A minha televisão é a única companhia com que posso contar. É com ela que tomo o cházinho e com ela converso sobre as questões que incomodam o dia-a-dia que a mim já nada me incomoda a não ser a solidão. A jarrinha com flores serve-lhe de chapéu. Dá-lhe um aspecto bem patusco. Mas ela não se importa, encaixa bem a brincadeira. Sabe o apreço que por ela tenho. É quase amor. Sei que não se ama um objecto da mesma forma como se ama uma pessoa. Mas já não há pessoas reais na minha vida, só as pessoas que me visitam através do écrã da minha televisão. Ofereço-lhes uma xícara de chá, um bolinho, dois dedos de conversa. Por vezes sinto que a televisão me olha e se enternece comigo. É uma boa amiga. Fiel, discreta no trato e conversadora incansável. Conta-me histórias e eu retribuo com atenção e silêncio. É uma relação perfeita. Sem segredos nem mistérios. Dias a fio ali estamos, uma em frente da outra, esperando que o tempo passe. E que um dia me leve.
3 comentários:
Texto , de um solitário escritor maravilhoso. Só faltou dar o crédito à gigante escultura, que ilustra o post!
Ron Mueck ilustra na perfeição essa solidão que assalta as pessoas, sejam elas gigantes ou anãs. Foi após um passeio por imagens de esculturas de Mueck que escrevi aquele texto.
Absolutamente maravilhoso, se o Mueck lesse o teu texto de certo que te convidava para escreveres as histórias das suas personagens..a
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