terça-feira, novembro 29, 2011

Um português no Brasil

valter hugo mãe na Flip, Festa Literária Internacional de Parity (para ver melhor clicar aqui), no Brasil. este post é dedicado aos meus amigos brasileiros que me visitam aqui, no mundo virtual.

segunda-feira, novembro 28, 2011

Tudo isto é triste, tudo isto é fado!


"Decisão aprovada: O fado já é património mundial." e pronto, está feito. Muita emoção e comoção e lágrimas e violas a trinar pelas vielas, o fado é património imaterial da humanidade. 

Cá pra mim, que não sou tido nem achado nestas coisas de grandiosidade à escala planetária, o fado não precisava deste carimbo na testa nem de credencial assinada para fazer parte do património imaterial mundial, pela simples razão que já dele fazia parte, fosse ou não reconhecido pela UNESCO. A coisa deu-se em Bali, na Indonésia (ler aqui). 

Também da Indonésia nos chega a notícia de que, no espaço de uma ano e meio, foram mortos cerca de 750 orangotangos na ilha de Bornéu (ler aqui). Consta que as motivações dos assassinos destes grandes primatas são a protecção de culturas mas também o consumo de carne. Em situações como esta penso se não me daria melhor com o mundo que me rodeia se fosse vegetariano. Comer um orangotango é quase canibalismo...

Por um lado podemos aliviar um pouco da tristeza que nos tem assaltado: o fado é património mundial com atestado carimbado e assinado por quem decide estas coisas, num sempre apetecível reconhecimento burocrático que só faz falta a quem não acredita em si próprio.

Por outro lado as nuvens carregam-se de cinzento, pois ao orangotango, que é um ser material, não bastam nem servem para nada todos os carimbos que têm sido postos em decretos e planos que visam a sua protecção, numa prova de que a burocracia global só é eficaz em questões de imaterialidades.

Como diz a canção: "Tudo isto é triste, tudo isto é fado!" vertamos umas lágrimas grossas e quentes, é caso disso.




domingo, novembro 27, 2011

Não há acordo numa coisa destas!


Já há uns dias que acabei a leitura de "o remorso de baltazar serapião" livro escrito pelo pulso poderoso de valter hugo mãe (é tudo assim, com letras minúsculas por vontade expressa do autor embora em "O filho de mil homens", a mais recente obra do dito cujo, as maiúsculas, ao que parece, tomem os lugares que lhes são devidos, graças a Deus Nosso Senhor).

Trata-se de um livro que dispensa em absoluto as discussões bizantinas que se vão mantendo a propósito do tão esgadanhado Acordo Ortográfico que por aí vai tentando deitar a cabeça fora das águas turvas onde ainda chafurda em aparente aflição.

Em o "remorso de baltazar serapião" a língua portuguesa é uma outra coisa que, sendo o que é, mais parece o que não pode ser, ou não fosse assim sonhada e melhor registada pelo autor de tão extrordinário relato. Ler este livro é um exercício de puro prazer.

Este livro mostra como a liberdade, na escrita tal qual no resto das coisas que compõem o mundo, é uma  maluca que nos faz ir para lá das fronteiras do óbvio e nos abre horizontes maravilhosos, assim sejamos capazes de a aceitar e com ela ir passear, onde quer que nos leve.

Disse o velho Saramago que este livro de valter hugo mãe era um tsunami na lígua portuguesa. Completamente de acordo. Leia-se um livro assim e esqueça-se a polémica absurda do Acordo Ortográfico. Escrever é muito mais do que aquilo que os xerifes da língua portuguesa são capazes de imaginar. Ah grande valter!

sexta-feira, novembro 25, 2011

O mundo há-de acabar!

Bem vistas as coisas, todos sabemos que o mundo há-de acabar um dia. Ninguém gosta de falar nisso mas é um dado científico que, se não arruinarmos o planeta pela nossa acção, o Sol tem um tempo de vida limitado e, lá para um futuro difícil de racionalizar, morrerá. Com a morte do Sol, catrapunfas, adeus planeta Terra e demais vizinhos.

