Relógio coberto de jóias celebrando o nosso amor pelos animaizinhos em via de extinção
Aos Domingos os jornais tornam-se coisas esquisitas que têm de ser metidas em sacos de plástico. Revistas, suplementos, cadernos publicitários, etc., nos jornais de Domingo cabe tudo sem deitar por fora. Nesta época consumista ainda surgem conselhos e ideias para comprar prendas, normalmente conselhos dirigidos a consumidores de produtos de luxo. Relógios de ouro, malas de senhora impossíveis, pulseiras com diamantes ou outras inutilidades de variados aspectos, no valor de centenas (senão milhares) de euros, em suplementos impressos em papel encerado e com fotos especialmente fabricadas para enternecer o olhar dos ricos que se enternecem (penso) com imagens que possam estimular os seus anseios de ostentação de poder económico.
Este Domingo a 1ª página do Público é arrepiante. "Nova geração de alcoólicos tem menos de 30 anos", "Endividamento chega às compras do dia-a-dia", "Portuguesa detida (em Espanha) a tentar comprar bébé" e "Sem-abrigo, Têm trabalho, têm ordenado mas não conseguem pagar uma casa para viver". Chiça penico! Só desgraças. Vários retratos tenebrosos das assimetrias que vão corroendo por dentro a nossa Democracia. A coisa não está famosa.
O que se passa? Falta aqui alguma coisa (muitas coisas). O que provoca estes desiquilíbrios nas pessoas, nas relações entre elas e na relação que estabelecem com a sociedade? Há quem pense que devemos voltar-nos de novo para Deus, buscando um sentido espiritual para a existência que nos possa oferecer algum alívio. Há quem pense que devemos entregar as rédeas a um poder centralizado que regule tudo com mão de ferro, pondo na ordem os ricos e os pobres. Há quem proponha que se deixe tudo como está, confiando na sorte e na mítica capacidade de auto-regulação dos mercados. Olhando para o panorama sinto um certo desamparo.
Vivemos num mundo regulado pela política económica mas não temos políticos capazes de se aguentarem na crista desta onda gigantesca , nem temos economistas honestos que resistam ao apelo do capital selvagem. Qual é a solução? Queimar tudo e recomeçar de novo? Tentar remendar este tecido sócio-económico todo esburacado que a globalização vem tecendo? Haverá solução?
Temo que tenhamos alcançado o extremo da nossa capacidade de resistência neste modelo civilizacional. Sempre me intrigou o crescimento económico em flecha, o conforto obtido através do consumo não estica mais, algo vai ter de quebrar. Talvez tenhamos de rever, em breve, os nossos objectivos mais imediatos e quotidianos. Talvez tenhamos de refrear o consumo de bens que, agora, nos parecem inquestionáveis, recuando em termos de conforto e lazer. Talvez tenhamos de diminuir o nosso bem-estar se quisermos manter alguma qualidade de vida. Ou isso ou um estoiro monumental. Sinto-me um profeta da desgraça.
10 comentários:
Um pouco mais do mesmo!
(;-(...............andas muito pessimista!
Pense um pouco no emprego dessa gente toda que faz o braçalete, que prepara o anúncio, que rodam as impressoras, que ensacam os jornais e revistas, que distribuem de casa em casa!...tem muito emprego envolvido!....(:-)
O rastilho já começou. França 2007, agora foi a Grécia com uma chama olímpica que queimou para fora das suas fronteiras. Talvez seja isso que faz falta: uma enorme pira funerária.
Silvares...sou otimista por natureza...mas acho que 2008 vai entrar para a história como o ano de nossa era em que o mundo MUDOU...ou foi obrigado a MUDAR...viver para ver!
Eduardo, é nesses mesmo que estou a pensar. Esses empregos são mesmo necessários? Quando começarmos a cortar nas coisas supérfluas os ensacadores de revistas serão dos mais desprotegidos. Mas, tem razão, estou demasiado pessimista. As coisas têm sido pouco brilhantes e a obrigação de ver tudo pelo lado bom já não me convence. Pode ser que isto passe.
Ogre, duvido que a coisa pegue tão forte aqui por estas bandas mas, nunca fiando! Os portugueses ainda estão a aprender a ser pobres no mundo da abundância. Quando tiverem aprendido o suficiente para se tornarem ricos é possível que a abundância acabe. É o Fado do costume.
Ví, penso que o nosso modo de vida terá de se simplificar, teremos de ser menos consunistas. E não há nada de moralista nesta perspectiva, apenas estou a ser realista. Vivamos.
:-)
Silvares,
a crise, ou a visão do que podera ser a propalada crise, tem intensidades e visibilidades distintas. Uma coisa é nos USA, outra no JAPÃO, uma terceira na Europa ( com suas particularidades especificações, de pais a país) e aqui na America do Sul, mais especificamente no Brasil, onde os Bancos, e as empresas, além das contas do governo estavam bem, e o povo trabalhando e consumindo para manter a roda girando. Aqui ainda não sentimos na carne. Mas sei que iremos sentir com o reflexo do mercado global. Mas não vemos a coisa tão preta quanto vocês!
Por estes lados a coisa já não estava muitofamosa mas agora está mesmo a escurecer. O desemprego aumenta brutalmente, o estado injecta dinheiro dos contribuintes em bancos privados para tapar buracos provocados por capitalistas sem escrúpulos, o poder político parece incapaz de saber o que fazer e a economia entra em nítida recessão. Está a acontecer um pouco por toda a Europa.
Você não é um profeta da desgraça, você observa, é sensível e tem o dom de estar atento ao mundo de uma forma que 90% da população não está e é por isso mesmo que o mundo está precisando de uma descarga... sim, é isso mesmo, uma descarga pra ver se essa porcaria desse pelo cano... A gente tem poucas chances agora de sair "bem dessa"...
Isso só vai acontecer quando deixar de haver bens nas preteleiras do supermercado.
Eduardo (que não conheço) lembre a "Opera do Malandro"... e multiplique por uma espiral de disparate e mentira...
A culpa é do Papa Bento XVI que no ano passado aboliu o Limbo (post Anacruses 14 de Maio 2007), a seguir também já não haverá Purgatório, ou seja: acabou a possibilidade de Absolvição dos Pecados. Como é quase impossível viver sem pecado: "après nous le déluge", como disse Madame de Pompadour, daí a selvajaria toda.
Como sempre foi: os ricos têm o Paraíso aqui e agora, os pobres têm que esperar até mais tarde no Além...
Enviar um comentário