terça-feira, novembro 29, 2005
Esforço de merda?
Se o Urinol de Duchamp cria resistências nas almas mais comuns que dizer da obra da Manzoni intituada Merda de Artista? Este caramelo terá embalado a sua própria caca em latinhas como a da imagem ao lado que depois colocou no mercado ao preço da grama de ouro.
A questão reside em aceitarmos ou não a natureza artistica desta merda.
Será necessário, antes do mais, decidir os limites da obra de arte. Desde Duchamp, pelo menos, que essa tarefa se tem revelado, no mínimo, complexa.
Com os ready made o consumo de arte deixou de ser cómodo. Anteriormente o amador sabia perfeitamente o aspecto e os limites permitidos á criação artística. Um quadro, um fresco luminoso, uma estátua no centro da praça recordando feitos heróicos ou o passado histórico. Nada mais fácil! Mas agora... latinhas de merda!?
Os exemplos são mais que muitos. O espectador é frequentemente confrontado com os seus próprios limites perante os mais variados objectos. Cabe-lhe participar, completando a obra de arte.
Convenhamos que pode revelar-se um trabalho de merda para o qual podemos não estar disponíveis, o que é perfeitamente normal.
Consta que Manzoni terá vendido todo o stock de merda embalada pelo preço pedido. Não há notícia (que eu saiba) de que alguém tenha ousado confirmar o conteúdo das latinhas já que isso iria arruinar o seu valor e quebrar-lhe o encanto.
Dá que pensar, não dá?
Então deve ser arte!
segunda-feira, novembro 28, 2005
Questão de contexto
"A Fonte" foi eleita como a mais significativa obra de arte do século passado.
O princípio consiste em retirar um objecto do contexto com o qual nos habituámos a relacioná-lo, dar-lhe um nome diferente e... aí está! Uma obra de arte completamente inesperada.
Mas... será esta atitude assim tão extraordinária?
Quando passeamos a carcaça por entre as paredes de um qualquer museu, Europa adentro, admirando as obras expostas, estaremos tão longe do urinol de Duchamp quanto imaginamos?
O que diria um fabricante de sarcófagos egípcio ao ver a sua obra exposta sem pudor aos olhos de toda a gente?
E Bosch, ao ver a sua obra numa sala do Museu Nacional de Arte Antiga, junto a outras, igualmente retiradas do contexto para o qual foram criadas e ali espetadas para espanto do pessoal e demais papalvos?
Os museus são, na verdade, imensos depósitos dos mais variados readymade cuja principal qualidade é terem o condão de sossegar os visitantes quanto à grandeza do passeio que efectuam.
Tal como a montra do talho expõe o corpo retalhado da vaca, também o Museu expõe pedaços das criações de artistas e quejandos, roubados aos locais de origem, esvaziados de magia e significado, banalizando o acto criativo ao nível da bola de Berlim com um copo de água morna.
Talvez fosse melhor mijar no urinol de Duchamp.
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