sábado, junho 26, 2010

Magia

Os Lobos, jogadores da selecção portuguesa de rugby, cantando o hino (vale a pena ver aqui) antes de um jogo do mundial em que foram gloriosamente trucidados por adversários muitíssimo mais fortes sem nunca terem desistido de uma jogada que fosse


Há qualquer coisa de estranho na forma como o coração se me aperta quando vejo os jogadores alinhados antes do jogo para cantarem o hino nacional. Portugal é, para mim, uma coisa abstracta, um desenho no mapa, uma fronteira meio apagada, nada que me faça perder o sentido de largueza que o espírito me recomenda sempre que penso em mim, nos meus e nos outros. Sejam os outros os que entram ou que saem, fiquem por cá ou passem apenas, em trânsito, para outras vidas. Quero dizer que não ligo muito à ideia de nação, nem de pátria, vistas assim, da perspectiva geográfica ou de clã alargado e descrito pela cor da pele conjugada com o rasgar dos olhos.

Então porque fico todo derretido quando uma mão-cheia de gajos, vestidos com calções e mangas curtas, desafinam a plenos pulmões numa cançoneta cuja letra me incomoda mais do que me inspira sentimentos grandiosos? Que estranho sortilégio me liquefaz a razão e ma envia, misturada na bílis, para os confins de cavernas escondidas do meu corpo? Que sensação é esta de pertencer a algo que não sei nem posso descobrir que coisa seja por mais que busque e rebusque no meio das tripas e dos órgãos que me mantêm o sopro da alma a soprar na força que me dá a minha vida?

Só pode ser magia. Deve ser isto que se designa por magia. Uma coisa que se sabe que existe mas à qual não se lhe encontra explicação que a faça deixar de ser coisa e a transforme em nome decifrável no catálogo dos sentimentos humanos. Como acontece com as bruxas, que ninguém nelas acredita mas que todos sabem que por aí as há e por aí andam a engendrar os mais descabelados bruxedos.

Vou continuar a ficar estúpido de cada vez que o hino for cantado e as lágrimas me vierem visitar as fronteiras do olhar que deito ao mundo e que o mundo me reenvia para dentro deste ser que, imagino, eu sou, mas mal conheço. Estúpido, sim, mas limpo, estranhamente purificado.

5 comentários:

the dear Zé disse...

Meu, isso são ainda vestígios da contaminação do Estado Novo, do catecismo que inalaste na tenra idade da escola primária.É assim como o caldeirão do Obelix, caíste lá dentro quando eras piqueno e permanece para sempre...

Silvares disse...

Ah, então é isso!
:-)

peri s.c. disse...

Acho que somos todos sensíveis a estes arrepios provocados nestes momentos, mas nos recuperamos rapidamente e vamos cuidar de outras coisas.

Lina Faria disse...

Peri, não aquele coreano que se debulhou naquele choro convulsivo.
Aquele acho que até hoje não se recompôs.
Temos, sim, esse sentimento arraigado, mesmo lá no fundinho da caverna.

Silvares disse...

Peri, Lina, gostava de compreender um pouco melhor esse estranho para-lá-de-sentimento.