Em termos cósmicos isto não é mais que uma banalidade entediante mas, observado à escala humana, é uma tragédia de que Shakespeare nem sequer se lembrou ou teria sobre isso escrito um daqueles textos que nos deixaria a arfar só de lhe dar ouvidos.

Se a humanidade não é mais que um espaço de tempo na eternidade universal porque haveremos de nos alarmar com a morte de um modo de vida que, bem vistas as coisas, pouco mais foi do que um sonho difícil de sonhar?

Não valerá a pena alongar muito mais a mórbida reflexão que já estás a adivinhar onde irá parar, caríssimo leitor. Quando penso na Vénus de Willendorf ou no tecto da Capela Sistina ou na Fonte de Marcel Duchamp sinto pouco mais que uma leve brisa a refrescar-me o negrume das ideias. Afinal a imortalidade é uma pequena anedota e a humanidade nada mais que uma palhaçada divina.

Enfim, comamos um belo frango assado bem regado por um vinho que nos amorteça o mau génio. É para isso que existimos. Tudo o mais... são sonhos.

quinta-feira, novembro 24, 2011

Greve geral

Hoje estou em greve. Protesto contra o desmoronamento do estado social e a morte violenta do sistema democrático um pouco por toda a Europa. Os governantes eleitos em sufrágios universais são substituídos por homens de mão dos "mercados" ou, como no caso do nosso país, não passam de fantoches sem qualquer tipo de poder ou capacidade de decisão.

Protesto contra a escravatura política e social a que estamos sujeitos e protesto contra a ausência de alternativas. Não nos deixam outra forma de manifestar a nossa opinião que não seja esta: fazer greve.

Podem vir com a cantilena do costume: que haverá eleições e, nessa ocasião, sim, será tempo de fazermos valer as nossas opiniões através do voto. Que, fazendo greve, apenas estamos a gravar a situação já de si grave, do nosso país. A esses respondo: vão à merda!

Ninguém nos disse que iríamos ver os nossos ordenados cortados em 40% ou que o investimento económico seria ditado por aqueles que nos estão a roubar. Fomos enganados. Os capitalistas e respectivos sabujos não fazem greve, pudera...

Não me considero obrigado a aguardar pacientemente pela próxima oportunidade de participar num acto eleitoral que é, cada vez mais, uma fraude declarada. Faço greve porque é urgente dizer, alto e bom som: VÃO À MERDA!!!

Hoje li (e ainda vou ler) mais uns quantos capítulos de O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha que, por mero acaso, é a minha leitura do momento. Assim a arte de Cervantes me ajuda a ultrapassar as dúvidas e as desgraças que me são anunciadas em escritos de verdade duvidosa com que me tentam afogar o entendimento.

Viva a Greve Geral!!!
Abaixo o fascismo encapotado e abaixo os mercados, suas bestas de estimação!!!

quarta-feira, novembro 23, 2011

O dedo e a lua

Diz o ditado que "ao tonto aponta-se-lhe a lua e ele fixa o dedo" (é qualquer coisa assim, interessa-me a ideia). Nos últimos tempos só se pensa na crise da dívida, na greve geral de amanhã em Portugal, nas falcatruas dos poderosos, enfim, andamos a olhar tantos dedos apontados em todas as direcções que a lua lá continua, pregada no céu e já poucos são capazes de a olhar com olhos de contemplação.

Quando as coisas correm mal tendemos a esquecer a beleza, quando a miséria nos entra pela casa dentro aos trambolhões a arte é a primeira coisa que esquecemos. Como se deixasse de existir. E se tentássemos contrariar esta fatalidade?

