As notícias são esclarecedoras: 2006 foi um ano dourado (e de que maneira) para o mercado da arte. Grandes nomes da arte do século passado tiveram obras em leilão que atingiram preços estonteantes. O Top-5 do comércio de pintura teve 2 quadros de Klimt, um de Picasso, outro de Willem de Kooning tendo cabido a Pollock o número 1 com o seu Number 5 (na imagem) pintado em 1948, vendido por 106,6 milhões de euros a um mexicano cheio de guito.
O que leva a pintura a atingir preços tão elevados continua a ser um pequeno mistério. Ao que parece é o desejo de ostentação que estará por detrás de muitas destas aquisições. Tal como passear um Ferrari pelas ruas da cidade ou convidar os amigos para um chá no salão do palácio, ter um Pollock pendurado na parede faz as delícias de qualquer ricaço com queda para o espectáculo.
O valor da obra de arte continua a merecer rios de tinta gastos na tentativa de encontrar razões que justifiquem tão descabelado investimento. A arte não parece ter nenhum valor próprio. O seu valor será fruto da conjugação de diferentes factores mais ou menos objectivos, circunstancial, portanto.
No passado, os poderosos investiam somas consideráveis no financiamento de grandes obras que serviam de veículo à sua posição e poder para espantar os seus pares e a populaça. Reis, papas, comerciantes e outros indivíduos capazes de concentrar riquezas imensas, encontravam no objecto de arte o espelho perfeito da sua suposta grandeza.
Longe da sua magia original, a arte contemporânea não se explica facilmente. Aparentemente a obra de arte perdeu em objectivo concreto aquilo que foi ganhando em hermetismo. Os pintores das cavernas não estavam, decerto, a decorar as paredes quando realizavam as suas espectaculares e inultrapassáveis representações de manadas de animais. Os escultores românicos, mais do que decorarem as catedrais, criavam narrativas dos textos bíblicos em pedra para espanto e temor de uma população crédula e estupidificada perante a grandeza dos mistérios da existência humana.
Ao longo de milhares e milhares de anos, aquilo a que hoje chamamos arte estabeleceu o contacto entre a nossa dimensão e os mundos mágicos onde habitam os deuses e as coisas antes de terem um nome que nos permita conhecê-las. As obras de arte eram portas à espera de serem abertas, possibilidades de viagens entre este mundo e os outros.
Na nossa sociedade, consumista e desapaixonada das coisas que estão para lá do visível, a arte ganha uma função que é estranha à sua vocação original transformando-se em algo para olhar e admirar. Simplesmente. 106,6 milhões de euros são muitos euros e qualquer obra de arte que tenha tal carta de apresentação será sempre considerada uma obra-prima!
Perante o nº 5 de Pollock poucos sentirão a paixão do pintor pela pintura, a pureza da coisa-em-si. Pelo contrário. Mas muitos compreenderão facilmente que se houve alguém capaz de pagar por "aquilo" 106,6 milhões de euros, então "aquilo" tem um valor do caraças. Nos dias que correm arte é dinheiro e dinheiro é arte. Muito sinceramente não vejo Mal nenhum nisso, mas também não vejo Bem.
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