segunda-feira, outubro 29, 2007

A China desperta


Zhang pintando um dos retratos que lhe vão garantindo fama e proveito

Xiaogang Zhang (http://www.saatchi-gallery.co.uk/artists/zhang_xiaogang.htm) é tido como o próximo Número 1 em termos de vendas no complexo universo da arte contemporânea. Num mundo fascinado por números com muitos zeros, ser o Número 1 na lista de vendas significa que as suas obras atingem preços quase incompreensíveis, difíceis de perceber com exactidão.
Mas Zhang, ao que consta, não vem sozinho. Há muitos outros artistas chineses que se perfilam para ombrear com os tradicionais norte-americanos, ingleses e alemães no Top dos mais valiosos e fazerem as manchetes dos jornais que deixam o público espantado com os preços astronómicos que os objectos de arte podem atingir.
Além da legião chinesa fala-se também de uma colecção de artistas indianos que andam a fazer das suas. É a confirmação do despertar do Oriente para o mundo contemporâneo e uma prova evidente de que o velho Império Ocidental, com os EUA à cabeça, começa a dar sinais de velhice e alguma fraqueza.
Hoje o mundo da arte, amanhã todos os mundos possíveis.

domingo, outubro 28, 2007

O festival que caminha


Todos os anos muda de lugar (talvez eu esteja a exagerar mas dá essa impressão). O FIBDA, Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora (http://www.amadorabd.com/) vai saltando de espaço em espaço, à procura daquele que melhor se adapte ao tipo de acontecimentos que o caracterizam. Este ano aterrou no Forum Luís de Camões, na Brandoa, naquele que parece ser um local apropriado para o seu formato. Espero que, atingida a maioridade nesta 18ª edição, o FIBDA tenha finalmente encontrado um poiso mais ou menos definitivo.

Visitei esta tarde o dito cujo, tendo podido observar algumas celebridades deste discreto meio. Lá estava Geraldes Lino, resplandescente de felicidade, como peixinho dourado em água de aquário esférico; José Ruy, debitando sabedoria numa mesa, rodeado de alguns senhores de provecta idade, tal como ele; Rui Zink, folheando comics num ritmo meio alucinado, como se procurasse algo de concreto e a coisa não fosse assim muito evidente de encontrar; e eu prórpio, estrela no meu filme particular, acompanhado de outras duas personagens míticas da minha existência: a minha esposa, incomparável no brilho, e a minha filha, uma vedeta inultrapassavel, desenhadora de créditos mais que firmados, autora de Banda Desenhada super-promissora (pai babado).

Enfim, entre vedetas conhecidas e desconhecidas, encontrei um espaço bem agradável, com exposições interessantes (a sala dedicada ao Salazar, agora e na hora da sua morte, da Cotrim e Rocha é um pequeno espectáculo). Como de costume tive uma extrema dificuldade em comprar o que quer que fosse. Por um lado a minha extensa colecção elimina de imediato uma boa quantidade edições de BD, nacionais e internacionais, por outro, aquilo que não tenho e me é oferecido é de tal modo vasto e apetecível que acabo num estado letárgico, impeditivo de abrir os cordões à bolsa.
Resumindo e para concluir: quem gosta de BD não perde, decerto, quem não gosta também não irá lá fazer nada. A não ser que decida tomar uma atitude semelhante aquela que o leva a entrar numa igreja mesmo quando não acredita em Deus... nem no Diabo.

