sexta-feira, maio 22, 2009

Abrir os olhos


A mulher mais velha parecia demasiado nova para ser avó e a outra mulher parecia demasiado jovem para ser mãe das três pequenitas que saltitavam uns passinhos meio a correr para um lado e para o outro sobre o passeio ensolarado de uma rua almadense debaixo daquele sol das três da tarde. As pequenitas tinham corpinhos exactos, de pessoa pequenina com cabeça demasiado grande, como devem ter as pessoazinhas daquele tamanho, naquela idade. Nem ponta de gordura, só e apenas o músculo da eterna juventude em pleno exercício de direitos e faculdades. Passei pelo grupo sem o ver muito melhor do que atrás fica descrito. Foi então que as minhas costas ouviram a frase que me ficou gravada mais acima, no cérebro, decerto declarada pela tal rapariga que poderia ser mãe das crianças, embora não o parecesse mas isso fosse o mais provável: "Se abrires os olhos não vais contra as coisas." Pronto. "É isso mesmo!", pensei, o melhor conselho que um adulto (ou quase adulto) pode oferecer a quem ainda o não é. Continuei a caminhar. Não me voltei para ver o que não era necessário ser visto. A frase bastou para me alimentar os passos até entrar no Clube de Vídeo e deixar o sol a queimar apenas as pedras da calçada.
"Se abrires os olhos não vais contra as coisas", que grande conselho!

17 comentários:

luisM disse...

Então "se abrires os olhos não vais contra as coisas", porque vais a favor das coisas? Que é como quem diz, a favor da corrente? E isso tem apenas uma direcção? Mas se fecharmos os olhos andamos às arrecuas? Então em terra de olhos fechados quem tem um olho entreaberto é reizinho? E quem usar óculos será imperador? E quem tiver os olhos abertos e não vir grande coisa?

Caramba, é um conselho que é dilema!

Tentarei não me esquecer, mas não garanto que consiga manter os olhos abertos!

Alice R. disse...

As frases que se ouvem na rua são "alimento" muito bom.(eu gosto)
Olha esta:
"- A chuva tambem molha Catarinas".(de pai para filha, ouvida de costas no Chiado).

Até ao Barco acompanharam-me pensamentos sobre: o Aquecimento global, a Eufémia, a Igualdade, o Destino, a Fuga...
e até me esqueci que estava a chover bastante.

Beijos e boas escutas.

Jorge Pinheiro disse...

A cegueira tem muitas formas e só é cgo quem não quer ver!

Caçador disse...

...uma pancada nos olhos faz ver?...

Alice Salles disse...

NOSSA!
A verdade é ouvida assim, nos cantos, nos lugares onde menos se espera...

Silvares disse...

Luis M, em terra de cegos só Deus usa óculos graduados. Os outros (os que usam óculos) são todos a dar para o escuro.

Alice, é o que se chama andar com a cabeça entre as orelhas.
:-)

Jorge, olha que há muito boa gente a querer ver e a não enxergar a ponta de um corno!

Caçador, essa frase deixa saudades. Principalmente quando penso que aquela parede onde estava escrita foi abaixo levando com ela muitos dias extraordinários. Uma pancada nos olhos faz ver estrelas!

Alice, só os surdos não têm a felicidade de poderem desfrutar da imensidão da informação auditiva em plena rua do mundo.

luisM disse...

Uma pancada nos olhos faz ver estrelas, explica melhor, sff. É que estrelas é um lugar comum, que não diz bem o que se consegue ver com a estimulação dos centros nervosos periféricos da visão. Também lá estão as estrelas (ou foguetes se se quiser), mas vêem-se mais coisas. Anda, e andou alguma gente atrás dessas estrelas, muitos morreram à espera delas.
Eram as estrelas utopia. Às vezes aparecem.

(Se não se perceber bem, não tem importância, é capaz de ser um pouco hermético, fica para outros copos)

Anónimo disse...

Olhos para ver! Juizo para entender!

Ví Leardi disse...

..mesmo alertados e de olhos abertos... e bem abertos por vezes atropelamos e ou somos atropelados...és la vida....! :-)

Silvares disse...

