A proposta de alteração ao estatuto da carreira docente apresentada pelo Ministério da Educação resulta de uma necessidade. A forma como se vem organizando o percurso profissional de milhares de professores configura situações desastrosas e injustas para muitos deles (de nós, professores). A progressão quase automática tanto do monga que se balda com frequência e destempero quanto do rato de biblioteca que, além de ser assíduo e pontual ainda tem o desplante de se interessar pela qualidade do seu trabalho, não pode continuar a vigorar. Se um professor não presta não presta mesmo. O corporativismo de que somos tão frequentemente acusados é um facto. Esta situação precisa de ser revista, sem dúvida, é necessário repensar os processos de avaliação de desempenho. De acordo.
Assim à 1ª vista a proposta agora parida pelo Ministério da Educação tem alguns objectivos mal escondidos. Por um lado. em nome do rigor na avaliação, parece pretender-se restringir o acesso de professores aos escalões mais elevados da carreira. A preocupação não será a de melhorar a qualidade do ensino mas sim reduzir os gastos com o pessoal. Prova disto é a ideia peregrina de pôr encarregados de educação a contribuir para a avaliação do desempenho profissional dos professores. Se não fosse tão malévola não passaria de uma má ideia. Mas o populismo da proposta mostra bem as linhas com que se cose a ministra. Até acredito que, no processo de negociação que se vai seguir, deixe caír esta proposta imbecil. Mas o odioso da questão vai incidir nos professores que, perante a opinião pública, vai surgir como uma classe que não aceita ser avaliada, que apenas pretende boa-vida e pouco trabalho. A ministra é mesquinha. Se não é mesquinha, se age com boa vontade e intenções realmente puras, então que me desculpe. A imagem que exporta é, então, de alguém que anda à deriva e muito mal aconselhada.
Cuide-se, minha senhora, tenha lá cuidado com as companhias.
segunda-feira, maio 29, 2006
sábado, maio 27, 2006
Export-export
Continuo com dúvidas do tamanho de uma manada de camiões. Exportar a Democracia será um bom negócio?
Têm ficado os importadores do nosso modelo político e social a ganhar alguma coisinha que se veja quando põem o brinquedo a funcionar, lá na terra deles? Quer-me parecer que não. Quer-me cada vez mais parecer que andamos a vender gato por lampreia e por detrás do nosso Humanismo versão século XXI anda asneirada da grossa escondida com um grande mangalho de fora.
Tudo estará bem quando, num novo território bafejado pelo hálito a rosas das democracias capitalistas, abrir um Mc Donalds e estará perfeito quando chegar o Kentucky Fried Chicken, tudo regado com a melhor Coca-Cola da última colheita. E nós fazemos parte desta merda, somos peças da máquina que provoca problemas mesmo querendo ser peças da máquina que engendra soluções. Tá mal!
Temos uma vinhaça tão baril... se exportássemos apenas Baco aos pedacinhos e metido em garrafas não seríamos mais felizes e, sobretudo os importadores, não seriam muuuuito mais felizes? Temos por aí deuses aos pontapés e insistimos em exportar o mais escorregadio de todos, o Deus Dólar (nem sequer podemos pôr no altar o Deus Euro!). Chiça penico!
sexta-feira, maio 26, 2006
Timor is back!
As coisas estão azedas para os lados de Timor. Os acontecimentos dos últimos dias chegam até nós em ritmo acelerado. Ouvimos novamente falar de Timor com uma frequência assustadora. Isto porque os factos narrados são deveras assustadores.
Mortes e saques, assassinatos, fugas em massa, refugiados, a comunicação social volta a ter assunto e não se faz rogada. Uma confusão de ditos e não ditos, acusações cruzadas entre Xanana e Alkatiri, entre polícias e forças armadas, um novelo complicado e difícil de desenrolar.
Como se chegou a este ponto? Que razões estarão na base de tão desgraçados eventos? Desgoverno, dizem os australianos que entretanto enviam tropas para sossego da população. Sim, parece existir uma situação de impasse entre diferentes grupos no seio das instituições que governam o país, de tal modo que a solução para as desavenças tem sido a velha violência. Pura e dura com sangue e mortes sem remédio.
Regressam apressadas as forças que entretanto já iam abandonando o território, a GNR entre elas. Estabelecem-se novas pontes de solidadriedade. Sobretudo fala-se de novo sobre Timor. Parece que apenas a desgraça é capaz de dar visibilidade àquele território perdido. Os motivos da desgraça? Podemos apenas deitar-nos a adivinhar.
Talvez nos próximos dias se faça alguma luz sobre o assunto. Agora que Timor está de novo a arder talvez possamos saber com algum pormenor o que se tem passado desde a independência até à actualidade. Talvez agora nos contem a história desse tempo "morto" em que, não havendo mortes violentas, parecia não haver assunto para qualquer tipo de notícias.
Um horizonte enfeitado por uma casa em chamas com pôr-do-sol ou um militar levando ao colo um colega moribundo e pintado de sangue são imagens de uma irresistível beleza. Fazem belas capas de jornal e despertam o sonho na cabeça do cidadão-de-classe-média nostálgico das guerras ultramarinas.
Timor is back!
quinta-feira, maio 25, 2006
O balde
Todo o estardalhaço mediático a propósito do livro de Maria Carrilho, o Manuel, mostra bem a natureza daquilo que está em causa. É tudo uma questão de marketing.
Ficámos a saber que as candidaturas a cargos políticos vivem tanto das campanhas organizadas por agências de publicidade quanto o azeite Galo ou o Mateus Rosé. Todos querem chegar ao grande público dê lá por onde der, seja como fôr. Os publicitários, desde que haja dinheirinho, fazem o seu trabalho com empenho e seriedade vestino a camisola do momento não importando qual a que trazem por baixo. Carrilho, no trôpego debate do Prós e Contras na RTP1, chegou mesmo a falar em mercenários, como se nunca tivesse recorrido aos serviços desses profissionais da venda a retalho.
Ainal de contas não há surpresa nem espanto em relação a este facto. A nossa sociedade não é um "Capitalismo Demo-Mediático"? (o "Demo" é de democracia e não relativo ao "chifrudo") O que não tiver visibilidade mediática é como se não existisse, a Democracia só existe nos écrãs da TV e o Capitalismo compra tudo, compra os écrãs, os políticos e as empresas de tratamento e comercialização de imagem.
Só não percebo muito bem é se Carrilho não vê o mundo em que vive e no qual pretende protagonismo e visibilidade. Ele, que é um tipo inteligente, decerto compreende na perfeição as linhas com se cose. Após ter entrado no mecanismo da imagem mediática, o indivíduo tende a ser mastigado, mastigado, ensalivado e, uma vez perdido o sabor, cuspido para o baldinho dos escarros. Carrilho já nada no baldinho mas teima em não aceitar essa situação, mesmo que seja transitória. Vem agora com arremedos de virgem ofendida justificar a derrota nas autárquicas com campanhas organizadas contra a sua pessoa e respectiva família no tenebroso mundo mediático. Ninguém se acredita que o filósofo seja tão inocente e tão canhestro ao mesmo tempo que não tenha ainda percebido que jogando com as mesmas armas do adversário, se foi derrotado, talvez tenha sido culpa própria.
Não deixa de ser estranho que tenha tido ao seu lado, no tal debate da RTP1, um tipo que em tempos afirmou que vender sabonetes era mais ou menos o mesmo que vender presidentes da República. Ironias do destino neste mundo virtual que, por o ser, não chega a existir para lá de si próprio. Esta historieta toda junta não vale os escarros no balde.