sábado, outubro 27, 2007

Cromos

Num daqueles passeios indolentes que de vez em quando se fazem pela blogosfera fui dar de caras com este O BAÚ DOS CROMOS http://cromosvelhinhos.blogs.sapo.pt/.
Explorando um pouco o baú encontrei imagens que tinha guardadas lá para o fundo da memória. Jogadores de futebol como já não os há (notem bem o aspecto de lavrador alentejano do guarda-redes da foto que ilustra este post), fotos retocadas com céus de um azul plano ou corpos recortados e nítidamente colados sobre um estádio em fundo. Outra era mediática, de um mundo quase pré-histórico em termos tecnológicos.
Relembrei as cadernetas, a cola feita com farinha e água num tacho de alumínio com a ajuda do meu avô, caramba, um gajo vive tão pouco tempo e as coisas perdem-se completamente nos confins da memória. Depois vieram os cromos em papel todo janota, os tubos de cola Pica-pau (mesmo assim os bastões de cola já são coisa da minha idade adulta) e toda uma nova forma de encarar a colecção de cromos. Hoje os cromos são autocolantes, claro está!
Um gajo vive tão pouco tempo e as transformações do nosso quotidiano dão a impressão de que, afinal, vivemos uma eternidade. Vivemos?

quarta-feira, outubro 24, 2007

A Festa



Andamos a precisar de uma boa festarola. Copos... que digo eu? Garrafões de vinho! Garrafões? Pipos! Pipos de vinho a rolar estrada abaixo e bebedolas a rolar estrada acima, uns atrás dos outros em cantoria desenfreada. Uma banda de gajos corados como tomates a soprarem nos trompetes como se estivesem a precisar de cuspir os pulmões e risos desdentados e mãos grossas de calos de trabalho a segurarem os copos em gestos de graciosidade inesperada. Gestos de amor declarado ao vinho. Cânticos brejeiros, a roçarem a péssima educação e as mulheres a rirem-se de tanta pouca vergonha, com a cabeça deitada para trás na força da gargalhada. Ah, as saudades que já tenho de uma boa festa sem música gravada nem batidas automáticas. Festas sem bom gosto nem poses afectadas nem perfumes caros nem copinhos a arder. E a banda a tocar e os pares rodopiando na poeira do chão, abraçados no furor da dança. Andamos a precisar de nos sentirmos menos europeus de primeira e mais europeus verdadeiros, europeus do Portugal profundo. Felizes de tanta boçalidade e amigos do desvario. Onde andamos nós?

(por acaso a foto que ilustra este post foi tirada em Espanha pelo fotógrafo checo, se não estou em erro, Joseph Koudelka, no ano de 1971. Por acaso somos tão semelhantes... será apenas acaso? Ou será a tal Europa?)

domingo, outubro 21, 2007

Euroburocracia mata!


O designado Tratado de Lisboa é um péssimo exemplo da forma como a Democracia é encarada pelas cúpulas da União Europeia (ler mais em, por exemplo, http://noticias.uol.com.br/ultnot/lusa/2007/10/18/ult611u75399.jhtm)
Contornar a vontade popular numa questão desta envergadura mostra até que ponto a União Europeia é uma coisa e a Europa é outra, completamente diferente. Cada vez mais as decisões referentes à nossa vida são tomadas por um conjunto de burocratas mais ou menos desconhecidos e que se guiam por uma filosofia (chamemos-lhe assim) obscura e ditada ao sabor dos interesses dos grandes países europeus, nomeadamente a França e a Alemanha.
Não estou a ver bem como tudo isto irá acabar mas, com o tempo, esta União dos eurocratas irá definhar e morrer de morte mais ou menos natural.

Sem comentários




sábado, outubro 20, 2007

Gostar

Bacalhau à Portuguesa


"Os gostos não se discutem" é um dos ditados populares portugueses mais disparatados e serve de escudo protector a algumas das maiores imbecilidades que por aí se passeiam, vestidas de fato-e-gravata, como se não fosse nada com elas.
Como se não discutem os gostos, gosta-se de algo "porque sim" ou porque "é giro" e deixa-se de gostar "porque não" ou então porque "é feio" ou ainda, num modelo de maior refinamento, porque "não tem estética". E pronto, fica-se assim mesmo, podendo-se passar de imediato aos temas mais comuns como discutir se está calor ou faz frio ou se o Benfica é mais beneficiado pelos árbitros de futebol que o Sporting e o Porto juntos. Não se vislumbra que venha daqui grande mal ao mundo e, por isso mesmo, deixa-se passar impunemente esta falta de capacidade de gostar ou odiar verdadeiramente o que quer que seja por se considerar a indigência cultural algo de inofensivo.
Mas não é. A pobreza de espírito beneficia principalmente os que dela não padecem e a aproveitam para arrebanhar o pessoalzinho com conversas da treta faladas naquela linguagem simplória dos "porque sim, porque não, porque é giro e não tem estética". Chamam-lhe "linguagem popular" mas talvez devêssemos chamar-lhe "linguagem populista". É urgente complexificar o discurso, quanto mais não seja para aumentar a confusão que por aí vai.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Oh, Dali?

