quinta-feira, julho 20, 2006

Senso comum

Ele há coisas do diabo que o senso comum não ajuda a explicar pois escapam-lhe como enguias a fugirem de um barril de escabeche numa barraca na Feira de São Mateus. Traduzir dos filmes ingleses a expressão "Common sense" para "bom senso" na versão portuguesa mostra bem o alcance patriótico da nossa mítica falta de rigor na avaliação do mundo e do resto. Mas é prática corrente.

Talvez isto ajude a explicar porque continuamos a ser um povo maioritariamente indiferente a quase tudo o que nos rodeia, com picos de histeria colectiva na redescoberta das grandezas perdidas da nação em pleno relvado, sempre que entra em campo a equipa de futebol da selecção nacional. Eu fico meio histérico, para que conste, e isso leva-me a reflectir sobre tais momentos de insanidade.

Deixamo-nos enganar por qualquer papalvo que a isso se disponha e admitimos que um tipo como Alberto João Jardim possa ser chamado "governante" sem cuspirmos imediatamente para o lado com um gesto de "te arrenego, abrenúncio" feito de imediato e com rapidez. Esse ser vivo é uma boa imagem do "common sense" à maneira dos tradutores portugueses.

Ficamos passivos perante a maior parte das injustiças e atropelos da legalidade desde que não sejamos nós as vítimas. Apenas fomos capazes de nos unir por uma causa como a de Timor, talvez porque era lá longe e temos no sangue o fado e a saudade, esses produtos únicos e genuínos da portugalidade mais inflamada.

Com Timor a desfazer-se aos bocadinhos (porque é um território pequenino não se desfaz aos bocados) e o Mundial a atormentar-nos os ímpetos nacionalistas ficámos mais ou menos indiferentes à sorte de Xananas e Alkatiris uma vez que essas contas já haviam sido saldadas no passado com canções e lágrimas sinceras.

A lista das coisas que não enxergamos ou nos fazem apenas voltar para o lado é imensa. Durão Barroso viu, na tristemente célebre Cimeira da Guerra dos Açores, provas inequívocas da existência de armas de destruição maciça no Iraque. Paulo Portas confirmou-o. Hoje um é Presidente da Comissão Europeia e o outro foi condecorado por Rumsfeldt, essa espécie de nazi démodé. E nós? Encaramos a coisa como sendo um espelho de "common sense", não estranhamos nem respingamos. Afinal o mundo está repleto de personagens dispostas a representarem o papel de idiotas úteis. Ou inúteis, conforme a perspectiva.

Deixamos o mundo rodar à vontade e rodamos com ele. Como a rotação é lenta não é nada que nos deixe tontos. Somos o país onde o senso comum é considerado bom senso.

Pois.

2 comentários:

Anónimo disse...

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