domingo, junho 20, 2010

Nem todos te amam depois de morreres (se o teu nome for Saramago)


No post anterior fiz uma pequena reflexão sobre o efeito purificador que a morte tem nas vidas que vivemos como se, sendo o fim, resultasse como uma espécie de desinfecção, uma derradeira limpeza, antes de saírmos de cena.

Mas, depois de ler o que escreveu o pasquim do Vaticano (ler e ver aqui) sobre José Saramago, percebi que não é bem assim.

Os católicos apregoam o perdão e a reconciliação entre os homens mas nem sempre o praticam. Deus não os livra da mesquinhez e da vingançazinha quando a podem exercer. Talvez porque, como tantas vezes nos fez notar Saramago, a mesquinhez vingativa é um traço bem vincado na divindade de Jeová. Se o pai deles é assim porque haveriam os filhos de ser diferentes?

Por cá tivemos a atitude do nosso presidente (ler aqui), o cidadão Cavaco Silva, católico recurvado e papista servil, que, a pretexto de ter prometido à família uma visita guiada às maravilhas naturais dos Açores, considerou ter alibi suficiente para justificar a sua ausência no funeral do escritor.

Saramago tinha afirmado em entrevista televisiva que Cavaco é "um campeão da banalidade". Se alguma prova faltasse para lhe dar razão, a atitude do presidente aqui está para mostrar como, mais uma vez, foi ajustada a sua análise. Cavaco teve a sua vingançazita, pequenina e infantil, bem à medida da personagem que tão mal representa. Hoje podia ter mostrado grandeza de espírito mas apenas conseguiu evidenciar que não tem estatura para ocupar o cargo para o qual foi eleito. Se um presidente é o espelho do povo que o escolhe, ai Jesus, valha-me Nossa Senhora!

Concluo reconhecendo o meu erro no post anterior. Nem toda a gente te ama depois de morreres se o teu nome for José Saramago. Compreensívelmente.

9 comentários:

the dear Zé disse...

O sr. silva é um cumpridor de promessas e como prometeu à família...
o pastel de Belém nem isso é, não passa de uma carcaça bolorenta

aiqueredo, é isto o presidente deste, o meu, país

..da-se

roserouge disse...

Vamos por partes:

1 - O Cavaco e o Saramago detestavam-se mutuamente. É um facto, nem vale a pena esmiuçar os porquês, todos nós detestamos alguém.

2 - De vez em quando lá morre um Prémio Nobel de qualquer coisa por esse mundo afora. Não tenho conhecimento que Presidente da República algum tenha ido a correr ao funeral, muito menos este fusué todo à volta do homem. Vi pessoas na tv (políticos e outras entidades) a falar dele muito consternados como se fossem muito amigos e sentissem grande admiração por ele e aposto que nunca leram um livro dele.

3 - Cavaco não foi ao funeral e fez muito bem, mostrou coerência e honestidade nas suas contendas com Saramago. Se tivese largado tudo e ido, alguém viria dizer que era um hipócrita, que não podemos ter um presidente assim, blá, blá blá. Não quis interromper as suas férias com a sua família e isso para ele é que é importante. Mainada.

Pessoalmente, nunca consegui ler nenhum livro dele até ao fim.

Quem era o nosso Presidente quando Egas Moniz, o nosso Nobel da Medicina morreu? Alguém sabe? E esse tal PR da época foi ao funeral? Já agora...

Silvares disse...

Caçador, ao menos é um homem de palavra.

Rose, como já deves ter reparado eu também detesto algumas pessoas. O Cavaco é uma delas, de longa data.
Eu não sei o que os outros presidentes fazem, nem quero saber. Só acho que um homem tem, de vez em quando, oportunidades para provar, quanto mais não seja a si próprio, que tem tomates. Esta era uma boa oportunidade de o gajo mostrar que é presidente dos portugueses, coisa que ele ainda não foi capaz de provar. Olha, a mim era como se me desse um bofetada de luva branca. Lá teria eu de engolir um sapo do tamanho de um avião.
Fazendo o que fez não me surpreendeu, o que me deixou um tanto irritado foi a desculpa de merda. Não gosto dele. Acho que não presta.

roserouge disse...

Estás no teu direito. Assim é que é bonito e é a verdadeira democracia. Respeito isso, embora não concorde contigo.

Lina Faria disse...

Gente, santo de casa não faz mesmo milagre.
Tampouco quando ateu.
Saramago foi um dos grandes pensadores dessa virada do século, sim.
Começou a publicar já tarde, mas com uma sabedoria impar.

Não é um Nobel qualquer.
Éo melhor escritor de lingua portuguesa, dos contemporâneos.
Um presidente teria sim que ir reverenciar seu conterrâaaneo mais ilustre dos ultimos anos.
Tal quaaaal a igreja Católica, foi vingativo, além da gafe diplomático.
Feio!

roserouge disse...

Lina,

O melhor escritor de língua portuguesa contemporâneo é o José Luís Peixoto. Para começar, recomendo que leias o "Nenhum Olhar".

Anónimo disse...

pois é Silvares, eu só li um livro dele que me apareceu no ano passado em minhas mãos, e nem era o mais conhecido dele: ´A caverna`. Tenhos outros que estão no Brasil me esperando na estante, a ver.

Rui Sousa disse...

Eu acho que mais uma vez o Cavaco mostrou falta de grandeza para o cargo que ocupa, assim como já tinha demonstrado ( ele e o idiota do Sousa Lara )no passado. Aqui o que interessa não é se o presidente gosta ou não de fulano tal. Os gostos pessoais, amizades, atritos da parte dele não interessam ao país. O que devia prevalecer neste momento era ele pensar se o Saramago é uma figura que eleva a história do país lá fora. Isso é que é o ponto importante, e em relação a isso creio que há muito poucas dúvidas. Goste-se ou não, o Saramago elevou o nome de Portugal e como presidente ele só tinha que estar presente. Ninguém queria lá o Cavaco cidadão, queriamos o Cavaco presidente, o maior representante politico da nação. Ele continua a não perceber, e isso só o torna mais pequeno, mesquinho e sem categoria para o cargo que ocupa.

Silvares disse...

O episódio de Cavaco é uma nota de rodapé, escrita em letra pequenina. No fundo, a importância que eu e outros damos a esta anedota apenas reflecte a raiva que sentimos pela morte de quem morreu e pelo facto de precisarmos de encontrar um escape para a descarregar em alguém que por cá tenha ficado. Tendo morrido Saramago quem melhor do que um representante do poder para atirarmos umas quantas pedradas bem apontadas?