Não sei se podemos chegar a considerar um mistério esta necessidade avassaladora que temos de encontrar dentro de nós algo de especial, qualquer coisa que nos distinga da manada, que faça de nós um bicho diferente dos outros embora de semelhante aparência. Raramente nos basta ser quem somos; raramente matutamos sobre o que realmente somos: animais.
Quando por vezes alguém nos chama a atenção para essa nossa condição indiscutível procuramos espelhos por nós cuidadosamente escolhidos e mostramos o nosso reflexo neles. Desde a Bíblia, que prova que fomos criados por Deus e somos diferentes da restante bicharada, até aos manuais escolares que nos explicam que somos animais sim, mas animais racionais, os únicos que pensam, que se sonham e se questionam, arranjamos um sem número de artefactos por nós construídos que provam a quem quiser ver a nossa excepcionalidade. Somos especiais, é o mínimo que podemos pensar.
Quando olhamos um cão bem dentro dos seus olhos, ou um gato, ou mesmo um pequeno pardal saltitante, há qualquer coisa que assoma dentro da nossa alma, se por acaso a tivermos. Há qualquer coisa que faz vacilar a nossa certeza, qualquer coisa que nos traz o coração à flor da pele e ficamos a pensar: que maravilhosa expressão esta, "à flor da pele"! E damos por nós a imaginar como dirá o cão aquilo que o comove, como explicará o gato que coisas maravilhosas viu ao longo das suas sete vidas, o que pensará o pardal na hora de ir finalmente descansar.
Se Deus existe não somos nada mais que bichos entre a bicharada, todos nós com o coração ao pé da boca e a sensibilidade à flor da pele.
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