E se tentássemos combater a raiva com a beleza, a dor com o sublime, enfim, se ao focinho da estupidez atirássemos a arte? Serei tonto, acredito, mas talvez a resposta adequada não seja bem aquela que estamos a tentar. Talvez haja outras formas de viver e ultrapassar o desespero das coisas fatais.


sábado, novembro 19, 2011

Negra recordação

Lembro-me bem de ver putos meio nus, sujos e desgrenhados, com ranho eterno a brilhar abaixo do nariz e um pouco sobre o lábio. Putos assim, a correr pela rua, pequeninos, com as vergonhitas aos saltos. As avós eternamente vestidas de negro, as cabeças amarradas debaixo dos lenços com gestos de esconder os cabelos, sentadas, apáticas, num luto infinito que iria durar até mesmo depois da morte.

As mães dos putos andavam nas terras, a cavar, mãos como solas de sapatos que só calçavam ao Domingo, quando os tivessem. Domingo, dia de ir ver a Deus pedir ajuda e protecção que nunca vinha. Os homens tinham ido para o Luxemburgo ou para África fazer a guerra que lhes diziam ser deles mas, penso agora, havia dúvidas quanto a isso.

Na aldeia havia dois ou três automóveis, duas ou três televisões e muita fome Havia uma miséria que doía e não se podia esconder. Os animais viviam mais próximos das pessoas, tão próximos que eram a benção dos dias mais frios naqueles Invernos gelados. A escola não era para todos e mesmo os que lá andavam acabavam cedo que eram precisos para a terra e para a guerra.

Um doce era uma festa, uma laranjada um luxo quase impensável (havia muita água a jorrar, incessante, da fonte). As roupas passavam dos mais velhos para os mais novos. Não imaginava o que fosse uma loja de pronto-a-vestir. As mulheres sabiam coser e usavam-se cotoveleiras nas camisolas e joelheiras nas calças.

Lembro-me bem deste país pré-consumista, onde uma sardinha era alimento para três: cabeça, lombo e rabo e as crianças bebiam bagaço pela manhã, para aquecer o corpo e abrutalhar o espírito. O granito era a nossa natureza e as matas um mundo encantado onde nos perdíamos dias inteiros à procura do mundo.

Lembro-me bem deste país triste, analfabeto e miserável que parecia ter o futuro no fundo de um poço de águas pestilentas. Lembro-me bem e não sou tão velho quanto isso.

sexta-feira, novembro 18, 2011

Camisa vermelha

Já se sabe que neste mundo a criatividade começa a tirar a cabeça de fora. Os criativos desenroscam a corneta na busca de ideias que possam transformar um intelecto adormecido num intelecto frenético, um zombie apático num consumista desenfreado.

Quando a coisa toca a sexo, então: força camaradas! É tudo a espicaçar o orgulho macho (ou fêmea) tentando fazer-lhe cócegas no sítio certo. O que interessa é colocar determinado produto no mercado, vendendo-o ao público alvo pré-definido com largas margens de lucro. É o espírito do tempo, e não me estou a referir ao Natal, que é como se fosse já amanhã, refiro-me ao Mercado, assim mesmo, com um "M" daqueles granjolas, que é onde vogam as barcaças do sucesso e os navios da boa vida económica.

Vem esta conversa a propósito de uma campanha de marketing lançada pelo Benfica para vender preservativos a quem deles precisar, benfiquistas em particular (ver aqui). Não estou a ver um portista apaixonado a enfiar uma coisa daquelas onde é devido sem que isso lhe venha atrapalhar a função ou um adepto do Sporting (como é o meu caso) a comprar preservativos destes com outra intenção que não seja apoucar algum benfiquista menos protegido pela sorte.

Convenhamos que querer fazer humor benfiquista com o acto sexual pode ter efeitos perversos e imprevistos. Imagine-se que a equipa vermelhusca começa a perder jogos que não deveria, com equipas de menor gabarito. Como irá o adepto munido de um poderoso preservativo com a frase "Esta vai ser à Benfica" convencer a paceira de que a coisa vale a pena?

Cá para mim, nestas coisas do contacto amoroso e clímax sexual, o melhor é deixar o clube de fora. Pode não funcionar. O amor será sempre a melhor estratégia. Seja a atacar ou a defender.
:-)

sábado, novembro 12, 2011

A importância de ter um inimigo

Hoje, mal abri os olhos, dei por mim a pensar como é importante termos um inimigo. Não sei o que sonhei para acordar a pensar nisto mas deve ter sido um filme interessante.

De facto, um inimigo declarado e claramente identificado ajuda-nos a apontar as nossas armas numa direcção determinada, ajuda-nos a ter um objectivo. A ausência de um inimigo pode deixar-nos desamparados de ódio, o que não é coisa boa para a nossa saúde.

Necessitamos de ter ódio que nos equilibre a destilação de amor. Uma coisa ampara a outra, é o Yin e o Yang, o equilibrio universal a repousar na mesinha de cabeceira como se fosse um bibelot.

Após o pequeno-almoço e uma olhadela ao jornal dei por mim a pensar que a derrota do comunismo foi o que nos lixou. Quando o Muro de Berlim caíu estávamos longe de imaginar a merda toda que estava para nos entrar porta dentro.

Sem a Cortina de Ferro ficámos à mercê dos nossos próprios demónios. Enterrada a utopia comunista sob toneladas de realidades abjectas, agora confirmadas (a vida do lado de lá era ainda pior e mais desumana do que nós imaginavamos), pensámos que a Social Democracia havia triunfado!

Ao som de trombetas triunfais sonhámos com uma Europa democrática e justa. Abafado o papão comunista teríamos apenas de esperar o tempo necessário para a estabilização social e política do nosso amado Velho Continente. O Paraíso anunciava-se pintado em tons rosa e azul bebé.

Hoje, ao acordar, percebi que sem comunistas estamos entregues ao monstro capitalista sem ninguém que nos proteja. A miséria dos povos subjugados sob as desprezíeveis bandeiras vermelhas estancava a voracidade do mostrengo que agora nos devora a todos, ex-comunistas incluídos, com uma gula insaciável. A bocarra aberta do capitalismo é a porta do inferno na Terra.

Sem inimigos que nos valham estamos entregues à bicharada. É triste. Pior que triste, é um logro miserável.

quinta-feira, novembro 10, 2011

Portugalzinho

Não sei o que quer isto dizer. O mais certo é não querer dizer nada mas mostra bem até onde pode descer uma mãe que não faz a mínima ideia do que é educar uma criança. A coisa conta-se num esboço: um puto de dez anos de idade está a fazer um teste na escola e a professora apanha-o a enviar as questões para a mãe, via telemóvel, que lhe envia de volta as respostas (ler aqui esta extraordinária notícia, ou será simplesmente ordinária?).

A coisa passou-se em Chaves. Toda a gente sabe onde fica Chaves mas poucas pessoas lá vão. Eu passei por lá uma vez, de regresso da Galiza e já não me lembro do aspecto da cidade. De Vigo ainda guardo umas memórias e de Santiago de Compostela recordo umas quantas coisas. Mas de Chaves, sinceramente, népias!

Recordar esta falta de recordação não tem absolutamente nada a ver com o caso do petiz copião e da sua mãe pouco honesta em questões de conhecimento de facto. A não ser que a citada senhora estivesse a agir por vingança contra o esquecimento. Se assim foi pode hoje estar de consciência tranquila pois atingiu com brilho o seu objectivo.

segunda-feira, novembro 07, 2011

Uma dúvida

Quando se derruba um tirano? Será quando se lhe atiram as estátuas por terra ou quando os últimos mercenários desaparecem de cena? Talvez o tirano permaneça muito para lá da destruição das suas imagens. Só o tempo pode dizê-lo mas, no caso que melhor conheço, o tirano fica impregnado no quotidiano do povo por muitos anos. Um tirano nunca desaparece por completo. Um tirano é prova absoluta da extraordinária validade da Lei de Lavoisier se partirmos do princípio que é coisa digna de ser considerada como parte da natureza.

domingo, novembro 06, 2011

Ele há coisas

Há momentos em que o tempo se baralha todo na paisagem e os sentimentos irrompem como lava cuspida da garganta de um vulcão envelhecido. As lágrimas assomam à beirinha de serem choradas e um soluço, uma convulsão, uma coisa quente arrepela-nos o peito, a puxar para os olhos o sentimento de pertença a uma coisa tão próxima da humanidade que até dói só de ser imaginada.