Ficámos a saber que as candidaturas a cargos políticos vivem tanto das campanhas organizadas por agências de publicidade quanto o azeite Galo ou o Mateus Rosé. Todos querem chegar ao grande público dê lá por onde der, seja como fôr. Os publicitários, desde que haja dinheirinho, fazem o seu trabalho com empenho e seriedade vestino a camisola do momento não importando qual a que trazem por baixo. Carrilho, no trôpego debate do Prós e Contras na RTP1, chegou mesmo a falar em mercenários, como se nunca tivesse recorrido aos serviços desses profissionais da venda a retalho.
Ainal de contas não há surpresa nem espanto em relação a este facto. A nossa sociedade não é um "Capitalismo Demo-Mediático"? (o "Demo" é de democracia e não relativo ao "chifrudo") O que não tiver visibilidade mediática é como se não existisse, a Democracia só existe nos écrãs da TV e o Capitalismo compra tudo, compra os écrãs, os políticos e as empresas de tratamento e comercialização de imagem.
Só não percebo muito bem é se Carrilho não vê o mundo em que vive e no qual pretende protagonismo e visibilidade. Ele, que é um tipo inteligente, decerto compreende na perfeição as linhas com se cose. Após ter entrado no mecanismo da imagem mediática, o indivíduo tende a ser mastigado, mastigado, ensalivado e, uma vez perdido o sabor, cuspido para o baldinho dos escarros. Carrilho já nada no baldinho mas teima em não aceitar essa situação, mesmo que seja transitória. Vem agora com arremedos de virgem ofendida justificar a derrota nas autárquicas com campanhas organizadas contra a sua pessoa e respectiva família no tenebroso mundo mediático. Ninguém se acredita que o filósofo seja tão inocente e tão canhestro ao mesmo tempo que não tenha ainda percebido que jogando com as mesmas armas do adversário, se foi derrotado, talvez tenha sido culpa própria.
Não deixa de ser estranho que tenha tido ao seu lado, no tal debate da RTP1, um tipo que em tempos afirmou que vender sabonetes era mais ou menos o mesmo que vender presidentes da República. Ironias do destino neste mundo virtual que, por o ser, não chega a existir para lá de si próprio. Esta historieta toda junta não vale os escarros no balde.
domingo, maio 21, 2006
Frei Bento
Frei Bento Domingues é um daqueles homens que conseguem falar de Religião sem se porem a ditar sentenças directas à cabeça de quem os ouve. Tenho o hábito de ler as suas crónicas semanais, aos Domingos, no Público. É sempre um momento de intensa reflexão que faz hesitar nas minhas posições mais heréticas. Na verdade (ou será na realidade?) raramente discordo com a perspectiva de Bento Domingues. Ele vê a Religião numa perspectiva humanista que muito me diz.
Na realidade (ou será na verdade?) sempre me considerei um Cristão por nascimento e cultura. Os meus problemas começam sempre à porta da igreja. O catolicismo causa-me náuseas profundas e tonturas incontroláveis. Aqui residirá a minha distância em relação a Frei Bento Domingues mas ele decerto me compreenderia caso tivessemos oportunidade de trocar ideias sobre o assunto.
http://www.triplov.com/espirito/frei_bento/
Aqui se podem encontrar alguns textos interessantes. Reflexões sérias e inteligentes. Abominar o catolicismo não me impede de admirar alguns católicos (na verdade admiro muitos).
sábado, maio 20, 2006
Amor com amor se paga
Lá fui ver o filme. Acho que nem é bom nem é mau, é uma coisa assim-assim.
Estará cheio de erros de interpretação da História, também me parece. O autor do livro tem uma imaginação criativa interessante, disso não restam dúvidas. O fundo da "cena" é sem dúvida fortemente anti-católico e de um cristianismo lírico, e depois? Não me parece que isso constitua motivo para tanto alarido.
Acaba por ser um filme um tanto maçador. Mas como não li o livro acredito que também a obra escrita de Dan Brown o seja. Como a espada de D. Afonso Henriques que era, ao que consta, comprida e chata.
Apesar de tudo vê-se. Sem grande emoção, podendo mesmo produzir um ou outro bocejo, chega-se ao fim mais ou menos como se tinha partido.
A preocupação da Igreja Católica parece-me exagerada, por um lado, e justificada, por outro.
Para pessoas como eu, que até andei na catequese quando era criança, há algumas questões que se levantam. Na verdade a intolerância da Igreja foi o primeiro safanão no meu catolicismo tinha eu para aí 12 ou 13 anos e uma reflexão mais atenta pôs-me fora lá para os meus 14.
Desde aí sou um forte crítico do catolicismo que é, na minha óptica (e aqui a minha opinião coincide mais ou menos com a de Dan Brown) um dos maiores logros da História do Ocidente com o objectivo último de oprimir o pensamento livre.
Já para quem não perceba nada de Cristo nem tenha a mínima noção dos conteúdos gerais dos Evangelhos, o Código Da Vinci poderá parecer demasiado real e bem fundamentado. É isso que põe a Igreja aos pinotes!
Os chefes católicos sabem bem que a ignorância é uma fraqueza terrível uma vez que a acarinharam ao longo dos séculos como forma de melhor oprimirem os fracos e ignorantes. Só que agora, num mundo mediatizado mas igualmente inculto e largamente estupidificado, a Igreja não detém o Poder de outrora e não consegue censurar a informação consoante os seus interesses, daí que veja o seu próprio veneno a contaminá-la. Isso incomoda-a e faz com que mostre as garras e os dentes afiados. Mas já não mete medo a ninguém.
Sendo assim, ironia da História, a Igreja Católica, mestra da ilusão e do misticismo, vê um tipo qualquer chamado Dan Brown utilizar as mesmas armas contra ela com larga difusão mediática. Haverá erros e "mentiras" na historieta do Código Da Vinci, não duvido. Tal como nos Evangelhos canónicos e na Doutrina Católica.
Amor com amor se paga.
Aguenta e não bufa!
Estará cheio de erros de interpretação da História, também me parece. O autor do livro tem uma imaginação criativa interessante, disso não restam dúvidas. O fundo da "cena" é sem dúvida fortemente anti-católico e de um cristianismo lírico, e depois? Não me parece que isso constitua motivo para tanto alarido.
Acaba por ser um filme um tanto maçador. Mas como não li o livro acredito que também a obra escrita de Dan Brown o seja. Como a espada de D. Afonso Henriques que era, ao que consta, comprida e chata.
Apesar de tudo vê-se. Sem grande emoção, podendo mesmo produzir um ou outro bocejo, chega-se ao fim mais ou menos como se tinha partido.
A preocupação da Igreja Católica parece-me exagerada, por um lado, e justificada, por outro.
Para pessoas como eu, que até andei na catequese quando era criança, há algumas questões que se levantam. Na verdade a intolerância da Igreja foi o primeiro safanão no meu catolicismo tinha eu para aí 12 ou 13 anos e uma reflexão mais atenta pôs-me fora lá para os meus 14.
Desde aí sou um forte crítico do catolicismo que é, na minha óptica (e aqui a minha opinião coincide mais ou menos com a de Dan Brown) um dos maiores logros da História do Ocidente com o objectivo último de oprimir o pensamento livre.
Já para quem não perceba nada de Cristo nem tenha a mínima noção dos conteúdos gerais dos Evangelhos, o Código Da Vinci poderá parecer demasiado real e bem fundamentado. É isso que põe a Igreja aos pinotes!
Os chefes católicos sabem bem que a ignorância é uma fraqueza terrível uma vez que a acarinharam ao longo dos séculos como forma de melhor oprimirem os fracos e ignorantes. Só que agora, num mundo mediatizado mas igualmente inculto e largamente estupidificado, a Igreja não detém o Poder de outrora e não consegue censurar a informação consoante os seus interesses, daí que veja o seu próprio veneno a contaminá-la. Isso incomoda-a e faz com que mostre as garras e os dentes afiados. Mas já não mete medo a ninguém.
