sexta-feira, julho 04, 2008

A águia americana tem problemas...


Ao que parece o filme Hancock, com Will Smith no papel de um super-herói bem ao estilo americano mas que usa os super-poderes em adiantado estado de alcoolemia, está a causar alguma perplexidade na crítica lá dos states. (ler aqui)


A ideia base é excelente e as cenas de acção que abrem o filme com um super-homem preto e andrajoso a voar aos esses com uma ressaca de meter medo, prometem. E as promessas são cumpridas. Numa América que, ao que tudo indica, se prepara para eleger o seu primeiro presidente pouco branco de pele, a primeira cena com Hancock tem,em fundo, uma publicidade qualquer com uma águia e uma frase da qual vemos apenas a palavra "dream" e depois "your dream". Significativo, também, o facto de os vilões que abrem as hostilidades serem um grupo de asiáticos que se deslocam numa carrinha aos tiros na auto-estrada. Tudo muito Big America on the Way.


O desenvolvimento do argumento leva-nos, de súbito, numa direcção inesperada. Não vou estar aqui a contar pormenores, detesto isso, mas posso dizer, sem revelar nada de fundamental,que o filme tem dois finais. O primeiro final, em que tudo parece definitivamente perdido, é muito bom. Negro como a noite. Tão negro que custa a acreditar que um filme de bilheteira acabe daquela forma. E não acaba, embora eu tenha ficado com a sensação de que o argumentista se daria por satisfeito caso pudesse ter fechado ali a narrativa. Mas isso seria um desastre em termos de receitas de bilheteira lá nas terras do Tio Sam.


Avança-se para o final feliz, bem mais ao gosto do grande público e a coisa perde um bocado o seu espírito. Mas como, nos tempos que correm, compreendemos perfeitamente que se tomem certas atitudes para ganhar mais uns cobres, acabamos com um sorriso nos lábios por percebermos a evidência de um final alternativo para não defraudar os comedores de pipocas.


Resumindo e concluindo, Hancock reinventa e retoca alguns estereotipos do filme de super-heróis com uma frescura e um humor que o tornam um objecto de consumo de alguma qualidade. Apesar de um ou outro momento em que os movimentos de camâra me irritaram um bocadinho, posso dizer que em cinco estrelas daria três sem pestanejar. Três e meia, vá lá, mesmo quatro, se não lhe tivessem metido aquele segundo final que, ainda por cima tem uma águia apenas para enfeitar. Uma águia americana com problemas existenciais e muitas dúvidas sobre o que fazer perante situações de crise extrema.


A ver.

4 comentários:

pandoracomplexa disse...

é essa parte do super-herói ao contrário que torna a personagem um herói.

Só- Poesias e outros itens disse...

Anotei a sugestão.
Vou lá ver.

bjs.

JU Gioli

Silvares disse...

Um herói ao contrário? Ou será que um herói não pode sê-lo ao contrário? O contrário de um herói é um vilão ou um anti-herói (que é outra forma de ser herói)? Este Hancock é uma personagem tramada. Podia ser, se não acabasse tão "limpinho" na última cena. Enfim, uma personagem complexa, não achas Pandora?

Ju, espero que se divirta.

Só- Poesias e outros itens disse...

Silvares, assisti ao filme, e realmente concordo com você quanto ao final, bem adocicado ao estilo americano, um desastre. O que o filme traz de novidade, e ao meu ver, até dá para engolir, foi a de mostrar o lado neurótico e depressivo de um herói, que como nós mortais sofre das auguras da vida, que têm vícios, dependências e precisa do outro como espelho.

Deu até para se divertir, se não se levar tão a sério a narrativa.


bjs.

JU gioli