sexta-feira, janeiro 15, 2010

Romantismo, século XXI


Uma casa abandonada, negra por fora, como se as paredes tivessem sido pintadas com a noite, surgiu-me hoje na cabeça, já o dia se começava a despedir da chuva e do vento. O frio permanecia. Ler o jornal tem destas coisas. Saltamos de texto em texto, viramos as páginas e mudamos abruptamente de cenário e de argumento, com protagonistas muitas vezes sem face nem passado. A maior parte deles sem futuro. Amanhã o jornal irá para o saco de restos deste mundo com destino certo para o contentor da reciclagem.

Já me estou a perder. Foi a casa abandonada que me surgiu na cabeça a motivar este texto que não sei onde irá parar nem percebo muito bem de onde surgiu. Escrevê-lo é como passear numa ruela esconsa de um bairro pouco recomendável. Voltemos à casa arruinada.

A vida que ela já teve, a alegria que lhe iluminou as paredes por dentro e deixou sorrisos em quem passava na rua lá fora, tudo isso já nem recordações são. Restam apenas esquecimento e ervas daninhas, janelas partidas e portas desengonçadas. A casa está a meio caminho entre um passado remoto e uma eternidade a prazo.

A casa é uma metáfora do nosso planeta. E é isso que dói perceber. O mais certo é que lá fora, no espaço sideral, nem sequer passará nada nem ninguém que possa sentir saudade ou nostalgia do que fomos. E, mesmo que passasse, como iria recordar a humanidade ao olhar o nosso planeta decrépito e arruinado? Ao olhar a casa em ruínas quem se lembra das formigas?

8 comentários:

MUMIA disse...

CASA FANTASMA...parece até que as pessoas ainda ali existem,o que resta...
a nossa memória é mesmo lixada,
as recordações retornam sempre.

...a casa tem um muro em pedra granítica, é no NORTE?? Parece.

Beto Canales disse...

legal

MUMIA disse...

e persistem sempre...os FANTASMAS.

Anónimo disse...

me lembrei de uma frase do Martim Amis ao ler seu texto: ´Para onde vão os mortos? Para dentro do coração daqueles que os recordam.´
Adorei o texto
madoka

Lina Faria disse...

Silvares,
escrevi ontem um texto inspirado sobre o tema e não postei-o corretamente.
Enfim, a casa um mote recorrente em meu trabalho pessoal, é mesmo uma metáfora e tanto em relação à existência.
Vejo a casa como o próprio ser humano. Ambos vivem de energia e têm prazos limitados. É só uma questão de escala e tempo.

Silvares disse...

Mumia, fantasmas é o que por aí há mais!

Madoka, teremos nós corações suficientemente grandes?

Beto, já quase vivi todas aquelas vidas que você não viveu. Em breve darei notícia.

Lina, é um facto. Uma casa desabitada acaba sempre morrendo.

Olaio disse...

A verdade é q nem todos se lembraram do Haiti só agora, já há muito que se falava dele, tanto quanto o tempo desta canção do Caetano Veloso.
http://www.youtube.com/watch?v=TzlFn-Eq15w

Silvares disse...

Olaio, eu já me tinha lembrado e já me tinha esquecido e voltado a lembrar para logo depois esquecer mais uma vez. As raras notícias que nos iam cnegando desse país distante eram quase sempre relativas a corrupção política, atrocidades humanas e voodoo. Pouco mais.
P.S. Bons olhos te vejam :-)