Sendo assim, ironia da História, a Igreja Católica, mestra da ilusão e do misticismo, vê um tipo qualquer chamado Dan Brown utilizar as mesmas armas contra ela com larga difusão mediática. Haverá erros e "mentiras" na historieta do Código Da Vinci, não duvido. Tal como nos Evangelhos canónicos e na Doutrina Católica.
Amor com amor se paga.
Aguenta e não bufa!
quinta-feira, maio 18, 2006
Teologia de trazer por casa
Há uma coisa que de vez em quando me vem fazer cócegas no cérebro. É a distinção entre Verdade e Realidade. Enquanto a questão foi como algo que dormia no meu regaço, sem que me apercebesse da sua existência, nada! Estava lá mas eu não sabia, logo, como diz o povo, "olhos que não vêem, coração que não sente" ( O povo diz isto, não diz? Pelo menos acho que dizem que diz!)
Mas um belo dia, ia eu ao cinema com a família ver Big Fish, o filme de Tim Burton e a questão surgiu de um local improvável: da boca da minha filha. Na altura teria ela uns 10 anos, não sei bem, e estávamos a recordar os filmes de Burton que já haviamos visto. Eduardo Mãos-de-tesoura, Marte Ataca, Pee Wee Big Adventure, A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, Ed Wood... aí a mãe perguntou que filme era esse, Ed Wood? A miúda explicou que se tratava da história de um realizador de cinema que era um tipo estranho. E estranho porquê? Estranho como? Estranho porque não percebia a diferença entre verdade e realidade. Póinnn, ficámos de olhos arregalados a pensar no assunto que, para a criança, era de uma limpidez absoluta.
Lá fomos ver o Big Fish (ainda recentemente revimos o filme) e, desde aí, a pergunta visita-me de vez em quando.
Vem isto a propósito da questão em redor da estreia nos cinemas de O Código da Vinci e da agitação que vem causando entre católicos apostólicos romanos. Insurgem-se por considerarem que o filme divulga "mentiras" sobre a figura de Jesus. Andará tudo à volta da suposição veiculada na obra de Brown de que Jesus teria constituído família com Maria Madalena. Sacrilégio! Blasfémia! Para os guardiões da Fé católica isto não passa de uma fantasia.
Tudo bem, estão no seu direito.
Convenhamos que a dita Fé se baseia em pouco mais que suposições e enormes doses de imaginação perdida nas brumas do tempo. Evangelhos adoptados e por adoptar. Traduções manhosas de textos supostamente sagrados. Anjos a ditarem textos a evangelistas semi-analfabetos... fantasias!
A religião não se baseia em factos, se assim fosse dispensava-se a Fé. A religião baseia-se em crenças. Acredita-se na existência de Deus e, a partir dessa crença fundamental, tudo é possível. Dá até para acreditar que a mulher foi criada a partir de uma costela do primeiro homem. É um pormenor abstruso. Porquê de uma costela? Deus não tinha melhor matéria prima à mão de semear? E por aí fora.
Ora é por esta altura que regressa a questão da Verdade e da Realidade.
Pensando bem são coisas completamente distintas.
Deus, por exemplo. Pode muito bem existir na Verdade e andar muito longe de existir na Realidade. E vice-versa.
Pode ou não pode?
Mas um belo dia, ia eu ao cinema com a família ver Big Fish, o filme de Tim Burton e a questão surgiu de um local improvável: da boca da minha filha. Na altura teria ela uns 10 anos, não sei bem, e estávamos a recordar os filmes de Burton que já haviamos visto. Eduardo Mãos-de-tesoura, Marte Ataca, Pee Wee Big Adventure, A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, Ed Wood... aí a mãe perguntou que filme era esse, Ed Wood? A miúda explicou que se tratava da história de um realizador de cinema que era um tipo estranho. E estranho porquê? Estranho como? Estranho porque não percebia a diferença entre verdade e realidade. Póinnn, ficámos de olhos arregalados a pensar no assunto que, para a criança, era de uma limpidez absoluta.
Lá fomos ver o Big Fish (ainda recentemente revimos o filme) e, desde aí, a pergunta visita-me de vez em quando.
Vem isto a propósito da questão em redor da estreia nos cinemas de O Código da Vinci e da agitação que vem causando entre católicos apostólicos romanos. Insurgem-se por considerarem que o filme divulga "mentiras" sobre a figura de Jesus. Andará tudo à volta da suposição veiculada na obra de Brown de que Jesus teria constituído família com Maria Madalena. Sacrilégio! Blasfémia! Para os guardiões da Fé católica isto não passa de uma fantasia.
Tudo bem, estão no seu direito.
Convenhamos que a dita Fé se baseia em pouco mais que suposições e enormes doses de imaginação perdida nas brumas do tempo. Evangelhos adoptados e por adoptar. Traduções manhosas de textos supostamente sagrados. Anjos a ditarem textos a evangelistas semi-analfabetos... fantasias!
A religião não se baseia em factos, se assim fosse dispensava-se a Fé. A religião baseia-se em crenças. Acredita-se na existência de Deus e, a partir dessa crença fundamental, tudo é possível. Dá até para acreditar que a mulher foi criada a partir de uma costela do primeiro homem. É um pormenor abstruso. Porquê de uma costela? Deus não tinha melhor matéria prima à mão de semear? E por aí fora.
Ora é por esta altura que regressa a questão da Verdade e da Realidade.
Pensando bem são coisas completamente distintas.
Deus, por exemplo. Pode muito bem existir na Verdade e andar muito longe de existir na Realidade. E vice-versa.
Pode ou não pode?
quarta-feira, maio 17, 2006
Tá calado!
Há dias em que nada parece valer a pena e um gajo dá por si a perguntar: será que posso recomeçar e ser tudo o que nunca fui outra vez?
Se um gajo fizer uma pergunta destas a si próprio o mais certo é não ouvir a resposta o que não faz mal nenhum.
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quotidiano delirante
domingo, maio 14, 2006
Uma visão mística
O Dinheiro é o nosso Deus e a Economia a religião que dá consistência à doutrina e sustenta o Templo.
Os grandes sacerdotes vivem na sombra de inimagináveis palácios. Nós, os simples, podemos apenas ver a carne (o osso está escondido bem fundo em camadas sucessivas das mais variadas gorduras) de pequenos fantoches que dão a face e escondem os mestres. Economistas de trazer por casa, banqueiros de opereta e demais personagens, enforcados em gravatas de sêda, não passam de esbirros e serviçais que engordam em banquetes de migalhas que os verdadeiros (grandes) sacerdotes sacodem da altura das suas mesas, quando são atacados de flatulência e fastio. Estes pequenotes mal conhecem a superfície dos Mistérios da Economia Real.
Nós, os basbaques que com suor e trabalho, contribuimos para o sustento do Templo, somos forçados a acreditar na bondade das intenções dos que ditam o futuro e nos aterrorizam com o apocalipse do Défice e da bancarrota. Os Grandes Sacerdotes profetizam, baseando as suas visões em gráficos complexos e orçamentos equilibrados na leitura de números implacáveis.
Somos levados a crer que vivemos no melhor dos mundos possíveis, tal como Cândido cada um de nós tem o seu Pangloss e não consegue vislumbrar outro modo de existir que não seja aquele que nos é imposto. Afinal de contas não somos capazes de mudar o Mundo! Ou somos?
sábado, maio 13, 2006
Ferramenta no armário
A igreja católica vai andar outra vez nas conversas de ocasião. A próxima estreia do Código Da Vinci nos cinemas por esse mundo fora já está a agitar os católicos mais fundamentalistas. A fúria divina desses guardiões do templo é uma óptima publicidade para o filme. Nada melhor que uma boa polémica para fazer disparar as audiências.