Ontem foi dia de viagem. Viagem de estudo, na companhia de colegas e alunos das turmas de artes da Escola Anselmo de Andrade, em direcção à cidade do Porto. Visita guiada à casa da Música e, mais tarde, à exposição de trabalhos de Salvador Dali, patente no restaurado Palácio do Freixo. (ler mais em http://jpn.icicom.up.pt/2007/08/01/arte_esculturas_e_ilustracoes_de_dali_no_palacio_do_freixo.html)
Quanto à visita à Casa da Música não há grande coisa a dizer. Tratou-se de travar conhecimento com um espaço arquitectónico curioso à qual faltou poder assistir a uma demonstração das capacidades acústicas da sala principal. Ficará para outra ocasião.
Relativamente à mostra de trabalhos do mestre dos bigodes loucos, deu para tomar o gosto ao seu universo destrambelhado, numa colecção de esculturas de dimensões variadas e uma vasta colecção de gravuras em diferentes técnicas. Ao contrário do que esperávamos não havia um único desenho mas sim litogravuras, pontas secas e xilogravuras, por vezes com apontamentos de cor aplicados após a realização da prova final (as chamadas monotipias).
É uma mostra bastante extensa, com trabalhos algo inesperados para quem está habituado a pensar nas "fotografias de sonhos" características de Dali. Imagens gestuais, com aplicações de cor arrojadas e marcadas por alguma gestualidade que não constituem imagem de marca do mestre.
Enfim, pessoalmente nunca fui um grande entusiasta do surrealismo de Dali, admiro muito mais o trabalho de Max Ernst, por exemplo, mas os jovens alunos que acompanhei nutrem uma admiração sem fim pelo homem dos bigodes esquisitos. Como a visita era a eles dedicada (aos alunos, não aos bigodes de Dali) penso que acabou por constituir um pequeno êxito.
Uma palavra final para o Palácio cujo restauro oferece ao visitante alguns espaços interiores barrocos com uma certa espectacularidade nos estuques dos tectos, nas pinturas murais e outros pormenores decorativos.
Uma visita a fazer, caso se ofereça a oportunidade.
Bibó Puarto, carago!

quarta-feira, outubro 17, 2007

Saudade

Há ocasiões em que tudo é posto em causa. Talvez as questões se tornem mais prememntes quando as coisas correm coxas das duas pernas. Talvez seja porque o calor nunca mais desaperta e começa a parecer demasiado, tanto Verão Outono dentro. Mas o que é um facto é que a eterna crise parece cada vez mais eterna e há sinais de que vai ainda ser afiada nos tempos próximos e ameaça doer a cada nova alfinetada.
Putin foi ao Irão fazer das dele. Com palavras venenosas conseguiu baralhar ainda mais as cabeças cá deste lado e, acredito, não menos baralhadas terão ficado as dos ayatolas, do lado de lá desta coisa a que chamamos mundo. Bush já dá sinais de birra eminente e não faz a coisa por menos: vai falando de uma 3ª guerra mundial caso o Irão avance com o fabrico da terrível bomba. Ameaças.
Querem lá ver que ainda vamos assistir ao regresso de uma Guerra Fria! Para ser sincero já vou tendo saudades dela. Sim, porque de Guerra Quente já estou mais que farto. Venha de lá essa velha guerra do diz-que-faz-mas não-faz~que-o-inimigo-ainda-é-pior-que-nós. Ah, que saudade!

