Nós somos uns coraçõezinhos felpudos. Uns ursinhos de peluche sentimentais, ansiosos por uma boa celebração que nos aqueça a alma colectiva. Como a nossa selecção veio recambiada nos oitavos-de-final, aviada pela selecção espanhola, ficámos logo a rezar para que fossem "nuestros hermanos" a trazer a taça. Assim sempre poderíamos dizer que só perdemos com os campeões do mundo (o que é verdade), mitigando a decepção do adeus à boa maneira portuguesa.
Não é nada de mais, como português que sou compreendo isto perfeitamente. Ainda melhor compreendo que a beijoca que Casillas prespegou na namorada em directo, na entrevista após o jogo da final, seja considerada unânimemente a mais bela jogada de todo o campeonato do mundo da África do Sul. Foi, de facto, um momento memorável e inédito no mundo do pontapé-na-bola.
Conhecendo como conheço o nosso coração colectivo, não estranhei as emissões em directo nos telejornais cá da terra das celebrações populares em Madrid, na recepção à equipa campeã do mundo. Olhei o écrã da televisão e vi aquele agitado mar de gente eufórica como se fosse gente da minha gente. Afinal de contas a Península Ibérica já antes dividiu o globo terrestre em duas partes. Uma parte para ti, Espanha, outra para mim, Portugal. Não restava nada para mais ninguém, o mundo já foi todo nosso. José Saramago afirmou várias vezes que via com bons olhos um único país a cobrir toda a Península, como um cobertor gigantesco a aconchegar uma grande família ibérica. Posso mesmo dizer que compreendo muito mais que razoávelmente um livro escrito em espanhol. Isso conta.
Tretas!
Lá no fundo a transmissão televisiva das celebrações espanholas são apenas um reflexo de inveja. Mesmo que fôssemos um país apenas não haveríamos de prescindir nunca da nossa portugalidade que é uma espécie de espanholice, mas com menos salero e muito mais tristeza alapada aos costados. Olhei os espanhóis aos pinotes, todos bêbados e tresloucados, pensando como gostaria de estar no lugar deles. Mas o que me doeu mais fundo foi o facto de Cristiano Ronaldo, o nosso ídolo nacional, ter de pagar a uma rapariga para ter um filho dele e dar aquelas imagens de mau perdedor e rufião de quinta categoria, quando o capitão espanhol tem aquele momento fora do mundo ao beijar apaixonadamente a namorada perante o olhar embevecido do universo inteiro. Será aqui que se encontra a dura fronteira entre Portugal e Espanha? Entre ser português e ser espanhol? A manifestação da paixão?
Ai, isto dói muito mais que ter perdido o jogo com a selecção espanhola. Isto é muito melhor que ser campeão do mundo. Já nem sei que digo!
6 comentários:
Olá, não saberia responder a suas indagações, mas adorei a sua postagem e esse beijão do goleirão espanhol na namorada. Concordo que foi realmetne uma grande jogada! Abraço.
Silvaroste, esse argumento que justifica a derrota num torneio por se ter perdido com o vencedor parece-me um juízo de cartomância. À partida não se sabe quem é o vencedor, a não ser que se acredite num destino obscuro que colocou antecipadamente uma ordem no que parece de conclusão problemática. Eu sei que o argumento não é teu. Mas foi um tipo de raciocínio repetido sistematicamente, há uns tempos atrás, nos média. Felizmente deixaram-se disso, porque é bacoco e não justifica nada. E se fossem, por uma sorte danada, os portugueses a vencerem a eliminatória? Os suíços conseguiram-no, como se justifica o seu afastamento? Não estava escrito?
O Ronaldo só é modelo como futebolista e, vá lá, como vendedor de cuecas! De resto é uma personagem quase analfabeta que conseguiu chegar ao estralato. Não se pode esperar uma conduta coerente e pensada. Como sabes, estes são os equívocos da imprensa popularucha e da política desportiva... Popularucha.
Bobagem. Meu sangue latino, é claro, torceu pela Espanha.
Viva a latinidade! Viva os caliêntes hormônios latinos e o beijo do casal love da Copa!
*ah, mas eu ia falar da questão cultural e relembrar outras histórias de beijo, como o do Richard Gere na atriz indiana.
Pegou mal!
Enfim, como diria vovô Eisten...
Ei, que engraçado, sumiu meu primeiro parágrafo sem o qual o resto do comentário ñ faz sentido:
Muitos no Brasil, por esse raciocínio de torcer para o único que o venceu, foi de Holanda.
Bobagem. Meu sangue latino,...
sorry.
Lais, um momento pouco habitual no universo algo espereotipado do futebol...
Luis, pois, não é no futebol que encontramos os exemplos mais edificantes.
Lina, também desejei a vitória da Espanha. Quanto mais não fosse por razões de ordem política. Se a Alemanha ganhasse o campeonato a União Europeia iria ficar um pouco mais feia.
:-)
Belo texto!
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