O filme até pode não ser nada de especial mas o cheirinho a escândalo promete encher as salas.
Convenhamos que em matéria de escandaleira os chefes da igreja não são lá muito versáteis sempre que tentam deitar alguma água na fervura. Com os casos de abusos sexuais sobre crianças a fazerem muito mal à imagem da padralhada resolveram agir declarando que os homossexuais seriam denunciados e postos a andar de malas aviadas em direcção ao inferno.
Com esta atitude mostraram, mais uma vez, que não compreendem o mundo que os rodeia. Por um lado associaram estúpidamente abuso sexual de menores com homossexualidade, por outro vieram confundir as almas das ovelhinhas mais simples.
Então os padres não fazem voto de castidade? Se juram ao Eterno que não darão uso à ferramenta qual é a diferença de serem homo ou hetero? É para rir.
Idolatria?
Esta cena da Nossa Senhora de Fátima é um caso sério. Raras vezes uma boneca levou tanta gente à loucura. Talvez só mesmo a Barbie consiga atingir semelhantes índices de popularidade mas não consta que haja criancinhas dispostas a rastejar ou andar centenas de metros de joelhos em sinal de devoção à sua boneca preferida.
O terceiro "F" da portugalidade tem hoje o seu dia. Brevemente teremos a final da Taça de Portugal em futebol. Não sei quando, lá virá a grande noite do fado.
A imagem da Virgem é uma pedra no sapato da religião católica? Talvez, já que configura uma situação de idolatria pura e dura. Lembremos a recente procissão pelas ruas de Lisboa com milhares de pessoas a encomendarem-se... à bonequinha. O Povo é mais dado a compreender o papel da santa do que questões teológicas complicadas. À Senhora pedem-se favores, umas cunhas nas mais variadas situações e, como não se lhe pode oferecer um presuntinho ou um garrafão de azeite, vai de esfolar os joelhos em sinal de gratidão.
Pois, talvez esteja a ser demasiado cruel para com a Fé do meu Povo. Talvez precise de ir até ao santuário de Fátima e sentir a força da credulidade da multidão para ganhar alguma humildade que me falte. Talvez... mas não me parece que adiante grande coisa. Não sou gajo de acreditar em milagres ou em aparições sobrenaturais.
Mas lá diz o dito "não acredito em bruxas mas que as há, há!". Talvez haja. Talvez...
O terceiro "F" da portugalidade tem hoje o seu dia. Brevemente teremos a final da Taça de Portugal em futebol. Não sei quando, lá virá a grande noite do fado.
A imagem da Virgem é uma pedra no sapato da religião católica? Talvez, já que configura uma situação de idolatria pura e dura. Lembremos a recente procissão pelas ruas de Lisboa com milhares de pessoas a encomendarem-se... à bonequinha. O Povo é mais dado a compreender o papel da santa do que questões teológicas complicadas. À Senhora pedem-se favores, umas cunhas nas mais variadas situações e, como não se lhe pode oferecer um presuntinho ou um garrafão de azeite, vai de esfolar os joelhos em sinal de gratidão.
Pois, talvez esteja a ser demasiado cruel para com a Fé do meu Povo. Talvez precise de ir até ao santuário de Fátima e sentir a força da credulidade da multidão para ganhar alguma humildade que me falte. Talvez... mas não me parece que adiante grande coisa. Não sou gajo de acreditar em milagres ou em aparições sobrenaturais.
Mas lá diz o dito "não acredito em bruxas mas que as há, há!". Talvez haja. Talvez...
sexta-feira, maio 12, 2006
Iupiii!!!
Portugal é um país de mendigos. Os pobres mendigam nas ruas, os remediados mendigam pelos corredores do poder e os ricos mendigam ao grandes do capital, normalmente estrangeiros. Ninguém está satisfeito com aquilo que tem. Uns com mais razão outros com menos, anda tudo a reclamar da sorte e a dizer mal de um Deus que parece ter esquecido todos os sacrifícios feitos em Seu nome por gerações sucessivas de portugueses. Nem com a queima de judeus lá fomos, nem o ouro do Brasil nos bastou. Toda a riqueza que entrou, saiu a toque de caixa pelo outro buraco, no fundo da caixa.
Parece que nunca fomos capazes de perceber como devíamos investir a riqueza que nos ia chegando à praia. Tratando sempre de a estoirar logo ali em nome do prazer, de Deus e do momento. Uns cromos!
Assim começou a célebre "crise" de que tanto se fala. É difícil situá-la no tempo. Parece existir desde sempre, embora continuemos a ouvir falar dela como se houvesse algo antes e alguém acredite que possa haver algo depois. A "crise" instalou-se e deprime os portugueses. Como não sabemos bem quando nasceu o bicho estamos deprimidos desde sempre, a cantar fado e a empolgar-nos com o mal dos outros já que o nosso bem parece ser coisa impossível de alcançar.
Dançamos sempre o mesmo passo de dança, sem tirarmos as patas do mesmo sítio, a rodopiar no vazio do destino que, acreditamos fatalmente, já está há muito traçado nos livros arrumados nas estantes do Paraíso. E que destino é esse?
O destino dos portugueses é a mendicância, a depedência da caridade alheia, a pobreza eterna. Quanto mais não seja a pobreza de espírito.
Iupiiii, assim não temos de trabalhar! Do mal o menos.
Parece que nunca fomos capazes de perceber como devíamos investir a riqueza que nos ia chegando à praia. Tratando sempre de a estoirar logo ali em nome do prazer, de Deus e do momento. Uns cromos!
Assim começou a célebre "crise" de que tanto se fala. É difícil situá-la no tempo. Parece existir desde sempre, embora continuemos a ouvir falar dela como se houvesse algo antes e alguém acredite que possa haver algo depois. A "crise" instalou-se e deprime os portugueses. Como não sabemos bem quando nasceu o bicho estamos deprimidos desde sempre, a cantar fado e a empolgar-nos com o mal dos outros já que o nosso bem parece ser coisa impossível de alcançar.
Dançamos sempre o mesmo passo de dança, sem tirarmos as patas do mesmo sítio, a rodopiar no vazio do destino que, acreditamos fatalmente, já está há muito traçado nos livros arrumados nas estantes do Paraíso. E que destino é esse?
O destino dos portugueses é a mendicância, a depedência da caridade alheia, a pobreza eterna. Quanto mais não seja a pobreza de espírito.
Iupiiii, assim não temos de trabalhar! Do mal o menos.
quarta-feira, maio 10, 2006
Anjos
"Dizem-me que Vossa Excelência segue os ensinamentos de Jesus e acredita na promessa divina do reinado dos justos. O regresso à palavra divina dos profetas é o único caminho para a salvação. Aceitará este convite?" Segundo o Público, esta é uma passagem da carta enviada por Mhamoud Ahmadinejad, presidente da república Islâmica do Irão, ao seu inimigo figadal George W. Bush.
O que terá passado pelo cérebro de Bush ao deparar com estas palavras tão amenas? Haverá realmente um caminho para a salvação? E o que quer salvar o iraniano? A sua alma, as nossas almas, apenas as almas dos adeptos do Islão? A coisa é grave.
A religião tenta regressar ao lugar do piloto que conduz os destinos do mundo. Seja pela mãozinha marota da Opus Dei ou pela beiça melada de Ahmadinejad, o canto da sereia volta a ecoar pelos 4 cantos do planeta a prometer a salvação, o paraíso e mais que se deseje que a coisa também se faz por encomenda.
