terça-feira, maio 22, 2007

E as crianças?


Os números relativos à taxa de cobertura e ocupação de jardins de infância em Portugal mostram bem o fosso que existe entre os ricos, os mais-ou-menos ricos e os pobres, neste campeonato os verdadeiramente pobres nem sequer são chamados.

O Estado continua incapaz de oferecer este serviço essencial à estruturação democrática da sociedade. Os infantários públicos são inacreditavelmente escassos e, para os frequentar, as crianças são inscritas ainda antes de nascerem (muitas delas ainda não são meninos ou meninas). Mesmo assim os encarregados de educação não sabem se terão hipóteses de "arranjar" lugar para o seu rebento. Virá o dia em que o casal, na preparação para o acto sexual, preencherá uma ficha de inscrição para o berçário da zona em que reside, sendo isto considerado um preliminar altamente motivador e excitante.

Claro que há uma rede de infantários privados à qual se pode sempre recorrer em última instância mas os preços praticados são proibitivos para a esmagadora maioria das famílias daquilo a que chamamos classe média baixa, eufemismo que não vou sequer dissecar.

Neste panorama temos então as famílias mais capazes em termos económicos a resolverem o problema educacional dos filhos com relativa facilidade (o dinheiro não é fonte exclusiva de felicidade mas ajuda bastante nalgumas situações) e as outras, a esmagadora maioria, a recorrer à imaginação prodigiosa que, segundo consta, é característica essencial do povo português sempre que se trata de resolver problemas impossíveis. No caso dos jardins de infância este célebre "desenrascanço" nem sempre resulta, ficando muita criança fora do sistema durante demasiado tempo.

Os ricos frequentam escolas privadas até à saída para a Universidade e, nessa altura, finalmente resolvem aceder ao ensino público. Toda a gente sabe que, em Portugal, o Ensino Superior Público é de muito melhor qualidade que o privado. Seria interessante promover um estudo em que se comparassem números relativos à percentagem de alunos que entram no Ensino Superior Público que fizeram todo o seu percurso escolar anterior em instituições privadas. Seria, eventualmente, esclarecedor das enormes desigualdades que a nossa sociedade democrática ajuda a fomentar e se mostra incapaz, sequer, de compreender ou, pelo menos, de encarar de frente. É um paradoxo que as Universidades privadas, mais caras e com propinas mais altas sejam frequentadas por alunos provenientes de camadas sociais menos poderosas(esta afirmação carece de comprovação científica sustentada em sondagens credíveis mas é uma conclusão perfeitamente plausível em termos conceptuais).

A situação do ensino em Portugal continua repleta de incongruências e injustiças visíveis sem que nada seja feito em concreto para a alterar.

Muitas declarações políticas, fogo de vista e frases lindas para cabeçalhos noticiosos, muita demagogia e falsas intenções mas, na verdade, as famílias continuam descalças na tentativa de resolverem o problema de facultarem um ensino razoável aos seus filhos. A coisa cheira ainda pior quando estamos a falar dos mais pequeninos.

É lamentável.

5 comentários:

cartolas disse...

Não consigo ser tão optimista e considerar as creches como soluções educacionais... Parece-me sim, que são os locais existentes para "depopsitar" os filhos enquanto os pais trabalham.

Silvares disse...

À falta de melhores soluções... longe vão os tempos em que diferentes gerações das famílias viviam juntas. Os putos ficavam com os avós até entrarem para a primária. Agora não há essa possibilidade, os infantários são a alternativa... para quem pode. As diferenças sociais e o acesso à educação começam a vincar-se logo aqui, na mais tenra idade.

Anónimo disse...

Democracia? Liberdade? Igualdade social?
Não sei porquê mas isto parece-se cada vez mais com uma ditadura do capital!

Silvares disse...

O capital tanto medra em ditadura como em democracia ou noutro sistema qualquer... o bom e o bonito vai ser quando a sede principal mudar para a China ou para a Índia e o Ocidente ficar agarrado aos tomates!

José Carrancudo disse...

Ao nosso ver, o papel social dos infantários é o de libertar os pais da sua obrigação de cuidar e educar os filhos. Na parte dos cuidados, não temos qualquer objecção, na parte da educação (do ensino ainda não se fala) devemos ter alguma prudência, pois a criança absorve todas as noções sociais fundamentais ainda na idade tenra. Assim, uma falta de convívio com os pais, nessa idade, pode prejudicar o seu desenvolvimento social e a sua assimilação dos valor familiares.

O País está em crise educativa generalizada, resultado das políticas governamentais dos últimos 20 anos, que empreenderam experiências pedagógicas malparadas na nossa Escola. Com efeito, 80% dos nossos alunos abandonam a Escola ou recebem notas negativas nos Exames Nacionais de Português e Matemática. Disto, os culpados são os educadores oficiosos que promoveram políticas educativas desastrosas, e não os alunos e professores. Os problemas da Educação não se prendem com os conteúdos programáticos ou com o desempenho dos professores, mas sim com as bases metódicas cientificamente inválidas.

Ora, devemos olhar para o nosso Ensino na sua íntegra, e não apenas para assuntos pontuais, para podermos perceber o que se passa. Os problemas começam logo no ensino primário, e é por ai que devemos começar a reconstruir a nossa Escola. Recomendamos vivamente a nossa análise, que identifica as principais razões da crise educativa e indica o caminho de saída. Em poucas palavras, é necessário fazer duas coisas: repor o método fonético no ensino de leitura e repor os exercícios de desenvolvimento da memória nos currículos de todas as disciplinas escolares. Resolvidos os problemas metódicos, muitos dos outros, com o tempo, desaparecerão. No seu estado corrente, o Ensino apenas reproduz a Ignorância, numa escala alargada.

Devemos todos exigir uma acção urgente e empenhada do Governo, para salvar o pouco que ainda pode ser salvo.

Sr.(a) Leitor(a), p.f. mande uma cópia ao M.E.
email: gme@me.gov.pt, se.adj-educacao@me.gov.pt, se.educacao@me.gov.pt