Ao ler a crónica de Nuno Crespo para o Mil Folhas sobre a Feira Internacional de Arte de Madrid, com o título Arte ou mercado?, sente-se uma leve desilusão do escriba por não haver grandes novidades.
Desde que a originalidade se tornou um atributo do objecto artístico que há uma ânsia de surpresa difícil de satisfazer. O artista é visto como um inventor de formas inéditas, de técnicas inimaginadas, uma espécie de mago conceptual mais profícuo que a própria divindade.
Este desejo do inédito resvala com frequência para um discurso plástico vago e, predominantemente, formal. Num universo desta natureza, o pintor e o escultor tornam-se anacrónicos, as linguagens e técnicas clássicas perdem consistência e arriscam-se a ser fastidiosas para quem procure com avidez a tal novidade estonteante.
Os críticos, ansiosos por encontrarem uma obra que lhes permita estabelecer um discurso, também ele, inovador, acabam a escrever no vazio, a comparar o que vêm com aquilo que viram e o que desejavam ter visto (mas que não sabem se existe ou tem possibilidade de existir).
A consciência da História da Arte torna-se demasiado presente e demasiado pesada. A tentativa de fazer História (pelos artistas) e de narrar a própria História estando dentro dela (pelos críticos) é confundida com estranheza e originalidade. Uma obra que mereça referência (um acto histórico de quem faz e de quem narra) tem de ultrapassar as barreiras do "já visto" e do "já feito". Como se fosse possível, 100 anos depois, recuperar o espírito das grandes vanguardas artísticas do início do século XX. Não é.
Só a distância permitirá construir a História. Apollinaire fez a apologia dos pintores cubistas. Hoje falamos de Picasso e Braque nas aulas de História da Arte. Um pouco de Gleizes, mais de Juan Gris. Estaremos esquecidos de alguém? Haverá justiça nestas referências? Quantos artistas foram ignorados, quantos ficaram fora do comboio dourado dos mitos da arte contemporânea? Quantos não foram suficientemente arrojados para surpreender os olhos dos que escreveram a História daquele tempo?
Todos os anos haverá uma nova Arco, carregada de artistas excelentes que ali se deslocam para venderem os produtos do seu trabalho. Arte ou mercado? Quem se preocupa com isso? Afinal de contas a arte foi (e será) sempre um mero negócio mesmo quando os artistas se transcendem, para nossa felicidade.
Quem não vende não se vê.
Quem não se vê é como se não existisse (mesmo que exista).
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