O problema é que (Ahmadinejad também refere isso na sua carta) aquilo que designamos por Democracias Liberais, com toda a sua lógica depositada na livre concorrência, essa face luminosa do capitalismo selvagem, têm vindo a desiludir em todo o lado por não resolverem os problemas sociais que vão gerando e ampliando por esse mundo fora.
A exportação forçada do "nosso" modelo político e social tem gerado as maiores abortices materializadas em regimes muito baços e pouco recomendáveis. Os problemas reproduzem-se e não se vislumbra quem tenha vontade de encontrar verdadeiros antídotos para os diferentes venenos que vão atirando o Ocidente para o cantinho do descrédito. O Humanismo é cada vez mais difícil de explicar aos putos, nas aulas de História. Não percebem do que se está a falar.
A via religiosa lá vem, regressando do fundo dos tempos, uma perninha já fora da zona de sombra, a mostrar vigor e força para andar. Adivinha-se o monstro que lá vem, mas estamos demasiado ocupados a discutir se Deus é o Dolar ou se poderemos considerá-lo deposto pelo Euro, essa jovem divindade ascendente.
Quando dermos por ela, regressam os velhos deuses que, como sempre fizeram, se alimentam dos que presentemente adoramos.
E se são gulosos!
Tá bonito, tá!
O que terá passado pelo cérebro de Bush ao deparar com estas palavras tão amenas? Haverá realmente um caminho para a salvação? E o que quer salvar o iraniano? A sua alma, as nossas almas, apenas as almas dos adeptos do Islão? A coisa é grave.
A religião tenta regressar ao lugar do piloto que conduz os destinos do mundo. Seja pela mãozinha marota da Opus Dei ou pela beiça melada de Ahmadinejad, o canto da sereia volta a ecoar pelos 4 cantos do planeta a prometer a salvação, o paraíso e mais que se deseje que a coisa também se faz por encomenda.
O problema é que (Ahmadinejad também refere isso na sua carta) aquilo que designamos por Democracias Liberais, com toda a sua lógica depositada na livre concorrência, essa face luminosa do capitalismo selvagem, têm vindo a desiludir em todo o lado por não resolverem os problemas sociais que vão gerando e ampliando por esse mundo fora.
A exportação forçada do "nosso" modelo político e social tem gerado as maiores abortices materializadas em regimes muito baços e pouco recomendáveis. Os problemas reproduzem-se e não se vislumbra quem tenha vontade de encontrar verdadeiros antídotos para os diferentes venenos que vão atirando o Ocidente para o cantinho do descrédito. O Humanismo é cada vez mais difícil de explicar aos putos, nas aulas de História. Não percebem do que se está a falar.
A via religiosa lá vem, regressando do fundo dos tempos, uma perninha já fora da zona de sombra, a mostrar vigor e força para andar. Adivinha-se o monstro que lá vem, mas estamos demasiado ocupados a discutir se Deus é o Dolar ou se poderemos considerá-lo deposto pelo Euro, essa jovem divindade ascendente.
Quando dermos por ela, regressam os velhos deuses que, como sempre fizeram, se alimentam dos que presentemente adoramos.
E se são gulosos!
Tá bonito, tá!
domingo, maio 07, 2006
Riquexó
Lá se cumpriu mais um congresso partidário e bem patusco, por sinal. O líder queria saber quem era por ele e se havia muitos contra ele. Ficou mais ou menos informado e nem por isso aliviado.
Surpresa? João Almeida surge como uma força dentro do PP o que só poderá surpreender quem pensar que aquilo é um partido para levar a sério.
Vi o jovem Almeida a discursar. Foi só um bocadinho mas deu para perceber que o discurso dele é tão vazio como os bolsos de um desempregado de longa duração. Apesar do aspecto enérgico e do dramatismo que empresta a si próprio, percebe-se com facilidade que por ali não passa nada.
Ouvi-o, no tal pedacito de discurso, reclamar que o PP necessita de se afirmar, mostrar aquilo que o distingue do PSD e blá, blá, bló. Ora, era isso mesmo que eu gostava de ver; o PP apresentar-se sem o amparo do PSD a umas eleições legislativas. Duvido que a ideia entusiasme muito personagens como Nuno Melo ou Telmo Correia. Mesmo Pires de Lima, apesar de todo o sex appeal que o caracteriza, deve perceber que, na melhor das hipóteses, o grupo parlamentar voltaria a caber inteirinho num táxi.
Eu, que não gosto deles e acho que sou apenas um entre milhões, arriscaria mesmo que poderiam alugar um riquexó para se deslocarem até à Assembleia. Enquanto um puxasse o outro ia estudando a papelada. Na melhor das hipóteses.
Em trânsito
Quem se lembra de Fernando Gomes, o ex-presidente da Câmara Municpal do Porto? Aquele tipo, com um penteado especial, que chegou a Ministro da Administração Interna num governo PS e desceu até Lisboa para governar.
Lembram-se como, enquanto ele foi ministro, o nosso país resvalou para um clima assustador de insegurança, trazido na crista da onda de um maremoto mediático que deixou a nação portuguesa submersa em medo e pânico?
No entanto, tanto quanto me é possível recordar, fora das páginas dos jornais e dos estúdios de televisão, Portugal estava mais ou menos na mesma, como a lesma.
Fernando Gomes, com a sua figura impossível, a pose hirta e o discurso canhestro, não foi capaz de se aguentar à bronca e saiu borda fora, cuspido num safanão mais violento, de volta às tripas à moda do Porto, de onde nunca devia ter saído. Foi aquilo que se pode chamar um assassinato político perpetrado na imprensa.
Freitas do Amaral tem andado a ser espicaçado nessas mesmas páginas. Nos últimos tempos o homem não pode dar um peidinho que ganha logo proporções de diarreia! Convenhamos que o actual Ministro dos Negócios Estrangeiros tem dado todas as possibilidades aos que lhe andam a fazer a cama que lha façam com lençóis de serapilheira e almofada cravejada de alfinetes.
Primeiro foi aquela treta desajeitada sobre os cartoons (quem se lembra da "crise" dos cartoons?). O MNE meteu os pés pelas mãos e acabou a dar o dito por não dito. Uma confusão.
Depois entendeu por bem meter-se noutra trapalhada por causa dos emigrantes expulsos do Canadá, cometendo algumas gaffes dignas de um principiante borbulhento.
Agora é o Expresso que utiliza abusivamente algumas declarações do ministro para dar a impressão de que ele está à espera de ser atirado borda fora ou até de saltar por iniciativa própria, com o comboio em andamento. Convenhamos que o homem insiste em ir à floresta buscar lenha para se queimar com a inocência de um Capuchinho Vermelho.
Confesso que Freitas não é figura das minhas simpatias. Nunca foi e, como em política sou muito rancoroso e abuso da memória sempre que posso, nunca será. Mas uma campanha mediática destas dimensões entra pelos olhos dentro do mais cego dos cidadãos.
Como realça Mário Mesquita no Público de hoje, Freitas deslocou-se no sentido errado. Vem da Direita para a Esquerda e cruza-se com Sócrates, a deslocar-se no sentido inverso. Os pequenos monstros que deixou pelo caminho e que agora se amontoam como larvas em cima de um cadáver naquela espécie de partido que se chama CDS-PP, não lhe perdoam a "deserção" e andam em cima dele como autênticas carraças.
Não digo que é bem feito, mas não me comove particularmente. No entanto mete um bocado de nojo ver o que estão a fazer ao "camarada" Freitas esventrando toda e qualquer afirmação que produza em público com uma elegância digna de um talhante.
