Uma pessoa está inquieta. O mundo roda, aparentemente, como é costume; às voltas sobre si próprio, em voltas mais largas ao redor do Sol, como se dançasse uma valsa eterna com o universo inteiro enfiado no mesmo salão de baile. Mas uma pessoa está inquieta.
Os automóveis rolam lá fora. Olhando-os cá de cima, da janela, parecem mover-se sózinhos, máquinas e motores em andamento, independentes da vontade humana. Rolam nas ruas, rolam nas estradas que são como veias do corpo imenso da cidade. Ininterruptamente. É impossível imaginar o mundo sem automóveis a rolar. Um mundo repleto de automóveis parados é um cadáver de mundo. E uma pessoa sente-se inquieta.
No café a televisão fala para si mesma. Ninguém parece dar-lhe atenção. Passam imagens terríveis de pessoas ensanguentadas, pessoas furiosas, outras parecem assustadas. Logo a seguir a vedeta mais recente sorri para nós. Então tudo regressa ao seu devido lugar. Aquele sorriso vale milhões e as pessoas assassinadas deixam de ter importância. Mas a inquietação não desaparece, antes se transforma. A televisão prossegue o seu monólogo.
Caminhando rua acima uma pessoa cruza-se com outras pessoas, em tudo semelhantes. Ninguém parece aperceber-se da inquietação alheia. Uns sorriem, outros nem por isso. Alguns sentem uma vontade imensa de chorar. Outros quase rebentam de alegria. Passam para lá e para cá, desviam-se, páram, voltam a andar.
É assim a vida na cidade ocidental. Longe de deus, longe dos homens, longe de tudo o que está próximo, mais longe ainda daquilo que é longínquo. Máquinas que são como pessoas e pessoas que se assemelham a máquinas em perpétuo movimento. Diz-se que "parar é morrer" e uma pessoa fica inquieta.
A inquietação põe-nos em movimento, mantém-nos vivos. Caminhamos a correr, respiramos de forma sincopada, como máquinas de viver. No dia em que sossegarmos iremos morrer?
13 comentários:
Belo poster para uma reflexão, parabéns pelas palavras muito bem colocadas...
Há sempre a meditação transcendental e zen... Mas se ficarmos muito, muito sossegadinhos, é mau sinal.
Não sei porque seu texto me fez lembrar de uma propaganda de uma Transportadora de mudanças em São Paulo. Claro que era de portugueses:" O Mundo gira, e a Luzitana rodaO Peri vai lembrar!!!!
...vivemos em uma selva de pedras...longe de tudo aquilo para o que nascemos...o contato próximo com a natureza vital cada vez mais distante... 'mais longe do que é longínquo'...
"A Ayurveda diz que nossa natureza é formada de 3 qualidades básicas...forças e energias que determinam nosso desenvolvimento...os GUNAS...em sânscrito,"o que ata"... são as qualidades mais sutis que fundamentam a matéria,vida e mente.
SATTVA..cria harmonia equilibrio e estabilidade...levando ao contentamento e paz interior.
RAJAS...é egoista...separativo leva a fragmentação perturbando o equilibrio causando dor e conflito...
TAMAS...a qualidade da inércia da escuridão e embotamento causando decadência...
Rajas e Tamas produzem uma desarmonia mental...uma imaginação deturpada e ilusória da realidade...é deles que advém a falsa idéia do mundo exterior como sendo real em sí mesmo,o que nos leva a buscar a felicidade fora de nós mesmos...Vivemos em uma era RAJASTICA...longe de DEUS,longe dos HOMENS...como máquinas!!!"
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Silvares desculpe a delonga...mas não pude deixar de colocar aqui o que tenho aprendido em minhas novas aulas de auto conhecimento dentro da filosfia Ayurvédica e Budista...Seu texto parece proposital ao que temos discutido nos últimos dias...Mais aberta do que nunca para entender um minimo "de quem somos e para onde vamos" percebi que é o ORIENTE que pode nos trazer um pouco de paz fugindo desta inquietação,que como vc diz nos mantém vivos...mas com que qualidade de vida???
É impressionante o que a técnica da meditação é capaz de fazer, mesmo para os que não acreditam...aprendemos a respirar deixando esta "máquina" a que vc tão bem se refere à distância e voltamos para dentro nos aproximando de SATTVA..a energia...do contentamento e tranquilidade...
Bom..nada disto é solução para este mundo caótico de hoje...mas a simples consciência de que é assim e a procura de o entendermos melhor há de nos dar uma certa paz...nos distanciando desta terrível inquietação...que esta sim nos leva-rá mais cedo...!!!
Mais um texto memorável...!
Sorry again...pelo "aluguel"...
:-))...mas adorei perceber o quanto estou gostando deste novo olhar sobre as coisas e nós mesmos e... me entusiasmei escrever...!
;)
Olá Silvares..Primeiro impossível e insensível não comentar o ímpeto com que a Ví descreveu com tanta propriedade essa questão e seu momento intenso de compreensão, escolhendo tão preciosas citações.
Depois tento a minha maneira, pois só não as faço referências por não ter memória para recordar-me delas com a mesma competência, e digo que de que vale essa inquietude externa, todo esse barulho se estamos estagnados interiormente.
Parabéns pela postagem.
Vivemos um momento que marcará a história da humanidade, pelo simples e verdaeiro sentido das coisas.
Beijos,
Pra mim é assim, penso que se sossego para a roda interna...
Caraças, qualquer dia gamo-te um post. A este punha um clik com a inquietação do José Mário Branco, logo a abrir.
Abraço.
O mundo é esse redemoinho, nosso alimento, e assim não há dúvidas de que o tempo e o espaço nos alimentam, somo o produto humano com sua indagações, e o que nos diferencia apesar de tanta similaridade, eu acredito que seja o pensar, atestando nossas incertezas.
@dis-cursos
Não morremos, mas vamos perdendo o interesse em certas coisas e ganhando em outras. Tudo é relativo, tudo gira, tudo é cíclico. Só nos queremos sentir bem. All the time.
te visitando e passeando em seus posters..........
Grato por todos os comentários. Peço desculpa pela rapidez deste comentário mas a verdade é que estou muito apressado. Amanhã de manhã parto em viagem. Até mais ver!
Estive por aqui pra conhecer um pouco sobre Angola!!Abraços Ademar!!
RUI: BOA VIAGEM!!!
e levas o bacon???, o presunto???
*/o
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