segunda-feira, outubro 15, 2007

A guerra

A grande guerra, a derradeira batalha a travar não é contra outros seres humanos. Não é com outros seres humanos que temos de nos preocupar quando pensamos em termos de supremacia na crosta planetária. O nosso inimigo é de outra natureza e vive dentro de nós. É um inimigo silencioso e com um modo de vida tão diferente do nosso que não temos a mínima hipótese de organizar um plano de batalha credível, quando se aproxima para lutar. A grande guerra, aquela que já está em curso e que vamos perder é contra os vírus. No final eles serão os últimos sobreviventes, os grandes triunfadores. Na Guerra dos Mundos, H.G. Wells faz dos vírus os responsáveis pela derrota dos terríveis marcianos. São eles que dão mais uma oportunidade à sobrevivência da humanidade. Talvez por gulodice ou simples eficácia laboral. Os vírus são trabalhadores incansáveis e não consta que reclamem períodos de férias.
Eu sei que esta conversa está um bocado parva. Deve ser do vírus que está a lutar comigo. Uma simples gripe pode fazer um gajo ficar deitado e com dores durante todo o dia. Dores de merda, eu sei, e estar deitado sabe muito bem. Pronto. ATCHIM!!! Caraças. Belo dia de folga!

sábado, outubro 13, 2007

Efeito borboleta

A inauguração da nova igreja em Fátima é um acontecimento estrondoso. Se os pastorinhos nela entrassem decerto ficariam convictos de estarem a pisar o chão do Paraíso. E ninguém havia de os convencer do contrário.
Há 90 anos atrás as criancinhas da foto acima viram, algures na serra de Aire, "uma senhora mais brilhante que o sol" que identificaram como sendo a Nossa Senhora. Foi esta a sementinha que agora germina numa igreja devotada à mãe de Cristo, erigida com o dinheiro de esmolas e outras pias doações, pela módica quantia de 70 ou 80 milhões de euros (mais 10 ou menos 10 milhões é uma questão de pormenor) para glória de Deus nas alturas e espanto do Seu rebanho, cá em baixo, neste imenso vale de lágrimas que é o planeta Terra.
Não deixa de ser um desenvolvimento espantoso, um crescendo de fé imenso e espectacular. O altar da dita igreja parece-me, pelas imagens que tenho visto na imprensa e na TV, um cenário grandioso e ofuscante, coberto de ouro e representando figuras que evocam as formas artísticas das antigas basílicas bizantinas. Um misto de opulência estética e soberbo exibicionismo do poder da hierarquia católica, capaz de custear e mandar erigir tamanha monstruosidade e beleza. Com este templo regressa a velha questão: o dinheiro gasto na construção não poderia ser aplicado de um modo mais... católico?
Seja como for é mais uma imensa obra arquitectónica que abre as portas às multidões e lhes oferece visões de obras de arte que elevam este mundo a um patamar mais próximo do outro.

quarta-feira, outubro 10, 2007

Sinais

O comportamento do governo liderado por José Sócrates no que toca ao respeito devido pela liberdade de expressão e manifestação pública é, no mínimo, preocupante. Há sinais descarados da mais abjecta intolerância e começam a notar-se actuações e tiques autoritários que não imaginávamos serem possíveis num governo rotulado como sendo de esquerda.

A "visita" de dois agentes da polícia à sede de um sindicato de professores na Covilhã onde recolheram, abusivamente e à margem da lei, informação sobre uma acção de protesto legal a realizar naquela cidade por ocasião da visita do 1º ministro mostra que a cultura democrática está no balde do lixo deste governo.

Se a isto somarmos os comportamentos verificados no "caso" da investigação à forma como Sócrates obteve o seu grau académico de Engenheiro ou o célebre saneamento de Charrua na DREN ou ainda os processos disciplinares na estação de televisão pública e muitos outros comportamentos indignos de uma sociedade democrática baseada no respeito pelos direitos individuais e de cidadania temos fortes razões para nos indignarmos e protestarmos veementemente.