LuisM, o nosso amigo Caçador citou uma frase que estava pintada na parede exterior da Lémauto, junto aos Bombeiros de Cacilhas, em frente à antiga LISNAVE. Nessa época a Lémauto era um centro de actividade cultural fervilhante, onde aconteciam algumas das coisas mais mirabolantes que então se faziam, não vale a pena ser modesto, em todo o país. Pessoalmente tenho o orgulho de ter participadoe em muitas delas. Escrevendo textos ou montando cabos de electricidade, pintando o chão de amarelo ou vendendo cervejas num balcão improvisado, de tudo um pouco. Liberdade total! Belos tempos. "Uma pancada nos olhos faz ver" queria dizer que aquilo que ali fazíamos era uma autêntica pedrada em muitas cabeças e, eventualmente, poderia fazê-las ver, abrir os olhos. As estrelas... bom, as estrelas seriam aqueles que trabalhavam na Lémauto, principalmente os gajos de O Olho, o grupo do Jonas que à época controlava aquele espaço. Estas estrelas não são lugares comuns, são o peito de muitas pessoas que andavam perdidas no firmamento sem saberem bem o que andavam a fazer, mas faziam-no. Eu sei que foi um pouco extenso, mas se não te contasse a história toda ias continuar desconfiado.
:-)

Eduardo, o juízo anda muito relacionado com os olhos (e vice-versa :-)

Silvares disse...

Ví, há muita gente que sonha de olhos abertos. Quando sonhamos, as coisas que nos passam pelos olhos não são reais. Estamos num outro mundo. Daí que possamos ir contra as coisas. Na historinha que contei (e se ainda estou bem recoradado) quando somos meninos estamos constantemente "a sonhar de olhos acordados". Lembro-me de ser pirata durante uma viagem de carro e homem das cavernas comendo uma perna de frango na companhia do meu avô, e lembro-me também de ter esquecido muitas coisas. Quando somos crianças vamos constantemente contra tudo e contra nada porque temos os olhos tapados pelos sonhos.

luísM disse...

Sim, p´raí, percebi agora, mas a verdade é que uma pancada nos olhos, bem, não precisa de ser mesmo pancada, faz ver montes de coisas curiosas, entre elas as estrelas da banda desenhada. É um divertimento que acontece quando um tipo tem os olhos cansados e os massaja. Se se tiver imaginação e se se deixar ir atrás das imagens poupa-se um bilhete de cinema, vendo-se qualquer coisa do género da "Fantasia".

Bom, estava só a perguntar se vós vos entregáveis a esse tipo de desporto, que é curioso para quem mexe com imagens. Serão as portas que o Timothy Leary andou à procura e que não se encontraram, ou melhor, que não se abriram? (afirmado por quem veio de lá, com lucidez suficiente)

Quem sabe!?

Selena Sartorelo disse...

Olá Silvares...abrir os olhos pode significar mantê-los no mundo dos sonhos, pois enquanto lia teu texto imaginava uma brincadeira de crianças que figem ocupar papéis que a vida lhes dará. Um execercício imaginário que pleiteia a realidade...igual a conselhos que damos apenas por ouví-los mas não necessariamente por termos vivido-os.
Não sinto com conformismo ,mas sim como a confimação de algo absoluto e verdadeiro.

beijos,
Selena

roserouge disse...

O pior é quando as coisas vêm contra nós mesmo tendo os olhos abertos. Será que isto vai ser uma coisa boa? É sempre aquele velho dilema: viro para a direita ou para esquerda? E as consequências que às vezes uma escolha errada tem nas nossas vidas, pode durar eternamente. Fazer o quê?

luisM disse...

roserouge, não há apenas a direita e a esquerda. Podemos ir em frente, ou às arrecuas, não contando com as diagonais e as outras oblíquas. Mas, depois da decisão, que é a certa (na altura, pelo menos) só resta avançar.
É a dança da vida, não se pode sair do ritmo, de resto sai sempre bem.

Silvares disse...

Luis M., vê lá no que te metes. As portas do avô Leary abrem-se sobre mundos onde as diagonais são curvas e as arrecuas podem nunca acabar. Por vezes, lá do outro lado, um gajo estatela-se a dançar a dança da vida que, por vezes, pode acabar muito mal.

Selena, abrir os olhos não significa que estejamos particularmente acordados. Há uma grande diferença entre "olhar" e "ver". Olhos abertos não significam visão apurada. As crianças vêem coisas que estão vedadas aos adultos, pois elas ainda são capazes de acreditar em quase tudo.

Rose, se uma coisa vem contra nós só nos resta tentar saltar para o lado e safar o coiro. A menos que seja alguém de quem gostamos a correr na nossa direcção de braços abertos.
:-)

luisM disse...

MestreSilvares, não preciso de me meter em nada. Este dom que dEUS me deu satisfaz-me e já me ocupa o tempo todo. As vias do sENHOR são múltiplas e enviezadas. Eu prefiro as mais longas, dão mais luta!