segunda-feira, setembro 22, 2008

Um caso de infidelidade conjugal


Afinal o capitalismo é ainda mais merdoso do que podíamos imaginar. Já se sabia que a base do sistema era a exploração do homem por seres muito parecidos com ele.

O que ainda não sabíamos era que, quando esses seres, aparentemente humanos, vêem os seus negócios correr mal, têm auxílio financeiro suportado por aqueles que são explorados. Ou seja, o mito de que o sistema capitalista se auto-regula através das sacrossantas leis da oferta e da procura não passa disso mesmo: é um mito de merda.

Os últimos acontecimentos na terra do Tio Sam põem a descoberto a careca escondida do sistema. Se os capitalistas estão a ganhar muito dinheiro o mundo está de boa saúde. Se começam a perder dinheiro o mundo está doente e são sempre os mesmos que pagam a crise.

O casamento de gosto duvidoso entre as democracias parlamentares e o capitalismo é definitivamente posto em causa. Os capitalistas sacam o dinheiro "honestamente" e põem-no a render em paraísos fiscais, enganando o sistema democrático uma vez que os lucros que obtêm não são redistribuídos, como estava claramente especificado no contrato de casamento. A democracia é parte enganada neste negócio e não tem capacidade nem autonomia suficiente para reclamar divórcio.

Nós, filhos desta união, assistimos estupidificados ao desmoronar deste matrimónio de conveniência e não conseguimos compreender como foi possível termos co-habitado o mesmo espaço, durante tanto tempo, sem que tivéssemos sequer suspeitado da infidelidade do capitalismo em relação à nossa mãe, a democracia. Quer dizer, havia por aí muitas vozes de filhos desavindos, vozes que reclamavam maior atenção ao pai, maior respeito pela mãe, mas, o capital, tudo compra, tudo alisa, tudo consegue transformar em quase nada. Umas prendas oferecidas aos filhos certos na ocasião adequada foram iludindo a maioria, ávida do amor e dos favores do pai.

Agora vamos a ver no que vai dar esta salsada. O pai anda saído de casa e a namorar com as autocracias mais a Leste ou a Oriente ou lá onde moram as suas novas namoradas. Há quem diga que vai mudar-se de vez e por completo, deixando a nossa mãe agarrada às tetas, que já não lhe interessa apesar de se mostrar tão submissa e implorar que volte, que regresse, que lhe limpa os fatos e lhe lambe as botas até elas brilharem outra vez. Mas o pai não se comove, o capitalismo é macho, a democracia é fêmea. Lá para o Oriente o pai encontrou companhia mais ambígua, meio estranha, andrógina, há quem diga. O capitalismo namora agora uma coisa com dois sexos. Ao que parece acredita ter encontrado uma cama mais macia, uma via para a felicidade mais radiosa. Bem que nos enganou. Pelo menos a todos os que acreditaram nas suas qualidades como pai de família.

Um belo filho da puta, é o que é. Mas, afinal, de que estávamos nós à espera?

17 comentários:

Anónimo disse...

Nesse assunto de família, não dou palpite! Quem sou eu para julgar papai e mamãe?...

Anónimo disse...

Belo texto, Silvares. Escreves muito bem, principalmente quando estás f...chateado, quero eu dizer!

Beto Canales disse...

No Brasil, desde sempre vê-se dinheiro público sendo injetado em bancos em defesa 'da estabilidade'.
De quem? é o que sempre perguntei. E sempre respondi: dos mesmos de sempre, os donos do maldito e assassino capital.

Jorge Pinheiro disse...

O capitalismo fez da democracia um filho bastardo. Mas alguém julgava outra coisa? Inventam produtos financeiros "sofisticados" que ninguém entende e acham que isto não é burla. Em vez de irem presos, recebem prémios de gestão! A pergunta é: e vale a pena ter dinheiro?

Beto Canales disse...

Expresso, se ele for usado para que serve, gastar, vale. No mais, não.

MUMIA disse...

"money makes the world go round...
money, money, money..."

e..."dinheiro só pra gastar..."

+++mal necessário, nesta nossa sociedade capitalista. SHIT!!!

Silvares disse...

Eduardo, este casamento já era.

Roserouge, obrigado. Esta história e outras do género deixam qualquer um f... chateado. A menos que seja dos filhinhos preferidos.

Beto, o valor dinheiro é uma convenção abstracta. O bem estar das pessoas não. O bem estar das pessoas é a realidade. As duas coisas andam desencaixadas.

Jorge, parece-me que estamos a chegar ao fim de alguma coisa ou, pelo menos, iremos em breve assistir a transformações significativas na organização global.

MUMIA, o money faz com que muito boa gente deixe de o ser.

Ví Leardi disse...

A roda...a roda ...sempre a roda...

Anónimo disse...

rui: outra grande verdade...a GANÂNCIA!!!
jo-zéi

Anónimo disse...

rui: devias postar aqui a imagem(e a frase) do Groucho Marx que postei na MUMIA...para a malta comentar.
EINNN???

Lord Broken Pottery disse...

Silvares,
Sei não. O capitalismo é meio gato, tem sete fôlegos. É exímio nos jeitinhos. Faz o que precisar em termos de amor. Namora, transa, casa, separa, amiga, trai, é traído, dá e recebe. Goza por todos os poros e não está nem aí. Você tem razão no final. O que se esperar de quem não tem caráter?
Grande abraço

Beto Canales disse...

Muito consistente o comentário aí acima, como o post todo.

Francine Esqueda disse...

Taí... acho que sem gratidão e caráter ninguem chega a lugar algum...
Desculpa a demora e obrigadão pela visita! Um super beijo e bom resto de semana!

Alice Salles disse...

tudo que vai volta e eu não esperava mais nada além do que está acontecendo... está voltando.

Anónimo disse...

Os capitais dão a volta no planeta muitíssimo mais rápido que os satélites em órbita.
Capitais impalpáveis, já que só trocam de mão ordens de compra/venda. Capital sem cara.
E nós, no meio dessa comunicação/negociação instantânea, ficamos a ver navios. À vela.

Silvares disse...

Ví, a roda não pára... pois não?

Jo-Zéi, o pessoal bem que pode ir até à MUMIA :-)

Lord, na verdade, que poderemos esperar a não ser aquilo que não queríamos receber?

Beto, o Lord tem um discurso bem consistente. Sempre.

Francine, volte sempre que desejar, não se sinta obrigada :-D

Alice, a esperança é sempre a última coisa a morrer mas está ficando moribunda.

Peri, e ficamos tontos. Tontinhos mesmo!

Alice Salles disse...

Silvares... de uma olhadinha no meu blog.
Um beijo grande!