sexta-feira, março 17, 2006

Uma fábula fatela

Foi há tanto tempo!
Foi?
Tenho uma vaga recordação. Houve um jornal Dinarmaquês que, afinal, era um pasquim de extrema direita, que quis mostrar aos muçulmanos como se pode blafesmar deste lado da barreira mais ou menos visível que separa os nossos mundos.
Mas a blasfémia é uma coisa perigosa pois nunca se sabe se deus terá ou não morrido. Pode estar apenas doente e de baixa ao trabalho ou próximo da idade de reforma e o melhor será ter cuidado e respeitinho.
Pelo menos o deus muçulmano parece ter ainda muita força na verga e manter aquele pessoalzinho todo debaixo de olho. Todo... quer dizer, quase todo, porque afinal de contas os gajos matam-se uns aos outros com uma fúria difícil de perceber para nós, infiéis blasfemos de um modo geral. E, se alguém deve ter vergonha, somos nós, por não acreditarmos que deus está vivo e de boa saúde, capaz de meter na ordem os que sairem da linha e não andarem direitinhos, como manda a lei.

Na verdade, verdadinha, a coisa caiu assim como que para os lados do esquecimento e só quem viu a sua embaixada queimada ou levou alguma calhoada no toutiço ainda se lembra do que terá causado tanta celeuma. A merda dos cartoons!

Manifestações, queimas de bandeiras e imprecações, o folclore mediático do costume, tudo tão vago e balofo como um sapo fumador que estoira numa nuvem de fumo sem ter tempo para contrair um cancro ou outra coisa que valha a pena, uma dessas coisas que provam como deus castiga os que se portam mal e dá prendinhas no Natal aos que se portaram bem.

Resumindo: queria apenas lembrar que não se deve provocar gratuitamente quem acredita em deus só porque deus teima em não dar provas da sua suposta existência (bem pelo contrário). Também não devemos pensar que a fúria muçulmana contra o jornaleco dinamarquês foi orquestrada por um maestro merdoso e com pouco jeito para segurar a batuta e muito menos devemos imaginar que houve exagero na forma como as notícias sobre este quase-acontecimento histórico foi tratado entre nós, porque a nossa imprensa reflecte a singeleza dos justos que caracteriza a nossa civilização bem como o nosso exemplar modo de vida.

Talvez tudo isto não tenha passado de uma fábula estúpida e fatela que acontece num tempo em que os animais ainda falam, só que nós não sabemos disso por não percebermos bem o que são animais. Nem o que é falar.

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