O monstro que tapa as bocas e pretende aninhar-se nos cérebros para lhes comer a liberdade de pensamento e amedrontar as pessoas anda por aí a rondar. Temos de lhe espetar um valente murro nos cornos e sacar-lhe as tripas para fora. Só quando o virmos agonizar com as tripas ao sol poderemos voltar a ficar descansados.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Negócios escuros como a água


Os desmandos dos mercenários das empresas privadas de segurança no Iraque fazem brilhar uma luzinha ténue sobre o "outro lado" da guerra. O tiroteio que envolveu alguns homens da Blackwater (http://www.blackwaterusa.com/) agitou a sombra e fez sair a cauda do bicharoco. Agora há muita gente por esse mundo fora a tentar perceber o aspecto do resto do bicho, a parte que continua em sombra promete muito nojo e repulsa.

Mas não será apenas no campo da "segurança" que as negociatas faraónicas são disputadas com ferocidade. Calcula-se que haja mais mercenários no Iraque que elementos das forças armadas americanas. Tudo o que tenha a ver com a reconstrução das infraestruturas mais básicas está ao alcance dos amigos dos invasores.

O espírito da coisa é básico: primeiro destrói-se tudo à força de bomba e tiroteio depois oferece-se o know how para voltar a pôr tudo de pé. Os países amigos dos americanos têm permissão para enviar os empresários melhor intencionados a fim de estabelecerem contratos com as vítimas. Por essas e por outras é que países sem recursos naturais importantes costumam agonizar às mãos de governos assassinos sem que ninguém mexa uma palha em sua defesa. Se esses ditos governos cleptocratas fizerem negócios com os USA estão a salvo da fúria justiceira (Angola é um bom exemplo). O Darfur não terá decerto nada que possa interessar nem cidades para reconstruir, por isso está condenado ao abandono. Se os bandidos no poder fizerem frente aos USA e tiverem, por exemplo, muito petróleo no interior das fronteiras, estão a meter-se em sarilhos. Normalmente acabam com as ruas feitas em cacos, as cidades passadas a ferro e as estradas e pontes passadas no picador da carne conjuntamente com fatias significativas das populações locais. "Culpados" e "inocentes", tudo misturado.

O exército não pode assegurar condições de trabalho em segurança a todos os abutres ao serviço dos "reconstrutores" que debicam o cadáver do Iraque e é aí que entram em cena esses abortos das democracias ocidentais que são as empresas privadas de segurança das quais a Blackwater nem sequer é a maior mas, apenas, aquela que pôs o rabo de fora.
O slogan na imagem promocional da Blackwater que ilustra este post é um verdadeiro hino à hipocrisia. Ou talvez não. "Para garantir liberdade e democracia por toda a parte", diz.
Cada vez mais faz sentido o princípio de Orwell em "Animal Farm" ("O Triunfo dos Porcos" na versão portuguesa) "Os animais são todos iguais mas uns são mais iguais que outros".

domingo, outubro 07, 2007

1408 - O Filme

1408 é um filme de terror baseado num conto de Stephen King (http://www.stephenking.com/) o verdadeiro King das adaptações cinematográficas. São às dezenas os filmes que vão buscar assunto à cabecinha pensadora deste escritor que cria histórias fantásticas com a mesma naturalidade com que qualquer um de nós descreve o que comeu ao pequeno-almoço. Um poço sem fundo, a imaginação do Stephen. O realizador é Mikael Håfström do qual conhecia apenas Derailed (http://www.weinsteinco.com/derailed/ Pecado Capital na versão portuguesa) um filme envolvente e bem conseguido com um excelente Clive Owen a liderar a função.
Em 1408 temos outro actor em bom plano, John Cusack, capaz de levar o espectador a entrar no assustador mundo que se esconde por trás da porta daquele quarto de hotel novaiorquino. O filme resulta bem, tem momentos arrepiantes e coloca em cena alguns clichés do horror movie com bastante eficácia. Como espectador saí da sala de cinema mais ou menos igual. Não me encheu as medidas, não transformou a minha visão sobre nenhum assunto particularmente importante nem me fez tremer de medo. Divertiu-me, isso sim, até porque as minhas acompanhantes, mulher e filha, completaram na perfeição o que ia passando no écrã. Numa escala de 0 a 5 estrelas, como nos hotéis, dou-lhe 3. Pela limpeza e pela arrumação.