Mário Soares disse um dia que "Só os burros não mudam de opinião." Lamento dizer-lhe, caro Mário, que isso era dantes, no seu tempo. Agora as coisas não são bem assim, nem são antes pelo contrário. São aquilo que quem detém o poder de titular jornais quiser que sejam.
Sim, porque se um gajo ler mais do que o título de uma entrevista talvez perceba o que quer o entrevistado dizer.
Lembram-se como, enquanto ele foi ministro, o nosso país resvalou para um clima assustador de insegurança, trazido na crista da onda de um maremoto mediático que deixou a nação portuguesa submersa em medo e pânico?
No entanto, tanto quanto me é possível recordar, fora das páginas dos jornais e dos estúdios de televisão, Portugal estava mais ou menos na mesma, como a lesma.
Fernando Gomes, com a sua figura impossível, a pose hirta e o discurso canhestro, não foi capaz de se aguentar à bronca e saiu borda fora, cuspido num safanão mais violento, de volta às tripas à moda do Porto, de onde nunca devia ter saído. Foi aquilo que se pode chamar um assassinato político perpetrado na imprensa.
Freitas do Amaral tem andado a ser espicaçado nessas mesmas páginas. Nos últimos tempos o homem não pode dar um peidinho que ganha logo proporções de diarreia! Convenhamos que o actual Ministro dos Negócios Estrangeiros tem dado todas as possibilidades aos que lhe andam a fazer a cama que lha façam com lençóis de serapilheira e almofada cravejada de alfinetes.
Primeiro foi aquela treta desajeitada sobre os cartoons (quem se lembra da "crise" dos cartoons?). O MNE meteu os pés pelas mãos e acabou a dar o dito por não dito. Uma confusão.
Depois entendeu por bem meter-se noutra trapalhada por causa dos emigrantes expulsos do Canadá, cometendo algumas gaffes dignas de um principiante borbulhento.
Agora é o Expresso que utiliza abusivamente algumas declarações do ministro para dar a impressão de que ele está à espera de ser atirado borda fora ou até de saltar por iniciativa própria, com o comboio em andamento. Convenhamos que o homem insiste em ir à floresta buscar lenha para se queimar com a inocência de um Capuchinho Vermelho.
Confesso que Freitas não é figura das minhas simpatias. Nunca foi e, como em política sou muito rancoroso e abuso da memória sempre que posso, nunca será. Mas uma campanha mediática destas dimensões entra pelos olhos dentro do mais cego dos cidadãos.
Como realça Mário Mesquita no Público de hoje, Freitas deslocou-se no sentido errado. Vem da Direita para a Esquerda e cruza-se com Sócrates, a deslocar-se no sentido inverso. Os pequenos monstros que deixou pelo caminho e que agora se amontoam como larvas em cima de um cadáver naquela espécie de partido que se chama CDS-PP, não lhe perdoam a "deserção" e andam em cima dele como autênticas carraças.
Não digo que é bem feito, mas não me comove particularmente. No entanto mete um bocado de nojo ver o que estão a fazer ao "camarada" Freitas esventrando toda e qualquer afirmação que produza em público com uma elegância digna de um talhante.
Mário Soares disse um dia que "Só os burros não mudam de opinião." Lamento dizer-lhe, caro Mário, que isso era dantes, no seu tempo. Agora as coisas não são bem assim, nem são antes pelo contrário. São aquilo que quem detém o poder de titular jornais quiser que sejam.
Sim, porque se um gajo ler mais do que o título de uma entrevista talvez perceba o que quer o entrevistado dizer.
sábado, maio 06, 2006
Trabalho infantil
É uma coisa que me faz alguma confusão. Como decidem os legisladores sobre os limites do trabalho infantil?
Se um puto anda a acartar baldes de massa nas obras ou a cozer sapatilhas numa fábrica clandestina é caso de polícia. Se anda a decorar páginas de diálogos imbecis e a filmar 12 horas por dia a lei deixa passar e o juíz ainda assiste à novela das sete enquanto descansa os pézinhos.
Nas passerelles e nos plâteaus as crianças não trabalham? Se calhar estão ali por divertimento. Qual será o critério? Quer-me parecer que é uma questão de classe. Classe social, é bom de ver. Os filhos das classes médias não se dedicam a criar calos nas mãos, criam-nos mais facilmente no cérebro. Já os filhos das classes mais baixas dão o corpo ao manifesto de outra maneira e isso não pode ser. A lei condena e a boa consciência social aplaude.
O problema é bicudo e não me quero meter nele mais do que um bocadinho. Olhando para o marmanjito na foto podemos reparar que tem um sorriso bem construído e se estivesse a cozer bolas de futebol para o campeonato do mundo dificilmente ostentaria uma alegria como a que parece transpirar nesta imagem.
Outro aspecto que distingue os trabalhadores infantis é o dinheiro que ganham com o trabalho que realizam. Mas isso não se passa, também, com os adultos? Se um tipo trabalho muito e ganha pouco é um quase-escravo. Se trabalha muito e ganha muito é um quase-patrão.
Depois há a questão da exposição pública. Um puto que esfole a mioleira a telenovelar tem, ainda, o "benefício" de ser reconhecido na rua e pode (glória das glórias) dar uns autógrafos a fãs de guardanapo de papel em punho. Um pobre operáriozinho, na melhor das hipóteses, poderá sentir uma pontinha de felicidade por contribuir com uns cêntimos para mitigar a penúria lá na barraca.
A objectividade e a imparcialidade na análise destas situações não são o nosso forte. Pois não?
Se um puto anda a acartar baldes de massa nas obras ou a cozer sapatilhas numa fábrica clandestina é caso de polícia. Se anda a decorar páginas de diálogos imbecis e a filmar 12 horas por dia a lei deixa passar e o juíz ainda assiste à novela das sete enquanto descansa os pézinhos.
Nas passerelles e nos plâteaus as crianças não trabalham? Se calhar estão ali por divertimento. Qual será o critério? Quer-me parecer que é uma questão de classe. Classe social, é bom de ver. Os filhos das classes médias não se dedicam a criar calos nas mãos, criam-nos mais facilmente no cérebro. Já os filhos das classes mais baixas dão o corpo ao manifesto de outra maneira e isso não pode ser. A lei condena e a boa consciência social aplaude.
O problema é bicudo e não me quero meter nele mais do que um bocadinho. Olhando para o marmanjito na foto podemos reparar que tem um sorriso bem construído e se estivesse a cozer bolas de futebol para o campeonato do mundo dificilmente ostentaria uma alegria como a que parece transpirar nesta imagem.
Outro aspecto que distingue os trabalhadores infantis é o dinheiro que ganham com o trabalho que realizam. Mas isso não se passa, também, com os adultos? Se um tipo trabalho muito e ganha pouco é um quase-escravo. Se trabalha muito e ganha muito é um quase-patrão.
Depois há a questão da exposição pública. Um puto que esfole a mioleira a telenovelar tem, ainda, o "benefício" de ser reconhecido na rua e pode (glória das glórias) dar uns autógrafos a fãs de guardanapo de papel em punho. Um pobre operáriozinho, na melhor das hipóteses, poderá sentir uma pontinha de felicidade por contribuir com uns cêntimos para mitigar a penúria lá na barraca.
A objectividade e a imparcialidade na análise destas situações não são o nosso forte. Pois não?
New World
sexta-feira, maio 05, 2006
Ready-mades
Foi Marcel Duchamp quem introduziu o conceito. Recolhe-se um objecto, retira-se do contexto que lhe reconhecemos como "habitual" e recontextualiza-se num novo ambiente. De imediato as leituras possíveis do objecto ganham novos contornos e dimensões. O mais célebre ready-made da História da Arte será o urinol que Duchamp assinou e intitulou "A Fonte" considerada, no ano de 2005, como a obra de arte mais significativa da Arte Contemporânea.
