Os elogios unânimes recolhidos por Odete Santos após o abandono do seu lugar de deputada na Assembleia da República têm qualquer coisa de nostálgico. Assistimos aos sinais evidentes da falência de um certo modo de estar e de fazer política. Todos os encómios dirigidos à ex-deputada enfatizam a sua inesgotável capacidade para acreditar nos ideais comunistas e ao desassombro com que sempre os defendeu e, decerto, continuará a defender. Os elogios chovem de todos os quadrantes políticos, uns mais outros menos sinceros, há os que resultam de uma certa sensação de alívio, outros carregam alguma mágoa. Fica a impressão de que restarão poucos políticos no activo que reúnam as qualidades de Odete Santos e, se prestarmos um pouco de atenção ao panorama, confirmamos essa impressão com alguma facilidade.
O processo de substituição de políticos idealistas por outros, digamos, mais pragmáticos, terá tido o seu momento mais emblemático na troca de Jorge Sampaio por Cavaco Silva no lugar de Presidente da República. Saiu o autor da célebre frase “Há vida para lá do défice.” Entrou o autor da enigmática máxima da “Má moeda, boa moeda.” Saiu um homem conhecido pelo seu percurso político de uma vida inteira dedicada à luta por ideais entrou outro que se dedicou à política por acidente, resultado da necessidade de rodar um automóvel novo entre Boliqueime e a Figueira da Foz.
O pragmatismo das actuais “elites” políticas é algo inquietante. Os ideais sociais e políticos são agora totalmente subordinados a questões económicas. A Economia surge sempre em primeiro lugar. De tal forma que o discurso político actual se dirige obedientemente para as questões orçamentais como se mais nada interessasse. A Justiça, a Educação, a Saúde só são colocadas em plano de destaque se as medidas propostas nestas áreas contribuírem para a boa imagem das contas públicas. Ouvimos constantemente falar em investimentos de milhões de euros nisto e naquilo sem repararmos que, na maior parte das vezes, ninguém nos explica como vão ser aplicados esses investimentos. Os números são mais importantes do que as acções. Vivemos um mundo de ilusões toscamente fabricadas. Satisfazemo-nos com sonhos pouco ambiciosos desde que sejam bem nutridos em termos económicos. Odete e Sampaio não são cartas deste baralho. Aqui, personagens como Sócrates e Cavaco são ás e rei de trunfo. Não nos interessa que os nossos dirigentes sejam incultos ou meras personagens de ficção, o mundo que eles dirigem também não prima pela excelência do argumento. É toda uma nova forma de vida baseada na capacidade de consumo dos indivíduos em que as questões humanitárias surgem amiúde como furúnculos que é necessário extrair numa boa operação plástica.
O debate entre Portas e Ribeiro e Castro é uma boa caricatura daquilo a que me refiro. A total ausência de substância não coíbe as personagens de reclamarem para si próprias um papel de relevo no desenrolar da acção. Ainda que as suas actuações não prometam mais que uma fraca audiência, ninguém os convence das suas fracas capacidades políticas. Um está convencido, com alguma razão, que uma imagem televisiva iluminada por um sorriso artificial vale mais que mil palavras verdadeiras, ao outro não se percebe muito bem o que o anima mas alguma coisa será.
O adeus a Odete e os elogios por ela recebidos são como um requiem pelo idealismo político entoado com alguma gravidade e melodia triste. Os que ficam vão sorrindo pois sabem que assim estão um pouco mais descansados para praticarem o pragmatismo político à vontade e assim tratarem dos seus negócios. Há quem lhe chame democracia capitalista. Eu acho que isso é um contra-senso.
O processo de substituição de políticos idealistas por outros, digamos, mais pragmáticos, terá tido o seu momento mais emblemático na troca de Jorge Sampaio por Cavaco Silva no lugar de Presidente da República. Saiu o autor da célebre frase “Há vida para lá do défice.” Entrou o autor da enigmática máxima da “Má moeda, boa moeda.” Saiu um homem conhecido pelo seu percurso político de uma vida inteira dedicada à luta por ideais entrou outro que se dedicou à política por acidente, resultado da necessidade de rodar um automóvel novo entre Boliqueime e a Figueira da Foz.
O pragmatismo das actuais “elites” políticas é algo inquietante. Os ideais sociais e políticos são agora totalmente subordinados a questões económicas. A Economia surge sempre em primeiro lugar. De tal forma que o discurso político actual se dirige obedientemente para as questões orçamentais como se mais nada interessasse. A Justiça, a Educação, a Saúde só são colocadas em plano de destaque se as medidas propostas nestas áreas contribuírem para a boa imagem das contas públicas. Ouvimos constantemente falar em investimentos de milhões de euros nisto e naquilo sem repararmos que, na maior parte das vezes, ninguém nos explica como vão ser aplicados esses investimentos. Os números são mais importantes do que as acções. Vivemos um mundo de ilusões toscamente fabricadas. Satisfazemo-nos com sonhos pouco ambiciosos desde que sejam bem nutridos em termos económicos. Odete e Sampaio não são cartas deste baralho. Aqui, personagens como Sócrates e Cavaco são ás e rei de trunfo. Não nos interessa que os nossos dirigentes sejam incultos ou meras personagens de ficção, o mundo que eles dirigem também não prima pela excelência do argumento. É toda uma nova forma de vida baseada na capacidade de consumo dos indivíduos em que as questões humanitárias surgem amiúde como furúnculos que é necessário extrair numa boa operação plástica.
O debate entre Portas e Ribeiro e Castro é uma boa caricatura daquilo a que me refiro. A total ausência de substância não coíbe as personagens de reclamarem para si próprias um papel de relevo no desenrolar da acção. Ainda que as suas actuações não prometam mais que uma fraca audiência, ninguém os convence das suas fracas capacidades políticas. Um está convencido, com alguma razão, que uma imagem televisiva iluminada por um sorriso artificial vale mais que mil palavras verdadeiras, ao outro não se percebe muito bem o que o anima mas alguma coisa será.
O adeus a Odete e os elogios por ela recebidos são como um requiem pelo idealismo político entoado com alguma gravidade e melodia triste. Os que ficam vão sorrindo pois sabem que assim estão um pouco mais descansados para praticarem o pragmatismo político à vontade e assim tratarem dos seus negócios. Há quem lhe chame democracia capitalista. Eu acho que isso é um contra-senso.
Carta enviada ao Director do Público
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