Há momentos dolorosos que nos fazem perceber que não percebemos nada, que os nossos problemas são merdices, minudências existenciais, que há coisas muito mais importantes do que nós estarmos vivos.

Ele há coisas...

sábado, novembro 05, 2011

Carneiros, ovelhas e outros seres

É curiosa (mais) esta polémica com a igreja católica a propósito do mais recente livro de José Rodrigues dos Santos. No P2 deste sábado, no artigo assinado por Natália Faria, tenta-se enquadrar a polémica apresentando argumentos de vários dos polemistas. Chamou-me a atenção a passagem que diz que «ao padre Anselmo Borges não custa admitir que a Igreja “deve formar melhor os seus fiéis e promover um maior esclarecimento sobre a figura de Jesus Cristo”.»

Parece-me que o problema (se é que isto pode ser considerado um problema) é que a igreja católica encara os seus fiéis sob a figura, não tão metafórica quanto isso, de um rebanho. O padre é um pastor e todos sabemos que o pastor não explica às suas ovelhas as qualidades nutricionais das ervas que elas pastam pacientemente e em silêncio, com mais prazer do que volúpia. O problema (se é que isto pode ser considerado um problema) é que a educação católica ensina a não questionar as “verdades” porque questioná-las é um pecado e indicia ausência de Fé. A Fé dos católicos é sinónimo de crença total e entrega absoluta.

A Fé não se explica, ela é alimento para a alma dos católicos tal como a tenra erva é alimento para as dóceis ovelhinhas e é esta Fé que permite a existência pacífica de Deus. Sem Fé a existência de Deus pode transformar-se num problema de contornos monstruosos. Bastará olhar com um mínimo de atenção para o Homem, que se diz criado à Sua imagem e semelhança. Qualquer postura que questione a Fé põe em causa os fundamentos básicos da religião católica cujos pilares assentam na infalibilidade dos dogmas tão ferozmente defendidos ao longo dos séculos, nomeadamente desde a cisão protestante.

Coisas tão prosaicas quanto este livro de José Rodrigues dos Santos fazem vacilar os pilares dogmáticos do catolicismo, humanizam as ovelhas e os seres humanos contemporâneos não simpatizam muito com a ideia de que fazem parte de um rebanho, pelo menos em teoria. A igreja católica lida muito melhor com balidos de ovelhas que com vozearia humana. Parece-me que à igreja custa admitir que são os seus fiéis que a constroem e que não é ela a construir a identidade individual desses fiéis. A ignorância sempre foi o combustível principal da chama que anima a Fé católica. Substituí-la pelo conhecimento poderá equivaler a deitar água na fogueira.

Talvez por isso, de cada vez que há um livro, um filme ou uma figura pública que ponham em causa os seus dogmas, a igreja católica sai a terreiro com quatro pedras em cada mão, disfarçada de David perante pobres Golias que de gigantes têm muito pouco e desata a apedrejá-los até estes ficarem de joelhos, pedindo perdão por um crime que não cometeram. Sim, porque questionar dogmas tão estapafúrdios quanto a virgindade de Maria ou o carácter divino de um homem simples não pode ser considerado crime digno de lapidação pública como a que se está a tentar fazer a José Rodrigues dos Santos. Deixem lá o homem escrever o que muito bem entende. Se é mentira porque ficam tão excitados? Deus haverá de o castigar, não acham?