Na imagem acima podemos ver o interior do Museu Britânico. Os visitantes admiram os despojos de um frontão grego ali exposto. Adivinha-se o formato triangular do conjunto. Originalmente foi um conjunto escultórico criado para um templo.
O que faz aquilo ali, ao nível dos olhos, sem o peristilo nem o friso, cortado às postas, com papelinhos por baixo que saltam à vista como gritinhos estridentes? Onde está a cor que outrora revestiu aquelas formas, a pujança visual da arte grega que apenas podemos adivinhar? Não será aquele objecto um ready-made?
Os responsáveis pela exposição dos objectos nos museus não serão considerados artistas mas isso parece-me uma tremenda injustiça. São artistas, sim senhor, Dadaístas na esmagadora maioria.
Arriscaria a opinião de que todos os museus são imensas (por vezes insuportáveis) manifestações dadaístas. Raros serão os objectos que expõem que tenham sido criados especificamente para lá serem colocados.
Uma sala de museu é uma colecção de ready-mades!
Já a casa-de-banho dos homens não poderá ser considerada uma instalação, com todos aqueles urinóis alinhados na parede, mas anda lá perto. Ainda por cima existe interacção permanente com os visitantes que lhes mijam para dentro. Magnífico!
Na imagem acima podemos ver o interior do Museu Britânico. Os visitantes admiram os despojos de um frontão grego ali exposto. Adivinha-se o formato triangular do conjunto. Originalmente foi um conjunto escultórico criado para um templo.
O que faz aquilo ali, ao nível dos olhos, sem o peristilo nem o friso, cortado às postas, com papelinhos por baixo que saltam à vista como gritinhos estridentes? Onde está a cor que outrora revestiu aquelas formas, a pujança visual da arte grega que apenas podemos adivinhar? Não será aquele objecto um ready-made?
Os responsáveis pela exposição dos objectos nos museus não serão considerados artistas mas isso parece-me uma tremenda injustiça. São artistas, sim senhor, Dadaístas na esmagadora maioria.
Arriscaria a opinião de que todos os museus são imensas (por vezes insuportáveis) manifestações dadaístas. Raros serão os objectos que expõem que tenham sido criados especificamente para lá serem colocados.
Uma sala de museu é uma colecção de ready-mades!
Já a casa-de-banho dos homens não poderá ser considerada uma instalação, com todos aqueles urinóis alinhados na parede, mas anda lá perto. Ainda por cima existe interacção permanente com os visitantes que lhes mijam para dentro. Magnífico!
quarta-feira, maio 03, 2006
Coisa ruim!
Cinderela ao Contrário? Que raio de coisa quererá isto dizer? Que a senhora lavava o chão de algum palácio com a cabeleira, de pés para o ar, quando ainda era tenra e jovem? Que em vez de ter uma abóbora por veículo andou de ratazana naquela noite em que perdeu um sapatinho de látex? A imaginação humana não conhece limites e não paramos de ter provas disso.
A nova obra literária promete revelações arrepiantes como, por exemplo, o 1º beijo desta Cinderela de trazer por casa ou ainda a fase difícil que atravessou após o divórcio. Sim, divórcio! Pois se até a rainha de Inglaterra arranjou um gajo que casasse com ela porque raio não haveria esta princesinha de conseguir o mesmo feito extraordinário?
Humor de pacotilha à parte, a coisa promete! Se provas faltassem sobre a dimensão do bom gosto desta senhora e dos amigos, bastaria olhar a imagem acima com olhos inocentes, sem maldade nem nada. Que coisa ruim! Que esgar arrepiante nos é oferecido sob aqueles olhos demoníacos, numa malévola imitação de um sorriso.
Meu Deus.
P.S. Oferece-se o convite que serviu de modelo à imagem deste post a quem provar ter estômago para se deslocar ao Centro Cultural de Cascais no próximo dia 11 pelas 18 horas.
Como é diferente a cultura para os lados de Cascais, caraças!
A nova obra literária promete revelações arrepiantes como, por exemplo, o 1º beijo desta Cinderela de trazer por casa ou ainda a fase difícil que atravessou após o divórcio. Sim, divórcio! Pois se até a rainha de Inglaterra arranjou um gajo que casasse com ela porque raio não haveria esta princesinha de conseguir o mesmo feito extraordinário?
Humor de pacotilha à parte, a coisa promete! Se provas faltassem sobre a dimensão do bom gosto desta senhora e dos amigos, bastaria olhar a imagem acima com olhos inocentes, sem maldade nem nada. Que coisa ruim! Que esgar arrepiante nos é oferecido sob aqueles olhos demoníacos, numa malévola imitação de um sorriso.
Meu Deus.
P.S. Oferece-se o convite que serviu de modelo à imagem deste post a quem provar ter estômago para se deslocar ao Centro Cultural de Cascais no próximo dia 11 pelas 18 horas.
Como é diferente a cultura para os lados de Cascais, caraças!
Daumier
Quando abro o Google e busco imagens de Daumier tenho um longo e agradável passeio garantido.
segunda-feira, maio 01, 2006
Pergunta ao espelho
De súbito saltou-me uma pergunta dentro da cabeça: os putos deixaram de ser curiosos ou estarão, simplesmente, viciados? Eu explico (se for capaz). Porque razão a Escola é, cada vez mais, uma seca das antigas? Serão os assuntos abordados desinteressantes? O problema estará nos processos adoptados, no arcaísmo dos materiais pedagógicos? O que se passa?
Aqui há 3 ou 4 anos atrás, durante uma aula de Geometria Descritiva, um aluno do 10º ano de escolaridade pediu a palavra, interrompendo a explicação de um exercício prático. Apesar de ser inoportuno, deixei-o manifestar-se. Ele disse qualquer coisa como "Não estou a divertir-me nada!" Fiquei estupefacto. Nunca me passara pela cabeça que uma aula de Geometria Descritiva pudesse ser divertida. Interessante, quando muito,mas... divertida!!!???
A Escola deve ser divertida? A vida é divertida? O dia-a-dia é divertido? Haverá espaço para a diversão, mas a variedade de sensações e situações fazem a coisa mais intensa. Ou não?
A imagem que tenho do quotidiano dos putos é estranha. Imagino-os a repetir constantemente os mesmos processos, a consumir repetidamente os mesmos produtos, procurando uma repetição incessante daquilo que lhes dará, garantidamente, prazer. É um processo de viciação! O espaço da experimentação reduz-se e a interrupção dos tais processos, a privação dos tais produtos, o impedimento do prazer provoca a ira ou, pelo menos, a irritação dos catraios. Não há grande espaço para a curiosidade. Para quê experimentar outra coisa se aquela nos proporciona níveis de satisfação garantidos?
A vida nas cidades afasta os putos da rua que se vai tornando um espaço potencialmente perigoso. Fechados em casa, encontram nos écrans janelas sobre horizontes mais vastos que as paredes do quarto. Os jogos de realidade virtual são tremendamente viciantes. A repetição dos gestos, os sons, as imagens eléctricas, têm a potência de uma droga dura e retorcem o cérebro de qualquer criatura. Não vale a pena ir em busca de outra coisa. Aquilo é bom e preenche os espaços necessários. Quando muito poderão (poderemos) procurar algum substituto, outra fonte de prazer. Outro jogo, uma nova consola.
E a Escola? A aprendizagem? Uma seca!
A pergunta dança-me na cabeça: substituimos a curiosidade pela viciação?
