Segue-se texto de Luís Miranda constante em e-mail depositado aí por várias caixas de correio virtual. Refere-se a uma espécie de colóquio ou lá o que é aquilo que iremos apresentar dia 25 do corrente, no Museu da Cidade, em Almada. Fica o convite a todos os interessados (ou não).
"A arte fala?"
O Berardo e a Paula Rego à esquina
Amigos, conhecidos, vizinhos, pessoas atentas, gente das artes, almadenses, público em geral Vamos realizar um colóquio, dia 25 de Janeiro, 6ª feira, às 21,30h, no Museu da Cidade com o tema "A arte fala?". A partir da apresentação de um conjunto de imagens faremos uma viagem pela arte ocidental desde a antiguidade clássica até à época contemporânea. Pretende-se conversar com a assistência sobre a clareza ou opacidade das formas, sobre o seu processo de significação, o processo de atribuição de sentido à arte, em geral, e sobre a sua importância para a vida nas sociedades contemporâneas.Este assunto parece o "mito do eterno retorno", uma discussão batida e conhecida, mas continua a ser pertinente pois surge sempre quando as pessoas (incluindo os agentes culturais, os "artistas" e os artistas) se dispõem a pensar e a conversar um pouco mais a sério, quando referem ou estão perante os objectos de arte. Estes parecem ser sempre umas coisas estranhas que não querem ser dominadas e entendidas, até que o discurso se debruce sobre elas e, mesmo assim, permanecem num estado estranho, do qual desconfiamos.Será que os objectos de arte, principalmente os contemporâneos, se destinam ao comércio de luxo, não dizem e não fazem nada de importante e são resultado dum mundo desvairado e consumista? Será que são adereços da diferenciação social e de actos públicos de representação dos grupos sociais? As pessoas gostam, mesmo, mesmo, daquelas coisas, ou..?
O Berardo e a Paula Rego encontram-se à esquina do CCB, bebendo um copo de tinto frente à última aquisição do museu. Conversam sobre quê? E nós, no dia seguinte face ao mesmo objecto, sobre que assunto falaríamos?
"A arte fala?" (versão "Hard-Core")
Pessoal, vamos pegar nessa coisa da arte, despi-la, arrancando-lhe os véus com gestos precisos, colocá-la em cima duma mesa, chicoteá-la até a espremermos toda. Depois de satisfeitos, embrulhamo-la em plástico transparente, encafuamo-la num recanto do museu, dentro de uma vitrina, e fica lá exposta.Nunca mais nos chateará!
"A arte fala?" (versão de bolso)
O homem bem vestido, com um fato Armani e ténis de pelica da Nike, pretos, dirigiu-se ao parque. O sol estava a enfraquecer e os seus raios pintavam tonalidades de verde amarelado nos pinheiros mansos. A calma parecia construir um momento mágico, irreal. Ouvia-se a cidade ao longe ronronando como um grande motor incansável, mas ali, naqueles caminhos de terra avermelhada que sobressaíam junto à relva fofa, entrava-se num mundo à beira do sonho. O homem fixou os ponteiros do seu Rolex e reparou que eles andavam mais devagar. De súbito, num momento de inspiração, pegou no telemóvel e decidiu registar uma imagem daquele momento, para colocar como fundo no seu portátil. Lembrou-se que tinha estudado fotografia na universidade e pensou que o momento merecia um enquadramento notável, fora do comum. Estaria aí a representação daquele momento em que o tempo apresentava a sua lentidão. Ao procurar o que fixar na máquina, deparou-se com aquela imagem arrasadora. A estátua em estilo grego clássico que olhava o horizonte com uma expressão serena, como se sempre ali estivesse estado, esperando por ser encontrada. Os últimos raios de sol, ofereciam-lhe uma cabeleira ruiva, acentuando os contrastes do panejamento, animando o corpo de pedra numa sensualidade inaudita, quase insuportável. O seu rosto irradiava uma luz cálida que se lhe dirigia. A boca de lábios carnudos pareceu mover-se, articulando uma palavra sussurrada. Arrasado pela visão, ora celestial, ora demoníaca, sentou-se no banco de madeira e encurvou-se sobre si próprio, escorregando-lhe o telemóvel no abandono da mão.Descobriram-no no dia seguinte, adormecido e meio nu, pois tinham-lhe roubado as roupas durante a noite, com uma expressão indefinida.Nunca se soube o que a estátua sibilara, porque o som se colou a uma brisa que se desfez durante a noite.Na cabeça do homem ficou sempre a dúvida: ela falou?
Estas coisas podemos nós conversar no Museu da Cidade, lá no princípio da noite de 6ª feira (21,30), 25 de Janeiro.É uma parceria entre o F4, a Anselmo e o Museu da Cidade e está sendo preparado pelo Rui Silvares, pela Helena Cruz e pelo Luís Miranda.
6 comentários:
Postagem, e texto MARAVILHOSO. Uma pena eu não poder participar. Adoraria! Mas vou fazer minha parte postando no VARAL.
Obrigado pelo "convite"...
(;-(
Obrigado eu Eduardo. O meu colega Luís Miranda tem uma veia de escritor bem visível!
Espero que haja conversa da boa!
VIVA MALTA BOA!!!
Dispam pois toda a Arte, com muita Arte claro.
Espero que não me tremam as mãos (nem o cérebro) na hora da verdade, verdadinha!
:-)
que o Deus dos Discursos te acompanhe. :-))))
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