O aviso de Farag, por Paulo Moura

Na edição de hoje do Público saiu este texto de Paulo Moura. Como sempre é um texto interessante e que nos põe em contacto com o Outro Mundo em que Moura viaja e do qual nos dá notícia com as suas prosas. Para ler e meditar.

Farag Foda foi um muçulmano lúcido e cora­joso. Desculpem, mas ele chamava-se mes­mo assim. Alguns autores ainda optaram por uma versão um pouco diferente, em inglês, do apelido - Fawda. Ou Fouda em português.
Mas logo apareceram os puristas a criticar: a forma ortográfica correcta deste nome árabe nas línguas de origem latina e germânica é Foda.
Não obstante, Farag era professor e um intelectual sério. Envolveu-se em causas humanitárias e escreveu vários livros e artigos de opinião na imprensa do Egip­to, onde nasceu, em 1946. O seu tema preferido foi o fundamentalismo islâmico e o seu género literário preferido a sátira. Nos dois, Foda fez História.
A sua tese principal, pelo menos a mais conhecida, era a que de que os integristas, terroristas, teóricos sa­lafistas e outros radicais do islão tinham um problema em comum: a frustração sexual. Seria por não terem acesso aos ternos prazeres da carne que se entregavam à paixão da carnificina, dizia Foda. E acrescentava (neste caso referindo-se a Abd al-Hamid Kishk, um dos mais populares pregadores radicais egípcios): "Ele diz à sua audiência que os muçulmanos que entrarem no para­íso usufruirão de eternas erecções e da companhia de jovens rapazinhos envoltos em laçarotes e enfeites."
É verdade que Farag citou a prédica do velho xeque cego Kishk, para a seguir contar como a mes­ma deu origem a um deba­te entre os teóricos. Nem todos concordaram com Kishk. Um deles, da Uni­versidade estatal al-Azhar, contra-argumentou que, no paraíso, as erecções não seriam eternas, mas sim temporárias, ainda que prolongadas. Outro contestou a possibilidade da pederastia no paraíso. Mas houve quem lembras­se que, embora a homossexualidade fosse desaconselha­da, a pedofilia não era proibida, citando uma passagem do livro do Ayatolla Khomeini, do Irão: "Um homem pode ter prazer sexual com uma criança, até mesmo com um bebé. Pode sodomizá-Ia, mas não penetrá-la. Se dessa forma danificar a menina, ficará responsável pela sua subsistência, por toda a vida. Esta rapariga, no entanto, não contará como uma das suas quatro mulheres permanentes. E o homem não terá direito a desposar uma irmã dela.”
A propósito, outro estudioso fundamentalista re­cordou esta passagem do mesmo livro de Khomeini: "Um homem pode ter sexo com animais como ovelhas, vacas, camelos, etc. No entanto, deve matar o animal depois do orgasmo. Não deve vender a carne ao povo da sua própria aldeia. já vendê-la ao povo da aldeia mais próxima não é proibido."
A respeito desta fecunda polémica, Foda comentou: "É isto que preocupa os muçulmanos no final do século XX? O mundo à nossa volta anda ocupado com a con­quista do Espaço, a engenharia genética e as possibi­lidades dos computadores, enquanto os doutores do islão se preocupam com o sexo no paraíso."
Em Junho de 1992, Farag Foda foi assassinado por dois fundamentalistas islâmicos do grupo AI Gama'a aI Islamiya. O advogado de um deles explicou numa entrevista, quando interrogado sobre a sua ideia de Direitos Humanos: "Farag Foda tinha o direito humano de criticar o Governo ou de o criticar a si. Mas não tinha o direito de criticar Deus. Somo escravos de Deus e Ele tem o direito de nos condenar à morte, se o insultamos."
Contra Deus não há direitos humanos.

sábado, outubro 06, 2007

Aprender a aprender




Parece-me um pouco absurda a forma como a imprensa aguarda impaciente cada novo discurso de cavaco Silva. Como absurdas me soam as notícias fresquinhas que logo correm as nossas praças após a presidencial faladura.

