quinta-feira, abril 29, 2010

Imagens a metro


Domingo de manhã na loja da FNAC há sempre (ou quase?) uma sessão de contos infantis. Umas senhoras muito simpáticas levam um livrinho e, no pequeno palco repleto de "pufos" coloridos com criancinhas a enfeitar cada um deles, contam uma historinha. Os pais espalham-se pelas mesas do Café FNAC enquanto os infantes fruem a magia do momento. Uma ilha de humanidade no oceano de informação eléctrica que submerge constantemente cada um de nós. Os bébés também.

No final costuma haver lugar a troca de ideias com os espectadoreszinhos (estranha esta palavra! Será que existe? Passa a existir...) que, para acabar a função, fazem uns desenhos ou algo do género. Lindeza!

No Domingo passado calhou estar presente com o jornal e uma chávena de café assentes no tampo da mesa. Durante o desenrolar de toda a cena havia pais com máquinas fotográficas a disparar sobre as cabecinhas dos bébés. Plano picado, plano rasante, americano, grande plano, uma lufa-lufa de clics perante a total indiferença dos fotografados.

Dei por mim com a chávena de café suspensa nas pontas dos dedos e a boca aberta, hesitando entre enfiar um golo goela abaixo e o espanto de constatar que aquelas criancinhas convivem com as máquinas fotográficas com mais naturalidade do que conviveriam com um cão ou com um gato. A máquina fotográfica está, assim, ao nível do animal doméstico.

Os bébés nem sentem os clics, não lhes passam cartão, ser fotografado é menos que nada. As máquinas digitais aligeiraram de tal modo o disparo fotográfico, democratizaram-no tanto que, mesmo para os fotógrafos, o clic parece mais fácil do que nunca. Disparam-se dezenas, centenas (não quero abusar dizendo que se disparam milhares) de fotos em menos que nada. O mundo, já de si uma fonte de imagens, vê-se soterrado em reproduções incessantes de si próprio.

A relação destes cidadãozinhos com a imagem terá de ser substancialmente diferente daquela que os pais deles desenvolveram. Não me parece que o velho álbum de família resista muito mais tempo. Desaparecem definitavamente os fotógrafos que andavam pelas praias ou junto aos monumentos e ficam apenas as fotos automáticas disparadas por um robô escondido quando visitamos um daqueles locais de culto do tipo montanha russa ou museu de cêra.

É o mundo a acomodar-se a si próprio na mudança.

3 comentários:

Anónimo disse...

Um dia antes, foi no Sábado passado, também testemunhei um evento similar, com pufes coloridos e tudo mais, na Livraria da Vila, loja do Shopping Cidade Jardim, em São Paulo.
E por mero acaso, durante o almoço, nesse mesmo Shopping, na mesa ao lado um garotinho de cinco ou seis anos no máximo, ficou o tempo todo dedilhando um aparelhinho do tamanho de um celular! Um joguinho, com certeza! Alheio a tudo que se passava ao seu lado, em nenhum momento disse ou ouviu uma palavra! Mas a destreza com que dedilhava era espantosa! Essas crianças não sabem o que é um pião, um yoyo, uma bola de gude, mas operam aparelhos digitais como quem mama uma mamadeira! E já nascem sabendo!

Anónimo disse...

hahahahaha é isso mesmo Eduardo. Ficamos espantados com tal tecnologia e a destreza dos pequenos. Tinha um aluno de 6 anos, eu fui descobrir que tinha dificuldade de segurar o lápis por causa desses joguinhos.
abs
madoka

Silvares disse...

Eduardo, é isso mesmo: eles não conhecem o nosso mundo, conhecem o mundo actual, que é muito mais deles que nosso!
:-)

Madoka, primeiro que tudo quero agradecer o link que me enviou. Ainda não comprei a viagem, não estou 100% certo que vá fazê-la mas o desejo mantém-se!
:-)
Segurar um lápis para um menino desses é quase tão complicado como segurar uma marreta pré-histórica para um menino como eu fui! Há coisas que têm o seu tempo e, uma vez fora dele, perdem o jeito!