domingo, julho 11, 2010

Correcção incorrecta

(clica na imagem para ler o texto)
esta ilustração foi encontrada aqui
A expressão "políticamente correcto" parece ter, cada vez mais, uma conotação incomodativa. Fica a sensação que poucos têm vontade de ser vistos como "políticamente correctos", como se isso fosse uma doença comportamental ou, pelo menos, uma forte enxaqueca da consciência.

Ser políticamente correcto é ser chato, bota-de-elástico, menino de coro e pé-de-salsa, é não querer chamar as coisas pelo nome, é tentar embrulhá-las num papelinho brilhante e cor-de-rosa para que aquilo que é pareça não o ser, não deixando de sê-lo. O políticamente correcto consiste num processo de complexificação da linguagem que pretende fazer prevalecer a aparência sobre o essencial da essência.

Quando surgiu, o conceito de "políticamente correcto" depressa inundou a forma de expressar a nossa visão do mundo circundante. Coisas que sempre foram ditas passaram a não poder dizer-se para que não houvesse riscos de sermos mal interpretados já que, à luz do "políticamente correcto", essas coisas soam mal, soam erradas. O políticamente correcto é um processo de minagem dos campos da expressão individual que espalha pelo mundo milhares de consciências estropiadas por rebentamentos inesperados.

Mas a coisa parece estar a mudar. O políticamente correcto está a perder aquela aura beatífica que o conduziu a um triunfo temporário e começa a soar mal. Tudo o que abusa do equilíbrio acaba por se desiquilibrar também. O abuso da paciência do povo, que gosta de falar como lhe dá prazer sem policiamento expressivo, vai acabar por cavar o buraco onde será enterrado o políticamente correcto.

A liberdade ainda continua a ser o que era e não há outra maneira de nos referirmos a ela. Já que não temos muitas outras formas de expressar a nossa liberdade individual, o uso despreocupado da linguagem triunfará sobre a pesada visão do políticamente correcto. E, depois das palavras, os actos. Em breve o políticamente correcto será absolutamente incorrecto.

4 comentários:

Anónimo disse...

No que toca aos absurdos do " políticamente correto" estou completamente de acordo. Com sua reversão, tenho lá minhas dúvidas! A história caminha para frente!
Tomei a liberdade de levar seu ótimo texto para o NOVO blog Sociedade Anônima ( http://domingoamigo.blogspot.com/ ) ( que ainda não teve a honra de te-lo participando ) e para o Varal de amanhã!

Lina Faria disse...

Sempre achei horrivel quererem engessar um modelo moral, uma linguagem padrão. Globalizar conceitos é o próprio preconceito.
Concordo total, Silvares!
Nós fazemos a história à nossa cultura e sensibilidade, ponto!

Olaio disse...

Uma coisa que me dá piada é publicamente os politicos não se poderem referir às afirmações dos outros como mentiras, tem que se dizer; "a afirmação que o sr. produziu é uma INVERDADE!",... não é bonito?

Silvares disse...

Eduardo, a História caminha prá frente mas, de vez em quando, dá umas voltinhas estranhas. O políticamente correcto é uma aberração, não pode crescer mais do que isto.
:-)
Fico-lhe grato pela divulgação dos textos do 100 Cabeças. Disponha sempre.

Lina, temos de defender a nossa liberdade com unhas e dentes. Sempre.
:-D

Olaio, essa é das mailindas!!!
:-P