Na 3ª feira passada ouvi uma das mais extraordinárias ideias acerca da leitura; da razão para a não-leitura, para ser mais exacto. Tentando motivar uma aluna minha, na aula de Desenho, para a execução de uma ilustração, pedi-lhe que tomasse como ponto de partida o livro que estivesse a ler neste momento. Ela respondeu-me que não estava a ler livro nenhum.
Então que recorresse à memória de algum dos livros que lera anteriormente, algum que a tivesse marcado, que escolhesse uma passagem qualquer, a descrição de uma personagem, de um local, qualquer coisa serviria de pretexto para arrancar com o trabalho de desenho. Respondeu-me que não tem o costume da leitura, que não se lembrava de ter lido livro nenhum. Como!!?? Que nesta situação não podia recorrer à memória porque, simplesmente, não havia memória nenhuma.
Mas porquê? Que razão a afastava assim dos prazeres da leitura? Respondeu-me que quando olha para uma página impressa aquilo lhe parece de tal modo fastidioso que, em vez de juntar as letras e ler as palavras, repara apenas nos espaços entre elas, que se formam no seu olhar linhas brancas e sinuosas pela página abaixo, como riozinhos de indiferença que vão desaguar no mar imenso do tédio mais absoluto, imaginei eu.
Desisti e procurei outra orientação para o trabalho. Na verdade o que importa principalmente neste nível de aprendizagem do desenho são o manuseamento dos materiais e questões de composição visual. A leitura era uma questão lateral.
Apercebi-me depois que a grande maioria dos meus alunos do 12º ano não lê com regularidade (isso é que era bom!) e que essa actividade lhes exige um esforço tremendo, algo próximo do sacrifício. Isto deixou-me a matutar sobre o futuro da literatura. Formou-se-me no espírito um vazio infinito.
7 comentários:
O hábito de leitura, deveria ser matéria escolar, nos primeiros anos das escolas! Quem não aprende, e pega gosto pelos livros, nessa fase da vida, dificilmente será um leitor. E só os leitores sabem o prazer de ler um bom livro. Prazer imensamente superior ao cinema, TV, ou qualquer outro divertimento contemporâneo. Perdem os que não tem o hábito de ler, não os escritores, muito menos os livros, que ficarão nas bibliotecas a espera de gente esperta e inteligente! Os outros que se danem!!! srsr
Humm que negativos! E o direito a não leitura....Daniel Pennac
A Literartura tem de saber encontrar novas vias face às novas tecnologias. Mas, o grave é que eles deixaram de saber ler. Não é um direito ou um dever. É analfabetismo.
Eduardo, a leitura É obrigatória em todos os níveis de ensino. Desde os pequenininhos aos mais graúdos TODOS são OBRIGADOS a ler diversas obras. Soa a trabalho forçado. A verdade é que os tempos mudam e os suportes que transmitem a informação mudam com os tempos. Estou em crer que o livro tem os dias contados.
Claire, talvez não me tenha exprimido bem (ai a escrita...) o que eu quero dizer com "vazio infinito" é que a literatura em formato de livro impresso está a caír no esquecimento. As novas gerações não entram por aí. O mundo não ficará melhor nem pior caso os livros desapareçam. Ficará "apenas" diferente.
Jorge. se o analfabetismo se tornar regra então o mundo será governado por analfabetos para analfabetos. Será um mundo assustador para nós mas será que um mundo de filósofos letrados não assusta aqueles que se estão nas tintas para as letras e a filosofia? Falta decidir quem constitui a maioria...
Silvares,
Há muitos muitos jovens muito deprimidos e muitos outros que sonham.
O suporte livro, tem qualidades que nenhuma outra ferramenta pode substituir!!! E todo o trabalho a ser feito em torno da leitura??? vai para o lixo!
E porque não deixar que outras árias do cérebro se desenvolvam de outras maneiras, na musica algum trabalho tem vindo a ser feito...já viste as consequências graves físicas e mentais por mantermos as crianças nos bancos das escolas a conterem as energias.
Lua nova é o que esta a dar.
Claire, o mundo é feito da mudança que cada nova geração transporta consigo. Não há problema nenhum nisso... a liberdade de escolha é fundamental.
Voce abordou um tema muito importante. Concordo que os jovens precisam de tempo, o tempo deles, a super abundâcia de informações talvez seja uma das explicações. Ninguem para para se concentrar, ler as entrelinhas, ficar no silêncio, refletir, dar o tempo necessário para uma boa digestão daquilo que se comeu, ou leu, ou ouviu. Temos pressa, e ela cria uma outra realidade.
A arte - como meio de identificação do homem com a natureza, com os outros homens e com o mundo, como meio de fazer o homem sentir e conviver com os demais, como tudo o que é e com o que está para ser - está fadada a tornar-se vazia e cheia de critérios capitalistas.
bjs.
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