Aqui há 3 ou 4 anos atrás, durante uma aula de Geometria Descritiva, um aluno do 10º ano de escolaridade pediu a palavra, interrompendo a explicação de um exercício prático. Apesar de ser inoportuno, deixei-o manifestar-se. Ele disse qualquer coisa como "Não estou a divertir-me nada!" Fiquei estupefacto. Nunca me passara pela cabeça que uma aula de Geometria Descritiva pudesse ser divertida. Interessante, quando muito,mas... divertida!!!???
A Escola deve ser divertida? A vida é divertida? O dia-a-dia é divertido? Haverá espaço para a diversão, mas a variedade de sensações e situações fazem a coisa mais intensa. Ou não?
A imagem que tenho do quotidiano dos putos é estranha. Imagino-os a repetir constantemente os mesmos processos, a consumir repetidamente os mesmos produtos, procurando uma repetição incessante daquilo que lhes dará, garantidamente, prazer. É um processo de viciação! O espaço da experimentação reduz-se e a interrupção dos tais processos, a privação dos tais produtos, o impedimento do prazer provoca a ira ou, pelo menos, a irritação dos catraios. Não há grande espaço para a curiosidade. Para quê experimentar outra coisa se aquela nos proporciona níveis de satisfação garantidos?
A vida nas cidades afasta os putos da rua que se vai tornando um espaço potencialmente perigoso. Fechados em casa, encontram nos écrans janelas sobre horizontes mais vastos que as paredes do quarto. Os jogos de realidade virtual são tremendamente viciantes. A repetição dos gestos, os sons, as imagens eléctricas, têm a potência de uma droga dura e retorcem o cérebro de qualquer criatura. Não vale a pena ir em busca de outra coisa. Aquilo é bom e preenche os espaços necessários. Quando muito poderão (poderemos) procurar algum substituto, outra fonte de prazer. Outro jogo, uma nova consola.
E a Escola? A aprendizagem? Uma seca!
A pergunta dança-me na cabeça: substituimos a curiosidade pela viciação?
1º de Maio
"O 1º de Maio é Vermêlho", ouvia eu dizer, vai para uma catrefa de anos atrás. Era dia de ir à manifestação, reunir um grupo de amigos e ir lá, para a festa. Comiam-se umas bifanas e bebiam-se umas cervejas nem que estivessem mais quentes que frias. Isso não interessava nada porque festa era festa.
Ali via a face do povo. Aquelas caras grotescas como caricaturas de Bordalo Pinheiro ou pinturas de Grão Vasco, iluminavam-se de uma alegria que as tornava belas e todos gritavamos palavras de ordem e deitavamo-nos no relvado da Alameda contentes como putos em dia de Natal.
Os discursos eram todos semelhantes, chatos e longos, mesmo que fossem curtos, mas isso não constituia problema nem arrefecia o entusiasmo. Festa era festa.
Os anos foram passando e o entusiasmo esmoreceu um pouco (ou terá sido muito?). Já não vou à manifestação nem teria pachorra para discursos de sindicalistas nem de outros camaradas desse género. As faces grotescas do povo vejo-as com frequência nas grandes superfícies comerciais, já sem o brilho do festejo primaveril do 1º de Maio, mas com aquele brilhozinho nos olhos que se acende quando somos contaminados pelo vírus consumista.
O povo, o nosso povo, tem mudado como o caraças nestes últimos 30 e poucos anos, desde a Revolução de 1974.
Saído da escuridão mais negra da boçalidade do Estado Novo, pobre, inculto e miserando, no espaço de apenas uma geração, o Bom Povo Português vê-se, de súbito, imerso numa sociedade consumista sem tempo nem maneira de fazer a aprendizagem necessária. Somos o resultado de uma espécie de enxerto social. Ainda o PREC estava longe de satisfazer as mais obscuras promessas de algumas das suas luminárias, já Portugal ensaiava os primeiros passos na direcção da, então, Comunidade Económica Europeia.
Foi como dar um Ferrari a um tipo habituado a conduzir carros de bois. Os filhos dos Agricultores vestiram fatos escuros e aprenderam a fazer nós de gravata até conseguirem confundir-se com os filhos dos Doutores ao ponto de não serem diferenciáveis a olho nú. Aliaram-se a fome e a vontade de comer, numa estranha associação de interesses. Alargou-se a mesa do banquete, redistribuiu-se o processo de distribuir a riqueza e o resultado está à vista.
Portugal é o país rico onde a diferença entre as classes sociais é mais acentuada e onde a indigência é ainda um modo de vida.
Neste 1º de Maio fui ao Seixal passear na marginal que bordeja o Rio Judeu. Centenas de pessoas caminhavam ao sol, para trás e para diante, fazendo exercício. Outros passavam em bicicletas alegremente.
Fui beber um café à Sociedade Filarmónica Democrática Timbre Seixalense. Cá fora, na esplanada, um velho com aspecto de reformado do Fundo de Desemprego comentava em voz alta "Isto parece Biarritz!". O Sol, a baía, a calma de um dia feriado, o povo a passear... Biarritz? Talvez. Apesar de tudo há algo para comemorar.
Ali via a face do povo. Aquelas caras grotescas como caricaturas de Bordalo Pinheiro ou pinturas de Grão Vasco, iluminavam-se de uma alegria que as tornava belas e todos gritavamos palavras de ordem e deitavamo-nos no relvado da Alameda contentes como putos em dia de Natal.
Os discursos eram todos semelhantes, chatos e longos, mesmo que fossem curtos, mas isso não constituia problema nem arrefecia o entusiasmo. Festa era festa.
Os anos foram passando e o entusiasmo esmoreceu um pouco (ou terá sido muito?). Já não vou à manifestação nem teria pachorra para discursos de sindicalistas nem de outros camaradas desse género. As faces grotescas do povo vejo-as com frequência nas grandes superfícies comerciais, já sem o brilho do festejo primaveril do 1º de Maio, mas com aquele brilhozinho nos olhos que se acende quando somos contaminados pelo vírus consumista.
O povo, o nosso povo, tem mudado como o caraças nestes últimos 30 e poucos anos, desde a Revolução de 1974.
Saído da escuridão mais negra da boçalidade do Estado Novo, pobre, inculto e miserando, no espaço de apenas uma geração, o Bom Povo Português vê-se, de súbito, imerso numa sociedade consumista sem tempo nem maneira de fazer a aprendizagem necessária. Somos o resultado de uma espécie de enxerto social. Ainda o PREC estava longe de satisfazer as mais obscuras promessas de algumas das suas luminárias, já Portugal ensaiava os primeiros passos na direcção da, então, Comunidade Económica Europeia.
Foi como dar um Ferrari a um tipo habituado a conduzir carros de bois. Os filhos dos Agricultores vestiram fatos escuros e aprenderam a fazer nós de gravata até conseguirem confundir-se com os filhos dos Doutores ao ponto de não serem diferenciáveis a olho nú. Aliaram-se a fome e a vontade de comer, numa estranha associação de interesses. Alargou-se a mesa do banquete, redistribuiu-se o processo de distribuir a riqueza e o resultado está à vista.
Portugal é o país rico onde a diferença entre as classes sociais é mais acentuada e onde a indigência é ainda um modo de vida.
Neste 1º de Maio fui ao Seixal passear na marginal que bordeja o Rio Judeu. Centenas de pessoas caminhavam ao sol, para trás e para diante, fazendo exercício. Outros passavam em bicicletas alegremente.
Fui beber um café à Sociedade Filarmónica Democrática Timbre Seixalense. Cá fora, na esplanada, um velho com aspecto de reformado do Fundo de Desemprego comentava em voz alta "Isto parece Biarritz!". O Sol, a baía, a calma de um dia feriado, o povo a passear... Biarritz? Talvez. Apesar de tudo há algo para comemorar.
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