"Cada coisa tem a sua palavra; pois a palavra própria transformou-se em coisa. Porque é que a árvore não há-de chamar-se plupluch e pluplubach depois da chuva? "
Realmente... porque não?
Estas duas frases, retiradas de um manifesto dadaísta da autoria de Hugo Ball escrito em Zurique a 14 de Julho de 1916, ganham uma estranha consistência de cada vez que as leio.
Porque as coisas deixam o anonimato quando se lhes cola uma palavra que as traga para a luz do dia mas, logo a seguir, podem regressar ao limbo pré-objecto caso o conceito associado não se materialize com a força de uma mousse de chocolate na mente do leitor (ou do pensador ou do varredor de ruas com calos nas mãos e buracos nas solas dos sapatos).
Então poderemos ficar preocupados. Plupluch? Pluplubach!? Caramba, meu velho senhor Ball, que raio de ideia a sua. Então não vê logo que uma palavra é tão concreta e verdadeira que quando dizemos "árvore" estamos logo a pensar "na" árvore? Em qual? Naquela, com tronco castanho e uma copa verde-bem-verde, como nos ensinam na escola primária as professoras enfastiadas quando insistimos que o tronco pode ser branco e a copa amarela e vermelha. Que devemos estar tantãs, que tolice, que é uma ideia estapafúrdia. Mesmo que seja Outono e já haja árvores sem folhas nem nada que se pareça.
Para as professoras, primeiras defensoras do senso comum a sistematizarem o nosso pensamento (a diluirem o individuo que somos na massa amorfa que haveremos de vir a ser), é óbvio que uma árvore tem aquelas cores e não outras por muito que saibam que é uma mentira tão estúpida quanto aparentemente inocente.
O senso comum torna tudo óbvio para não ter que discutir seja o que for. Temos aí a raíz de muitos males e maleitas intelectuais. Mas não há-de ser nada. A gente sobrevive e ainda tem tempo para comer uns caracóis lá mais para o fim da tarde, na esplanada sob a copa das árvores (seja lá qual for a cor delas!).
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