sexta-feira, dezembro 01, 2023

Simulacro

     O pato tinha muita personalidade. A bengala ajudava a compor o figurino e, quando passou por mim, tirou o chapéu educadamente desejando-me: "Tarde:" Falou baixinho, naquela voz de cornetim, e lá passou. "Tarde." - sussurrei eu. Não sei para o pato se para mim, sussurrei.

    Mais adiante pairava o que me pareceu ser um dos fantasmas de Buzzati. Resolvi passar de largo. Não que tivesse medo da coisa, apenas um certo respeito desconfortável. Como se levasse na alma botas apertadas. Lá segui. O vento sibilava um certo friasco aos meus ouvidos. Continuei deslizante.

    Este mundo é bem melhor que o outro. Bichos vestidos, fantasmas sólidos, humanidade ausente e eu por cá, a passear-me. Não fosse a chuvinha persistente, o ventinho desagradável e uma cadela velhinha que agora habita no andar de cima, diria que isto aqui é o Paraíso. 

    Mas não é.

Sem comentários: