Fico a pensar que “o” Modernismo não chegou a passar por aqui. As utopias modernistas, que estiveram na base da Europa da União, foram fundadas na crença da possibilidade da melhoria das condições de vida das populações, cada vez mais urbanas, através do desenvolvimento do tecido produtivo apoiado num racionalismo funcionalista. A organização da sociedade tendo por modelo os princípios estéticos do Modernismo (“ornamento é crime” de Adolf Loos, ou “a forma segue a função” de Louis Sullivan, para dar dois exemplos paradigmáticos) transformados em princípios éticos das instituições democráticas, nunca foram, sequer, ponderados entre nós. O Estado Novo e Salazar encarregaram-se de fazer do nosso país um imenso pardieiro, habitado por saloios mais ou menos ricos com uma maioria decididamente miserável. A democracia foi adiada até a um ponto insuportável que viria a rebentar em Abril de 1974. Ou seja, Portugal falhou o Modernismo, reentrando na história da Europa após o período revolucionário que este jornal nos tem recordado diariamente na coluna “Memória, 30 anos de PREC”.
Dâmaso continua, mais à frente, “o mundo é reformado todos os dias pela acção avassaladora do capitalismo e não das velhas categorias ideológicas(...)”. As velhas categorias ideológicas que serviram de motor ao modernismo, as utopias socialistas, nunca conseguiram vingar na realidade, e começam a dar nítidos sinais de falência, inevitáveis nas promessas sempre adiadas. Vivemos uma era Pós-Moderna e Portugal veio cair, direitinho, dentro dela. De país atrasado, analfabeto, de matriz rural dominante, Portugal passou a uma sociedade consumista, sem fase de adaptação nem aprendizagem criando alegremente “(...) uma sociedade de mercado rendida ao valor implacável do dinheiro onde tudo se compra e vende, destituída de valores sociais e de uma solidariedade básica entre gerações” parafraseando o citado editorial.
Temo que seja esse o retrato apropriado, não só do nosso país, mas da actual União Europeia. A vitória do “Não” no referendo Francês vem pôr a descoberto a ausência de ideais, a impossibilidade de uma Internacional dos Cidadãos à maneira das vanguardas do século XX. A História não tem retorno. Assistimos estupefactos a uma transformação implacável dos princípios básicos da nossa sociedade. Não há Cristianismo que nos valha nem utopias sociais que resistam à voragem consumista em que nos deixámos enredar. Não há tradição cultural Greco-Latina que nos una num mundo globalizado, onde predominam confrontos ditados pelos mais atávicos dos ódios.
Penso que seja isto o Pós-Modernismo de que “(...) o possibilismo reformista de Blair(...)” será mais um sintoma de maleita que medida profilática.
Sem uma verdadeira tradição democrática, diariamente traída por uma classe política e dirigente que aprendeu a ler, a escrever e a contar nos bancos da mais cinzenta das escolas salazaristas, Portugal afoga-se num mar de incongruências formais e éticas, completamente desnorteado e sôfrego, sem nada que possa satisfazer esta ânsia de justiça e bem-estar que todos sentimos. E, no entanto, a classe dirigente não é mais que um reflexo de nós próprios, os eleitores.
Será isto o Pós-Modernismo? O triunfo da imagem sobre o conteúdo, a lei da selva embrulhada em papel de veludo? Cordeiros que ladram e lobos que miam? O Modernismo agoniza lentamente e, das suas cinzas, emergirá algo novo. Mas o Novo não será, necessariamente, mais brilhante, justo ou agradável. Será apenas outra coisa. Talvez seja já isto!
Texto escrito em Junho de 2005
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