(carta enviada à directora do jornal Público)

Nota final: Não li este nem nenhum outro livro do autor citado e, muito sinceramente, não tenciono vir a fazê-lo.

quinta-feira, novembro 03, 2011

A Zaragata

 
A Europa precisa de uma narrativa comum que contribua para o despertar de uma consciência colectiva dos diferentes povos que a compõem. Uma narrativa épica que faça sentido e nos permita voltar a sonhar. Precisamos de qualquer coisa de utópico, uma narrativa plena de ideais humanistas que nos permita recuperar o orgulho de ser europeus. Precisamos de uma narrativa à maneira das narrativas religiosas, que elegem uma personagem central e a elevam à categoria de divindade, rodeada de uma série de proféticas personagens secundárias. Precisamos de uma narrativa como as dos inventores dos nacionalismos oitocentistas que foram remexer os baús de memórias populares; lendas, mitos e personagens maravilhosas, ressuscitando velhos heróis, maquilhando-os de modernidade para fundarem os nacionalismos que hoje enxameiam o espaço europeu e impedem o nascimento de uma consciência comum aos habitantes deste continente.

Cada povo adora os respectivos santinhos e crê na sua teia particular de acontecimentos milagrosos que lhes permite ter orgulho naquilo que putativamente são. Os impérios sempre assentaram tanto na força quanto na fé, na sua capacidade de oferecer uma ilusão aos que neles vivem. O que tem a União Europeia para nos oferecer? Qual o sonho comum a todos os europeus? Actualmente a União Europeia é pouco mais que uma teia de burocratas sustentados por uma comandita de usurários a que se dá o nome, um tanto enigmático, de “mercados”. Nos últimos tempos a União comunica com os cidadãos através de uma linguagem exclusivamente económica. A heroína desta narrativa confusa é a Economia, uma espécie de divindade volúvel, vingativa e insaciável, mais apropriada para assustar as criancinhas que não querem comer a sopa do que para inspirar sonhos de grandeza humanista. E nós, europeus, portamo-nos como crianças obedientes e um tanto imbecis. Para aqui andamos, feitos baratas tontas, a esquecer o significado da palavra solidariedade e os fundamentos básicos da Democracia, a trocar direitos por deveres que aqui há uns anos atrás nem sequer nos passava pela cabeça aceitar. 

Precisamos de um herói que nos inspire e faça renascer os nossos sonhos de grandeza. Precisamos de uma narrativa suficientemente global, que seja compreendida por todos os cidadãos, capaz de fazer que com ela nos identifiquemos. Mas, problema supremo: onde vamos nós desencantar essa personagem extraordinária? Que narrativa maravilhosa poderá unir os europeus em redor de um projecto civilizacional comum que tenha como base a Democracia e o Humanismo por fundamento? Após longa e aturada reflexão proponho que o herói seja Astérix. Tem a vantagem de ser uma personagem universal, apesar da sua origem gaulesa, compreensível para todos os escalões etários e há uma aventura desta personagem que poderá levar-nos a pensar sobre o que andamos para aqui a fazer, a tal narrativa luminosa e potencialmente unificadora. Falo de A Zaragata. Este livro genial dos geniais profetas Goscinny e Uderzo, deveria passar a ser leitura obrigatória para todas as crianças (e adultos) habitantes do território europeu. Impõe-se a vulgarização de uma hermenêutica de A Zaragata. Com urgência.

terça-feira, novembro 01, 2011

Europa, o que és tu?

A Europa está em maus lençóis. Tem-se deitado com quem não devia e, ao acordar, tenta perceber onde está e a merda que fez. Um clássico da leviandade. Acorda-se com a boca seca e uma grande dor de cabeça, sem saber onde se deixaram as calças nem as cuecas que hão-de estar algures. Longe ou perto? Vá-se lá saber.

Talvez que a culpa tenha sido de Zeus, essa divindade viciada em sexo com tudo o que tivesse um sopro vida. Desde que raptou Europa naquela sua célebre golpada do touro branco que a dita cuja nunca mais atinou com as companhias. Anda por aí, perdida ou envergonhada, não se percebe bem. A única certeza é que Europa tem graves problemas de identidade.

A Europa dá-se com gente pouco recomendável e anda a vender-se a pataco. Tornou-se uma puta de berma de estrada, sem grandes cuidados na sua higiene íntima e lambe qualquer bota que lhe pise os calos. Se não mudar de vida ainda vai pegar doenças infecciosas a quem com ela se deitar.