O Actual Presidente da República é olhado como uma espécie de oráculo, um pensador ponderado e com profundidade oceânica, atributos que nunca antes teve nem é agora que lhe vão nascer no cérebro como flores primaveris para alegrarem a nossa sina modorrenta. O discurso de Cavaco no dia de ontem trouxe particular agitação pelos conteúdos relacionados com o eterno calcanhar de Aquiles da velha nação portuguesa, a educação. Note-se que a dita educaçaõ foi muito maltratada pelo Cavaco 1º ministro e parece agora preocupar sobremaneira o Cavaco presidente da república. Mudam os tempos...

Cavaco afirmou que temos falhado na formação dos jovens portugueses e que esse é o principal problema a resolver. Permito-me acrescentar que a educação dos adultos também se tem revelado um desastre completo contribuindo igualmente para este marcar de passo que nos mantém sempre no mesmo ponto, o ponto de partida. O nosso presidente é, ele próprio, a prova viva desse falhanço. A crença boçal na desnecessidade de "aprender até morrer" faz dos portugueses um povo de potenciais retardados culturais. Basta olhar para os níveis de escolaridade das nossas classes trabalhadoras para percebermos que não é apenas nos bancos das escolas que existe carência de trabalho intelectual.

A educação é um desígnio fantasma de Portugal e dos seus tristonhos habitantes. Dos mais pequenos tanto quanto dos maiores. Em termos de ignorância e falta de entusiasmo pelo conhecimento os filhos são a carinha chapada dos seus pais.

sexta-feira, outubro 05, 2007

Querida televisão

A minha televisão é a única companhia com que posso contar. É com ela que tomo o cházinho e com ela converso sobre as questões que incomodam o dia-a-dia que a mim já nada me incomoda a não ser a solidão. A jarrinha com flores serve-lhe de chapéu. Dá-lhe um aspecto bem patusco. Mas ela não se importa, encaixa bem a brincadeira. Sabe o apreço que por ela tenho. É quase amor. Sei que não se ama um objecto da mesma forma como se ama uma pessoa. Mas já não há pessoas reais na minha vida, só as pessoas que me visitam através do écrã da minha televisão. Ofereço-lhes uma xícara de chá, um bolinho, dois dedos de conversa. Por vezes sinto que a televisão me olha e se enternece comigo. É uma boa amiga. Fiel, discreta no trato e conversadora incansável. Conta-me histórias e eu retribuo com atenção e silêncio. É uma relação perfeita. Sem segredos nem mistérios. Dias a fio ali estamos, uma em frente da outra, esperando que o tempo passe. E que um dia me leve.


quarta-feira, outubro 03, 2007

A falha

O sistema democrático é o nosso sonho mas toma cada vez mais a aparência de um tremendo pesadelo. Um dos problemas mais complicados e que parece impossível de resolver prende-se com a escolha dos dirigentes para cuidarem com o desvelo necessário da coisa pública.

Os regimes monárquicos tinham o problema resolvido. Os dirigentes nasciam assim mesmo, com selo de garantia carimbado pelo próprio Deus, eram os seus representantes na Terra e faziam o Seu trabalho por estas bandas. Assim, para o bem e para o mal, os reis e rainhas eram parte do impenetrável Plano Divino e caso algo corresse às avessas era porque Deus assim queria e nada havia a fazer quanto isso. Ele escreve direito por linhas tortas e o Tempo se encarregaria de demonstrar a bondade e a infalibilidade do sistema. Como o Grande Arquitecto estava a orientar a cena os comuns dos mortais tinham apenas de confiar e seguir as suas vidas com confiança e, acima de tudo, animados por inabalável Fé.

