Nobels?


O Prémio IgNobel merecia outra visibilidade. As notícias sobre a sua atribuição, em Boston, acabam por fazer parte de uma secção de curiosidades menores. Parece-me injusto que, por exemplo, o Prémio Nobel tenha mais publicidade e seja levado mais a sério. Isto porque as investigações galardoadas com o Ig Nobel (ver aqui 10 das mais extraordinárias) apesar de serem capazes de nos levar a rir até às lágrimas, mostram os limites do absurdo e deixam bem visível até que ponto os tolos se aproximam dos limites da genialidade. É como se houvesse uma fronteirazinha fininha entre o mais parvo e o mais inteligente e que, por vezes, o lado da fronteira em que fica uma ideia ou uma pessoa não é mais que obra do acaso.

Consulta as hiperligações acima, amigo leitor. Vais ver que acabas a rir contigo próprio.