Depois deram-se as Revoluções Americana e Francesa, acabou-se com o Antigo Regime e os reis, fossem sóis ou outra estrela qualquer, passaram a personagens secundárias sendo, nos dias de hoje, pouco mais que objectos decorativos dos regimes a que chamamos democráticos. A Deus passou a dar-se o que é de Deus e a César o que é de todos nós.
200 anos a construir sistemas democráticos ainda não chegaram para encontrar a pedra de toque que transforme os governantes escolhidos pelo povo em pessoas de bem e com cabeça para controlar a contento os negócios do Estado. Uma Democracia precisa de ser capaz de gerar elites dirigentes que sejam isso mesmo: elites e não meros sabujos disfarçados de gente séria. Acreditamos que num sistema social justo despontarão pessoas capazes de perpetuar a justiça de forma equilibrada mas não parece que estejamos a ser particularmente felizes na concretização desse objectivo. O que tem faltado? Porque ficamos com a sensação de que, uma vez sentados na cadeira do poder, aqueles que elegemos com renovada esperança se transformam em gajos falsos como nem Judas terá alguma vez sonhado vir a ser? O que está a falhar no nosso sistema político e social?
Bom, esta pergunta é de tal modo desmesurada que o melhor é ficar por aqui e regressar mais tarde ao assunto.

terça-feira, outubro 02, 2007

Sem título


Forçar os limites do dia é o trabalho do homem comum. Empurrar a rotina, lutar com o relógio, endireitar as costas no esticar do queixo. Os carros passam, um pássaro esquce-se de piar ás 8 da manhã. Não há que recear o erro nem temer o sabor amargo do café matinal. A vida é para ser vivida. Cada minuto conta. Todos os minutos de cada dia. Dentro do carro ouvindo as últimas sobre a fila de trânsito ali mesmo à frente. A sujar as mãos na tinta do jornal e a sola do sapato na caca fresca deixada no passeio pelo caniche da vizinha. É assim que um homem comum encara a vulgaridade da vida. O erro, quando surge ao virar da esquina, não é mais nem menos que uma hipótese, uma outra oportunidade de fazer uma coisa com aparência de ser bem feita. Os homens extraordinários habitam os corpos dos homens comuns. Estão ali, à espera. Mais tarde ou mais cedo eles aparecem. E vêm tomar o café matinal contigo.

segunda-feira, outubro 01, 2007

Vulgares como pares de sapatos


A publicação da acta de uma conversa entre Bush e Aznar a propósito da melhor forma de iniciar a guerra no Iraque mostra a vulgaridade com que um assunto desta gravidade pode ser tratado. Preocupados principalmente com o modo como poderiam "dourar a pílula", os dois estadistas (chamesmos-lhes assim) vagueiam num discurso rasteirinho e pouco edificante. Não há uma frase ou uma ideia que ultrapassem a visão do merceeiro preocupado em manter as aparências a despeito da qualidade dos produtos que trafica. A podridão não preocupou estes dois, apenas os seus interesses directos. A mentira foi tratada como se fosse verdade.
Salta à vista a forma grosseira como Bush imaginava o desenrolar da guerra e as benéficas consequências da invasão para o povo iraquiano. Como erro de cálculo não deixa de ser um verdadeiro monumento à estupidez!

O pormenor da escolha dos Açores como sede da célebre "cimeira da paz" (esta até dá vómitos) em detrimento das Bermudas é, talvez, o traço mais relevante da grandeza de espírito destes homens. Aznar preferiu os Açores às Bermudas porque "(...) o nome destas ilhas que se associa a uma peça de roupa não é exactamente o mais adequado para a gravidade do momento." Fica bem patente o sentido do espectáculo que animava o antigo 1º ministro espanhol, preocupado com as aparências visto que em termos de conteúdo nada havia a fazer senão tentar iludir o pessoalzinho.


Assim foi, assim se fez. Os anfitriões dessa cimeira de má memória foram Durão Barroso e Paulo Portas, 1º ministro e ministro da defesa do nosso país nessa data, os idiotas úteis de serviço.

Depois deste frete aos poderosos senhores da guerra, Barroso tornou-se Presidente da Comissão europeia e Paulo Portas fez um branqueamento à dentuça não sem antes ser condecorado em Washington pelo bandido Rumsfeldt, por bons serviços prestados à causa da guerra no Iraque. Conclui-se que ser idiota neste mundo cão acaba por compensar, desde que se seja idiota no lado certo do planeta.